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JANIO DE FREITAS
Lula lá
Embora três tentativas de
chegar lá com o apoio público e
claro das massas eleitorais, foi
encoberto pelas horas altas e sigilosas da noite que afinal deu
Lula lá, no Alvorada. E por
uma urgência que não era sua,
não era do seu eleitorado e é
duvidoso que venha a ser explicada pelas partes de modo convincente.
Luiz Inácio Lula da Silva chegou ao Alvorada às 23h30 da
quinta- feira 10. Acompanhado
do governador de Brasília,
atendia, segundo sua contagem, à insistência de quatro telefonemas de Fernando Henrique Cardoso para que fosse encontrá-lo.
Ainda está por acontecer a visita a um palácio alta noite, seja
de quem for, que não tenha motivo importante para uma das
partes (em geral, é para o residente palaciano) e de dedução
improvável ao ser descoberto o
encontro. Ainda assim, a maioria dos comentaristas deduziu
que a conversa se deveu a um
suposto desejo de Fernando
Henrique de dar certo colorido
de esquerda ao governo e, no segundo mandato, ter o apoio da
atual oposição no Congresso.
Muito interessante, mas um
tanto fácil e, ainda por cima, incapaz de explicar, seja a urgência, sejam as condições noturnais do encontro. Além disso,
Lula escapa sempre de esclarecer o que, na conversa até uma
da manhã, foi o motivo verdadeiro da insistência de Fernando Henrique e das circunstâncias especiais do encontro. Menciona, isso sim, suas críticas à
política econômica e a defesa
que dela fez Fernando Henrique. O óbvio. A menos para a
teoria de um casamento de PT e
FMI no mesmo governo.
Do assunto governamental
em diante, Lula só aceitou reconhecer que Fernando Henrique
agradeceu sua condenação,
imediata e categórica, aos papéis chamados de dossiê Cayman. Mais, só isso: "Seria uma
indelicadeza da minha parte e
uma falta de ética relatar o que
uma pessoa me disse dentro da
casa dela".
Só isso, não. A frase tem uma
conotação pessoal rica. Nem seria jamais um dos subterfúgios
de político para escamotear
uma conversa própria do seu
meio, porque uma frase como
aquela nem sequer figura na
linguagem política.
É certo que Fernando Henrique já ligara antes do dia 10, semanas antes, para agradecer a
Lula a condenação dos papéis.
Não podendo ser o agradecimento já feito, a insistência para o encontro naquela quinta-
feira ficou, portanto, como um
mistério.
Aquela quinta-feira foi, por sinal, um dia em que o "dossiê"
voltou a ser o centro de ebulição. Pela manhã, o pastor Caio
Fábio, suspeito de envolvimento com a difusão dos papéis, começou na Polícia Federal um
depoimento que foi até quase o
fim de tarde. Inocentou-se, claro, das suspeitas, mas foi pródigo em esclarecimentos e na reprodução de coisas que disse ter
ouvido nos Estados Unidos, de
diferentes pessoas e em diferentes ocasiões. Caio Fábio corrigiu
por exemplo, os nomes de corretoras que operam com depósitos
no exterior. Até mencionou cifras, altas como são os depósitos
assim. A um título qualquer citou os nomes de Bresser Pereira
e de Paulo Henrique Cardoso,
entre outros.
A PF não liberou o depoimento, nem é usual fazê-lo. Colheu
material cuja variedade e o teor
são dados como problemáticos
para as investigações. Embora
Caio Fábio não fornecesse documentos ou outros meios de
prova.
Por tudo isso, tanto se pode dizer que o depoimento, mesmo
negando validade aos papéis do
"dossiê", auxiliou o inquérito,
como se pode dizer que dificultou. Ou inviabilizou de vez.
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