São Paulo, sábado, 21 de junho de 2008

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Doleiros intermedeiam propina da Alstom

Planilha da empresa revela que contas Orange e Kiesser, de Nova York, receberam e transferiram suborno pago a políticos

Dono de uma das contas é conhecido de empresários paulistas e negocia delação premiada para revelar quem recebeu os dólares no Brasil


MARIO CESAR CARVALHO
JOSÉ ERNESTO CREDENDIO
DA REPORTAGEM LOCAL

Documentos da Alstom em poder do Ministério Público da Suíça mostram que pelo menos parte da propina atribuída à empresa chegou a políticos tucanos de São Paulo por meio de dois doleiros.
A planilha com as transferências, da qual a Folha obteve cópia, revelam que cerca de US$ 1 milhão usados para suborno passaram pelas contas de dois doleiros em Nova York, chamadas Orange International e Kiesser Investment.
A Orange é de propriedade de um dos doleiros mais conhecidos entre os empresários de São Paulo, Luis Filipe Malhão e Souza. Ele negocia uma delação premiada com a Justiça brasileira e pode revelar quem recebeu os dólares que passaram pela conta.
Malhão e Souza usava a agência de turismo Oxford, na região central de São Paulo, como fachada para os seus negócios com dólar. Auditoria feita pela Polícia Federal nas contas da Orange mostram que o doleiro remeteu US$ 461 milhões entre 1997 e 2002.
A PF encontrou entre os clientes de Malhão e Souza os nomes de Henrique Meirelles, presidente do Banco Central, e de Cassio Casseb, ex-presidente do Banco do Brasil. Segundo os registros, os dois usaram a conta em 2002.
A Kiesser, outra conta pela qual transitou o dinheiro, é de três doleiros do Rio de Janeiro, segundo a PF: Raul Davies Mendez, Guilhermo Davies e Jorge Davies.
As quatro transferências listadas na planilha foram ordenadas pela Alstom francesa entre dezembro de 1998 e fevereiro de 2002, segundo o Ministério Público da Suíça. Dois desses depósitos saíram do Union Bancaire Privée, de Zurique, na Suíça e outros dois do Bank Audi, em Luxemburgo.
As quatro transferências foram parar na conta da "offshore" MCA Uruguay Ltd., nas Ilhas Virgens Britânicas, um paraíso fiscal localizado no Caribe. Segundo investigadores brasileiros do caso Alstom, a MCA é controlada pelo brasileiro Romeu Pinto Jr.
Os valores transferidos sob ordens da Alstom são os seguintes: US$ 207.659,57 (outubro de 1998), US$ 298.856,45 (dezembro de 1998), US$ 245 mil (dezembro de 2001) e US$ 255 mil (fevereiro de 2002). O valor total (US$ 1.006.516) equivale a R$ 1,8 milhão, quando se corrige os valores pelas datas da transferência.
As quatro transferências que a MCA Uruguay recebeu não é o total da propina que a Alstom teria pago a políticos tucanos, de acordo com documentos que o Ministério Público da Suíça tem em seu poder e ainda não chegaram ao Brasil.
Ontem, a Folha revelou um memorando de um executivo da Alstom em Paris no qual ele relata planos de pagar 7,5% do valor de contrato da Eletropaulo para um intermediador do governo de São Paulo.
A disputa que a Alstom queria vencer era a compra de sete transformadores e de uma subestação blindada por R$ 110 milhões. A estratégia deu certo. A Alstom foi contratada para fornecer os equipamentos, usados numa subestação do Cambuci, na região central de São Paulo. Os 7,5% citados no memorando da Alstom correspondem a R$ 8,25 milhões.
O texto foi escrito em francês em outubro de 1997, quando Mario Covas (PSDB) era o governador de São Paulo.

Outro lado
A Alstom não quis se pronunciar sobre as transferências internacionais. A Folha procurou o advogado de Malhão e Souza, Antônio Augusto Figueiredo Basto, mas ele não ligou de volta. A reportagem não conseguiu descobrir quem são os advogados dos doleiros do Rio. Pinto Jr. não quis falar com a reportagem da Folha.
Meirelles disse à época em que as transferências foram reveladas, em 2004, que não sabia como o seu dinheiro foi parar na conta de um doleiro.


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