São Paulo, sexta-feira, 22 de dezembro de 2000

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QUESTÃO AGRÁRIA


Militante dava aulas e dividia livros de autores de esquerda

Sem-terra difunde MST na cadeia



ROBERTO COSSO
ENVIADO ESPECIAL A ITAPETININGA

Cerca de 50 presos da Penitenciária de Itapetininga se comprometeram a ingressar no MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) quando saírem do presídio, após conviverem durante seis meses com os seis sem-terra condenados pela depredação do pedágio de Boituva (SP), em 10 de novembro de 1999.
Os sem-terra foram libertados no final da tarde de ontem, por conta de uma liminar em habeas corpus concedida na última quarta pelo desembargador Gentil Leite, segundo-vice-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo.
Os advogados dos sem-terra foram a Itapetininga na quarta, mas a juíza Ana Cristina Paz Néri, responsável pela sentença judicial que condenou os sem-terra a penas de oito a dez anos, só assinou o mandado de soltura ontem à tarde. Cerca de 15 militantes do MST aguardavam os presos e os receberam com fogos de artifício.
Valquimar Reis Fernandes, 30, usou seu tempo na prisão para ensinar aos presos os ideais do MST. Por ter curso superior incompleto em ciência da computação, foi convidado para dar aulas. Todos os seus 45 alunos foram aprovados em exames supletivos.
Ele afirma que "mais ou menos uns 50 presos" disseram estar interessados em ingressar no MST. "O pavor dos presos é o desemprego. Eles não têm garantia de que serão aceitos em algum lugar quando saírem daqui. Antes, já era difícil. Agora, com o preconceito (contra ex-detentos), essa dificuldade aumenta muito. O MST é a única saída para eles conseguirem algum emprego."
Ele contou que os presos do MST recebiam, de pessoas que os apoiavam, livros de autores socialistas, como Che Guevara, Fidel Castro, Lênin, Caio Prado Júnior e Florestan Fernandes. "A gente socializava essa leitura e alguns presos, depois, vinham falar em "mais-valia", uma linguagem que a gente fica meio assustado de ouvir (na cadeia)", afirmou Fernandes.
O sem-terra, que fez greve do fome durante seis dias, reafirmou que sua prisão foi política. Segundo o advogado Aton Fon Filho, o MST dizia havia muito tempo que a prisão era ilegal e baseada exclusivamente em questões políticas.
Roosevelt Roque dos Santos, ex-presidente da União Democrática Ruralista, criticou a libertação. "Existe por parte tanto do Executivo como do Judiciário uma leniência (mansidão) em não cumprir a lei, em não fazer com que aquilo que é errado seja punido."


Colaborou EDMILSON ZANETTI, da Agência Folha, em São José do Rio Preto


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