São Paulo, Sexta-feira, 23 de Abril de 1999
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SISTEMA FINANCEIRO
Senadores da CPI investigam lista de ganhos de instituições com a desvalorização do real em janeiro
Crise deu até 1.300% de lucro a fundos

MÔNICA BERGAMO
VANESSA ADACHI
da Reportagem Local


A desvalorização cambial de janeiro possibilitou a alguns investidores lucro superior a 1.300% sobre o dinheiro que tinham aplicado no banco.
A CPI dos Bancos investiga uma lista fornecida pelo Banco Central com a rentabilidade dos fundos administrados por 179 instituições financeiras.
Nela se vê que, se os clientes de alguns fundos do Marka, hoje no centro das investigações, perderam 94,8% do capital em janeiro, alguns viram o dinheiro ser multiplicado mais de dez vezes.
O fundo Sothern, do Banco Safra, teve a maior rentabilidade do mês: 1.349,1%. O Tiradentes, fundo do banco Credit Suisse First Boston Garantia ficou em segundo lugar: rendeu 921,7%, o que representou um ganho de R$ 417 milhões só em janeiro. Um fundo de capital estrangeiro do Pactual teve um rendimento de 725,6% em janeiro (veja quadro ao lado).
Os senadores ficaram impressionados com os ganhos destes fundos, muito superiores à variação do dólar em janeiro. A rentabilidade média dos fundos que investiram no dólar ficou em torno de 60%, acompanhando a desvalorização naquele mês. Desde a implantação do real, em 94, aplicações em dólar renderam 110% e em juros, 310%.
Os fundos investigados têm rentabilidade maior porque, diferentemente dos fundos tradicionais, são mais agressivos.
"É preciso investigar quem foram esses investidores tão sortudos", diz o senador Jader Barbalho (PMDB-PA). Alguns fundos aparecem na lista do BC como tendo apenas um cotista, ou seja, um único investidor. "Além de sortudos, são egoístas", diz.
O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) pediu à CPI a quebra de sigilo dos fundos para que os senadores conheçam o nome dos cotistas e qual o capital aplicado.
O senador desconfia que os fundos eram usados por bancos estrangeiros ou bancos brasileiros que têm subsidiárias no exterior. Isso desmontaria, segundo ele, a tese do presidente do BC, Armínio Fraga, de que os bancos estrangeiros tiveram um prejuízo médio de até 32% em dólar na crise. "Eles perderam de um lado, mas podem ter ganhado de outro, através destes fundos", diz Suplicy.
Outra desconfiança do senador: os bancos brasileiros e estrangeiros presentes no país teriam aplicado nos fundos de capital estrangeiro para não pagar os 20% de Imposto de Renda que incide sobre o lucro dos capitais nacionais.
Os fundos de capital estrangeiro, que estão entre os de maior rentabilidade, estão isentos de imposto até 30 de junho.
Bancos consultados pela Folha explicam que a alta rentabilidade se deve à natureza da aplicação. Eles compraram dólar no mercado futuro em uma operação conhecida como alavancagem.
Isso permite que um investidor que tem US$ 1 compre no futuro US$ 4, por exemplo. Se o dólar se valoriza 100%, em vez de ele ganhar mais US$ 1, ele ganha mais US$ 4. Se o dólar se desvaloriza quase 100%, ele perde o US$ 1.
O banco Opportunity diz que abriu o fundo Opportunity Super FIF com o patrimônio de outro fundo que reúne centenas de investidores e tem mais de R$ 200 milhões. Investiu como cotista único no fundo "filhote" e aplicou cerca de R$ 10 milhões numa operação alavancada em dólar futuro. Ganhou 513,7% e ficou com R$ 54,9 milhões, que foram reaplicados no fundo "mãe".
O diretor comercial da administradora Linear, Ednardo Figueiredo Junior, diz que o único investidor de seu fundo Bafra FIF, que rendeu 184,2%, é um outro fundo aberto nas Ilhas Cayman que reúne investidores do mundo todo.
O Banco Santander disse que só falaria com a autorização de seu cliente estrangeiro, único cotista de um fundo que ganhou 259,6%, ou R$ 28,2 milhões. O Indosuez garante que os recursos aplicados em seu fundo mais rentável são de vários clientes, e não dele mesmo.
O Safra afirmou que comentará o caso hoje. Os bancos BBA, Garantia, Pactual e Matrix não quiseram se pronunciar. O Citibank disse que informações sobre os fundos só interessam a seus clientes


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