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Cirurgias foram trocadas por votos em 94
do enviado a Itabuna (BA)
Na memória dos mais velhos, as
colinas ovaladas e muito verdes
nas imediações de Pau Brasil (566
km ao sul de Salvador), eram o
posto indígena Caramuru. A área é
hoje conhecida como São Lucas/
Novo Mundo, fazendas que os hã-hã-hãe recuperaram na Justiça.
Os índios falam português, vestem-se com roupas envelhecidas,
de gente pobre: camisetas e bermudas, sandálias de dedo e bonés.
Dividem-se entre católicos e batistas. A língua e as tradições foram
ficando pelo caminho, ao longo
dos anos de diáspora como trabalhadores rurais.
"Eu fui para fazer uma consulta
médica em Camacã, em 15 de março de 94, e o médico disse que precisava operar", diz Mercy Silva
Queiroz, 30. Ela tinha dois filhos e
apenas 26 anos quando sofreu cirurgia para ligadura das trompas.
Revelou, no cadastro, que era
moradora da área indígena. Não
lhe disseram que índia só poderia
operar com autorização da Funai.
"Depois perguntaram se eu era
eleitora e tinha parente que votava.
Pediram voto para o dr. Roland."
As histórias são muito semelhantes umas às outras. Ilsa Rodrigues
da Silva Pataxó, 28, foi "convidada" a se esterilizar -recebeu o recado por uma parente- por uma
pessoa chamada Daniel, que se
apresentou como amigo de Roland
Lavigne. Ela e uma prima foram levadas no carro dessa pessoa, em 31
de maio de 94. As duas índias mostraram o título de eleitor, e Daniel
pediu a ambas que votassem em
Lavigne para deputado federal.
"Na época achei que a ligadura
seria importante para nós, mas hoje percebi que é uma coisa que prejudica o futuro do índio."
Jovenina Santos Pataxó foi esterilizada aos 31 anos. "Falavam que
era bom para a gente, já que a gente
não tinha ajuda do governo". Diz
ter sido operada "na época da política, quando eles falaram para a
gente operar em troca do voto".
Disse nunca ter sido informada
sobre pílula, preservativo ou outros métodos anticoncepcionais.
"Nunca dão esse tipo de explicação
para índios. Na cabeça da gente,
quem não operava tinha um filho
atrás do outro", afirmou.
Foi abordada por um homem
que se ofereceu para operá-la de
graça. Foi num sábado, dia que os
índios vão a Pau Brasil para vender
na feira os legumes que cultivam.
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