São Paulo, Domingo, 23 de Maio de 1999
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JUDICIÁRIO
Obra é investigada por suposto superfaturamento
Empresa de ex-juiz fez prédio do TRT

RUBENS VALENTE
da Agência Folha, em Porto Velho

O prédio do TRT (Tribunal Regional do Trabalho) da 14ª Região, em Porto Velho (RO), foi construído pela construtora Cota, de Antônio Adamor Gurgel do Amaral, ex-juiz classista do mesmo tribunal. Antônio Adamor deixou o cargo há apenas dois meses. Há suspeitas de superfaturamento na obra.
A Cota (Construtora da Amazônia S/A) tem como sócios três irmãos -Antônio Adamor, Antônio Adelino e Alan Gurgel do Amaral- e suas mulheres.
O empreiteiro Antônio Adamor Gurgel do Amaral, 57, que tem 32% das ações da empresa, foi nomeado juiz classista de segunda instância no TRT de Porto Velho em fevereiro de 92, oito meses antes da publicação do edital da obra, e reconduzido ao cargo em 95, de onde saiu em fevereiro último.
Em entrevista gravada, Antônio Adamor confirmou ser "um dos maiores acionistas" da Cota, mas disse não ter "poder de mando nem gerência" na empresa e que, por isso, estaria respaldado por lei.
A lei que regulava licitações na época (decreto-lei 2.386) permitia que Antônio Adamor participasse da concorrência, desde que não desempenhasse função de comando na empresa.
Antônio Adamor não faz parte do Conselho Administrativo, mas o negócio é todo tocado pela família. O conselho é formado pelas mulheres e filha de seus irmãos e pelos irmãos Antônio e Alan.
A lei que sucedeu o decreto, de 1993, proíbe que uma empresa de propriedade de um servidor público preste serviços ao órgão ao qual ele pertence.
A Agência Folha apurou ainda que a Cota, sem atender uma exigência do edital de licitação, apresentou como exemplo de experiência técnica a construção de um matadouro frigorífico, enquanto o edital de licitação exigia que fosse uma obra "da mesma natureza".
A ligação do empreiteiro com o TRT pode ter rendido a ele informações privilegiadas sobre a obra. Seis meses antes da publicação do edital de licitação para a construção do prédio, a Cota decidiu, em reunião dos cotistas, aumentar o capital social da empresa em 1.171%, projetando um valor de Cr$ 2,5 bilhões (valor da época).
Com isso, a empresa atendeu uma exigência do edital de licitação que nem era conhecido até então -ter um capital social mínimo de Cr$ 2 bilhões.
O Ministério Público Federal e o TCU investigam a suspeita de irregularidade há mais de seis anos.
O valor real da obra por m2 é controverso, devido a uma diferença na medição da área construída. Enquanto o TCU apontou 10.668 m2 construídos, a Prefeitura de Porto Velho encontrou 13.630 m2.
Também o total gasto com a obra é motivo de polêmica. O deputado Giovanni Queiroz (PDT-PA), com base no Tesouro Nacional, afirma que R$ 38 milhões foram canalizados para a obra, mas o TRT e o TCU identificam um desembolso de R$ 21,5 milhões.
Segundo o TRT, o preço por metro quadrado construído foi de R$ 1.579. Assim, o tribunal teria pago quase quatro vezes os R$ 378 desembolsados por m2 construído do prédio da Justiça Federal de Porto Velho, erguido no início da 95 a apenas 200 m do prédio do TRT.
O presidente do TRT-RO à época do lançamento do edital da licitação, Heraldo Fróes Ramos, não soube explicar o fato de a Cota ter aumentado em 1.171% seu capital social seis meses antes.
Fróes afirmou que o custo da obra foi alto em parte porque a Cota também forneceu equipamentos para a cozinha, auditório e outros setores e, em parte, porque o material empregado também atendeu exigências específicas do TRT rondoniense.


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