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CELSO PINTO
O alívio financeiro
ainda é precário
O dólar, que chegou muito
perto de R$ 4, hoje está na casa dos R$ 3,50, enquanto o risco
Brasil, que bateu em 2.500 pontos, hoje está em 1.600. É um
enorme alívio, mas dá para dizer
que o pior já passou?
Na visão de experientes banqueiros e investidores, ainda é
cedo para relaxar. Por uma razão principal. O que vem puxando o câmbio para baixo é dinheiro especulativo de curto prazo,
algo que um banqueiro estima
entre US$ 1,5 bilhão e US$ 2 bilhões. O risco Brasil caiu bastante, mas continua elevadíssimo,
muito acima do que qualquer
empresa saudável poderia pagar.
O capital especulativo veio para aproveitar um ganho fácil. Os
juros das aplicações em reais indexadas ao dólar, o cupom cambial, ficou tão alto, que permitia
um ganho certo a curto prazo
para quem trouxesse recursos
(bem mais baratos) do exterior.
Desde que confiasse que não haveria problema para reconverter
os reais em dólares e remetê-los
para fora. Por medo de mudanças de regras, poucos se arriscavam nesta arbitragem antes das
eleições.
A confirmação de sinais positivos do PT depois da eleição fez
crescer o apetite para esta arbitragem, elevando a rolagem dos
vencimentos cambiais, a juros
decrescentes. Mesmo assim, os
juros do cupom ainda permitem
ganhos com a arbitragem.
Quem são esses especuladores?
Dinheiro de tesouraria dos bancos e de grandes empresas do
país. Os maiores grupos empresariais têm tesourarias sofisticadas e, especialmente os exportadores, mantêm um caixa significativo no Exterior, que um banco estima entre US$ 7 bilhões e
US$ 8 bilhões.
O dinheiro da especulação não
é, em si, ruim. É o primeiro a voltar, porque está disposto a correr
mais riscos. Ao empurrar para
baixo o câmbio e o risco país, pode ajudar a reconstruir a confiança. Não é, contudo, suficiente para firmar uma tendência, a
menos que seja seguido por outros capitais mais estáveis. É um
dinheiro nervoso. Qualquer tropeço ou indicação negativa, ele
sai. O episódio da desinformação sobre o suposto calote da cidade de São Paulo é um bom
exemplo: bastou um boato para
reverter em horas vários dias de
melhora no câmbio e no risco.
Por enquanto, os dólares mais
estáveis ainda não voltaram.
Nem mesmo as linhas comerciais de curto prazo, por definição as primeiras na fila. Os bancos não querem aumentar sua
exposição ao risco Brasil nos balanços de fim de ano. Os investidores de maior peso, por sua vez,
continuam bastante cautelosos
em relação ao Brasil. Não bastam as promessas e o discurso
suave do PT para mudar isto.
Falta uma equipe que seja bem
recebida, alguns meses de governo e a definição de prioridades
do novo governo no Congresso.
O Brasil perdeu muito peso relativo frente aos investidores internacionais. Em renda fixa, o
Brasil representa cerca de 15%
dos mercados emergentes. É bem
menos do que já foi, mas ainda
significa que os investidores não
se podem dar ao luxo de ignorar
uma recuperação, se ela vier. No
caso da Bolsa, o Brasil representa só 6,5% do total dos emergentes, comparado, por exemplo, a
22% da Coréia, 13% de Taiwan e
13% da África do Sul.
O cenário internacional continua incerto, com riscos de piora
na economia americana e guerra no Iraque, aversão ao risco e
destruição de US$ 10,6 trilhões
de valor de capitalização de
mercados acionários de 2000 a
2002. Existem, contudo, três fatores potencialmente positivos.
Nas contas feitas por Octávio de
Barros, do BBV, os juros reais
americanos caíram de uma média de 3,1% de 1997 a 2000, para
0,2% em 2001 e estão, hoje, negativos em 0,77%.
Investidores institucionais que
têm obrigação de manter remunerações mínimas expressivas,
terão que buscar rentabilidade.
Os preços tanto dos papéis de
renda fixa quanto da bolsa brasileira, hoje, são tão baixos, que
embutem uma rentabilidade extraordinária. Mas o risco também é visto como muito alto, até
porque muitos investidores continuam temendo uma moratória brasileira. Se a ambição vencer o medo, o Brasil será uma
boa opção de ganhos.
O segundo fator é que a atração dos Estados Unidos para os
capitais internacionais vem decrescendo fortemente. Em junho
deste ano, segundo o BBV, havia
um "gap" no balanço de pagamentos americano de US$ 185
bilhões, ou seja, muito menos financiamento disponível do que
o necessário. A Europa tampouco é atraente hoje como opção.
Alguns países emergentes continuam atraindo recursos. Outra
vez, se o Brasil vencer as desconfianças, pode entrar na lista. Hoje, a situação está longe disto. O
balanço de pagamentos brasileiro, excluído o dinheiro do FMI,
foi deficitário em US$ 6,6 bilhões
nos 12 meses encerrados em setembro. A boa notícia é que o déficit em conta corrente brasileiro
está caindo fortemente.
De todo modo, o Brasil ainda é
um dos poucos emergentes com
déficit expressivo em conta corrente. Em 12 meses até setembro,
pelos dados do BBV, só o México
tinha déficit maior que o do Brasil (US$ 16 bilhões), numa lista
dos 24 principais emergentes. Os
únicos outros emergentes com
déficits eram Polônia (US$ 6,4
bilhões), Israel (US$ 2,6 bilhões),
Hungria (US$ 2,4 bilhões), República Checa (US$ 2,3 bilhões),
Colômbia (US$ 1,4 bilhão), Peru
(US$ 1 bilhão), Chile (US$ 600
milhões) e África do Sul (US$
300 milhões).
Mesmo que o déficit em conta
corrente do Brasil caia para US$
5 bilhões em 2003, o que seria
uma melhora excepcional, continuará destoando da maioria dos
emergentes. Não será complicado financiar a rolagem do principal da dívida externa pública,
cerca de US$ 5 bilhões, mas a rolagem do setor privado depende
da redução do risco país para
800 pontos ou perto disto.
A terceira potencial boa notícia são as previsões gerais, do
FMI, do Banco para Compensações Internacionais (BIS) e dos
bancos privados de que o fluxo
privado para emergentes, em
2003, será um pouco melhor do
que este ano. Algum dinheiro
para financiar o Brasil e aliviar
o câmbio haverá, se o país conseguir restabelecer a confiança. Esta batalha está só começando.
E-mail: CelPinto@uol.com.br
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