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Índios recorrem a lixão para sobreviver
DA AGÊNCIA FOLHA, EM DOURADOS (MS)
Índios guaranis e caiuás da reserva de Dourados (218 km de
Campo Grande) recorrem até a
um lixão para sobreviver. As
crianças desses povos são as mais
atingidas por desnutrição e mortalidade infantil no país.
No depósito de lixo a 16 km das
aldeias, já dentro do município de
Itaporã, índios recolhem roupas,
madeira, latinhas ou papelões para vender, qualquer utensílio doméstico e até, segundo o prefeito
da cidade, Marcos Antônio Paco
(PFL), "restos de comida".
Na quinta-feira à tarde, a reportagem encontrou no lixão a caiuá
Elisabete Arce, 18. Ela disse que
não recebe cesta básica do governo estadual.
Estava com dois irmãos adolescentes e outro, de sete anos, que
carregava no meio do lixo a filha
de Elisabete, de oito meses. A
criança tinha na boca uma mamadeira suja. "Na aldeia falta de tudo. Até calcinhas. Por isso viemos
aqui", diz a irmã de Elisabete, sem
falar o nome.
No dia seguinte, a reportagem
voltou ao lixão. Encontrou o casal
Leila, 25, e Gilson da Silva, 32. Os
dois estavam catando sacos de estopa, segundo eles, para embalar
o milho que vão produzir em um
hectare que têm na aldeia. "Eu
não trago minhas crianças aqui.
Nem cato comida", diz Leila, mãe
de seis filhos menores de 13 anos.
O médico Antônio Aurélio Teixeira de Carvalho Neto, que atende crianças nas aldeias, disse que
índios freqüentam lixões. Seu colega Zelik Trajber recebeu de uma
agente comunitária a mesma notícia na sexta-feira.
O prefeito disse que está cercando o local, construindo guarita e
deve contratar um segurança para
impedir a entrada de catadores.
Nas aldeias Jaguapiru e Bororó,
que formam a reserva de Dourados, faltam rios e córregos próximos às casas. Alguns índios pescam lambaris em poças de água
barrenta para garantir o almoço.
Outros caminham mais de uma
hora em busca de água fresca trazida em galões de córrego, mas
que chega quente aos barracos de
lona cobertos por sapé onde estão
crianças, algumas desnutridas.
É o caso da índia caiuá Ediléia
da Silva Isnarde, 18, mãe de Graciele, 2, e Islaine, 1. A primeira
criança pesa 9 kg, mas deveria ter
12 kg. A segunda tem 6 kg, segundo a mãe, porém o peso ideal para
a idade é no mínimo 9 kg.
A casa de Ediléia, que hoje recebe uma cesta básica do governo
estadual, é formada por pedaços
de madeira, lona preta e sapé. É
semelhante à boa parte das casas
nas aldeias de Dourados. Em volta delas, o matagal perde-se de
vista. Em meio dele, resistem algumas plantações de milho.
Juntas, as aldeias têm 3.600 hectares (cada hectare tem 10.000
m2). Nas duas, vivem cerca de 11
mil indígenas, segundo a Funai
(Fundação Nacional do Índio),
incluindo a etnia terena, além da
guarani e caiuá. Se fosse um assentamento da reforma agrária,
caberia cerca de 200 famílias de
trabalhadores com lotes de 20 ha.
O caiuá Carlinhos Gonçalves,
23, que mora com mulher e duas
crianças menores de quatro anos,
tem apenas dois hectares.
Sem poder plantar, o caiuá Sérgio Cabreira, 30, virou servente de
pedreiro na cidade e tem renda
mensal de R$ 280. A mulher dele,
Dalila, 26, mãe de quatro crianças,
diz que a cesta básica do governo
dura só dez dias. Ela mostra o que
ainda resta de alimento da cesta
ao lado de 30 kg de arroz comprados com dinheiro de Cabreira.
Para garantir o almoço, Ambrósio de Araújo, 18, e sua mulher,
Silvana, 16, com a filha Nádia, de
dois meses, pescavam lambari em
uma poça barrenta que aflora do
lençol freático na última sexta-feira. Usava um saco como rede para
pegar lambaris.
(HC)
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