São Paulo, Domingo, 23 de Maio de 1999
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CELSO PINTO
CVM contra nova agência

O presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Francisco Costa e Silva, responsável pela regulação e fiscalização do mercado de capitais, é totalmente contrário à proposta que está sendo costurada no Congresso de criar uma nova agência supervisora.
"É melhor ajustar o que existe do que criar um problema maior", disse, numa conversa no início da semana, no Rio. O "problema maior" seria, a seu ver, um novo órgão. Especialmente se sua função for a de supervisionar os órgãos supervisores que já existem, como querem alguns.
O que existe hoje, sem dúvida, é uma enorme confusão. O Banco Central fiscaliza os bancos, uma parte dos mercados futuros e uma parte dos fundos. A CVM fica com as bolsas, outra parte dos futuros e dos fundos. A Susep fiscaliza as seguradoras e um tipo de previdência privada. A Secretaria de Previdência Complementar (SPC) fiscaliza outra parte.
São estilos, normas e regras diferentes. Há zonas cinzentas. A CVM considera fundo de ação, sob sua responsabilidade, o que aplica mais de 51% em ações. O BC classifica como fundo de renda fixa, sob sua tutela, o que investe até 20% em ações. Existe um buraco negro onde mergulham os fundos que aplicam de 21% a 50% em ações.
O BC não permite que a CVM tenha acesso a contas bancárias de quem transgride regras de sua fiscalização, na área do mercado de capitais. A cooperação geral entre as agências reguladoras é, no mínimo, precária.
Não seria uma boa razão para criar uma nova agência, juntando tudo? Não, acha Costa e Silva. Melhor seria organizar o que já existe. Transferir toda a regulação dos fundos para a CVM. Deixar o BC fiscalizando os bancos, já que é o emprestador em última instância para eles, e regulando os mercados futuros. Deixar a Susep com os seguros e a SPC com a previdência complementar, ou, talvez, transferir tudo para a Susep.
Importante, além de dividir melhor tarefas e mercados, seria dar aos reguladores um mandato que não coincida com o mandato presidencial, para lhes dar mais autonomia. E dar mais flexibilidade no uso do orçamento, quando há receita própria. A CVM deve arrecadar cerca de R¹ 60 milhões em taxas cobradas ao mercado, mas só poderá usar cerca de R¹ 40 milhões.
É claro que é um desenho que favorece a CVM, mas ninguém duvida da importância de haver uma agência reguladora poderosa, como a SEC americana (que também controla todos os títulos emitidos, inclusive os do governo, mas não os mercados futuros). O debate mal começou.

Brasil X Espanha
Nos próximos 30 dias, Costa e Silva, deve responder à proposta dos espanhóis de que ações brasileiras sejam negociadas lá e ações espanholas sejam negociadas aqui, sem restrições. O negócio é mais controverso do que parece.
A Espanha quer se transformar no principal polo negociador de ações latino-americanas na Europa. É uma opção natural. Com o euro, o mercado europeu tende a se concentrar em Paris e Frankfurt e a tendência seria o mercado espanhol minguar.
Dados os laços e investimentos espanhóis na América Latina, faria sentido a especialização. Pela proposta, seria possível negociar diretamente as ações nos dois países. É diferente dos ADRs negociados nos Estados Unidos: eles são títulos emitidos lá, lastreados em ações externas, mas sujeitos à regulação local.
Traduzindo: emitir um ADR significa custos adicionais e adaptação à regulação local, o que inclui mudar as normas contábeis dos balanços. A proposta com a Espanha elimina esses custos. Aí começam as resistências.
A Bolsa de São Paulo foi contra, disse Costa e Silva. O temor é que os custos menores estimulem uma migração de negociações para o mercado espanhol. A Bolsa do Rio, que é uma fração do mercado paulista, é a favor e começou as negociações sobre as quais a CVM deve se pronunciar.
Embora muito menor que a Bovespa, a Bolsa carioca reúne as principais empresas. Se fizer o acordo, estará aberta a porta, admite Costa e Silva. Ele observa que, para as empresas, o acesso direto ao mercado espanhol pode ser muito interessante, permitindo captar recursos num mercado muito amplo.
Existe, contudo, o risco de concentrar a liquidez de certas ações no mercado externo, o que seria ruim para o mercado de capitais local. Costa e Silva esteve esta semana na Espanha e em Portugal discutindo, entre outras coisas, esse tema.



E-mail: CelPinto@uol.com.br



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