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QUESTÃO INDÍGENA
Menina de seis meses é a terceira a morrer de desnutrição no Estado neste ano; em 2004, foram 15 casos
Fome mata mais uma criança índia em MS
HUDSON CORRÊA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CAMPO GRANDE
A desnutrição causou a morte
de mais uma criança índia da etnia caiuá em Dourados (218 km
de Campo Grande, em Mato
Grosso do Sul). "A desnutrição levou à diarréia e à desidratação, e a
criança morreu", afirmou ontem
o médico Zélik Trajber, 58, que
presta serviço de assistência na aldeia para a Funasa (Fundação Nacional de Saúde).
A menina Kelly Fernandes, que
tinha seis meses e 15 dias de vida,
morreu no sábado pela manhã no
Hospital da Mulher localizado na
cidade, mas a morte só foi confirmada ontem pela Funasa. O bebê
estava internado havia nove dias.
É o terceiro caso de morte por
desnutrição neste ano nas aldeias
de Dourados.
As outras vítimas foram uma
menina de três anos e 11 meses,
em fevereiro, e um bebê de oito
meses em janeiro. Os dois também eram caiuás. Em 2004, ocorreram 15 mortes devido à fome
nas aldeias do sul do Estado.
O médico Helder Lúcio Ganacin, 33, também da Funasa, e Trajber informaram que no atestado
de óbito constará como causa da
morte desidratação e diarréia. Ganacin e Trajber disseram que a
desnutrição tornou a criança mais
vulnerável às doenças, porém não
aparecerá como motivo da morte.
No atestado de óbito das outras
duas crianças que morreram neste ano a desnutrição aparece como causa direta.
Kelly Fernandes morava na aldeia Bororó ao lado de um posto
de saúde. Ela era sobrinha do capitão (líder indígena máximo)
Luciano Arévolo.
"A família resistia para internar
a criança. Apesar de serem pessoas esclarecidas. Não entendi isso", afirmou o vice-presidente do
Conselho Distrital de Saúde Indígena, o índio terena Fernando da
Silva Souza, 37.
Segundo ele, com muita dificuldade os agentes de saúde conseguiram convencer os pais a internar a criança.
O capitão da aldeia de Caarapó,
Sílvio Paulo, 45, afirma que, na
cultura indígena, os pais costumam chamar diarréia em crianças de "kuaia virado", doença curada pelos líderes religiosos que
no tratamento batem nos pés das
crianças durante rituais.
Paulo disse que é preciso conversar com as famílias para convencê-las a levar os bebês doentes
ao médico.
Ganacin e Trajber preferem não
comentar esses aspectos da cultura dos guaranis e caiuás. A Funasa
tem dados sobre a fome.
Mortalidade infantil
Em Dourados vivem 11 mil índios das etnias guarani, caiuá e terena, em uma área onde deveriam
estar no máximo 200 famílias.
Falta terra para plantar.
Segundo a Funasa, na reserva
indígena de Dourados 12% dos
índios menores de cinco anos de
idade, ou 232 crianças, estão desnutridas, e 19% (357) vivem em
risco nutricional, ou seja, abaixo
do peso considerado normal.
Em 2004, o índice de mortalidade infantil aumentou 15% nas aldeias de Dourados, passando a
64,33 por mil nascidos vivos. A
média brasileira é, segundo o Ministério da Saúde, de 24 por mil.
A situação em Dourados é, contudo, menos grave que nas aldeias
dos guaranis e caiuás, localizadas
mais ao sul do Estado.
Em Amambai, 331 (19% da aldeia) crianças estão desnutridas, e
outras 306 (18%), em risco nutricional. A mortalidade infantil
chegou a 96,47 por mil nascidos
vivos. Em Tacuru, a mortalidade
triplicou, indo a 94,34.
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