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PÚBLICO x PRIVADO
Procuradoria usará arquivos de CPIs antigas em investigação
Governo avalia que abafou
CPI sobre Eduardo Jorge
ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O governo encerrou a semana
avaliando que afastou a possibilidade de uma CPI no Congresso e
concentra agora o seu temor numa outra frente: o Ministério Público, de onde podem surgir novos indícios e fatos.
Setores da oposição fizeram
uma "dobradinha" com os procuradores que investigam o envolvimento do ex-secretário-geral da
Presidência Eduardo Jorge com
desvio de dinheiro público. Isso
pode funcionar como uma CPI
informal.
Na segunda-feira passada, o senador José Eduardo Dutra (PT-SE), um dos mais atuantes da CPI
do Judiciário -que detonou o caso do TRT-SP-, entregou peça
que pode ser decisiva: um CD-ROM com todas as quebras de sigilo obtidas ao longo dos trabalhos.
Encol
O detalhe fundamental é que o
CD-ROM inclui também parte de
investigações feitas por uma outra
CPI, a do sistema financeiro. A
desconfiança de senadores e de
procuradores é que possa surgir
algum elo de Eduardo Jorge com
bancos e empresas privadas que
foram alvos da comissão.
Há, inclusive, uma fita da TV
Senado com um depoimento do
dono da Encol, Pedro Paulo de
Souza, à CPI do sistema financeiro, contando a interferência de
Eduardo Jorge para tentar evitar o
colapso da empreiteira.
Procuradores e senadores
acham que a base de investigações
é exatamente o material colhido
pelas duas CPIs, mas não focado à
época de suas atuações em Eduardo Jorge. O que falta é um "pente
fino" no que já existe.
Eixos
Conforme a Folha apurou, haverá agora uma inversão de eixos.
Na CPI do Judiciário, o primeiro
eixo foi o ex-juiz Nicolau dos Santos Neto, hoje foragido. A partir
dele, chegou-se ao senador Luiz
Estevão de Oliveira, que acabou
cassado. A partir de ambos, raciocinam, está na hora de "pegar
Eduardo Jorge".
À época, a CPI resvalou em
Eduardo Jorge ao identificar 117
ligações do juiz para ele, quando
ainda ocupava cargo no Planalto,
na sala ao lado do gabinete presidencial. Mas não foi adiante nessa
linha de investigação.
Além da pressão discreta e subterrânea dos governistas, houve
também uma questão de conveniência da própria oposição.
"Nossa prioridade era o Luiz Estevão. Temíamos que, se abríssemos demais o leque, o governo
entrasse com tudo e acabasse prejudicando qualquer desfecho da
CPI, mesmo contra Luiz Estevão.
Era melhor um pássaro na mão
do que dois voando", admite hoje
o petista Dutra (leia texto na pág.
A-6).
Prioridade
Com a prisão do juiz já decretada e o destino político do senador
do DF traçado, o eixo passa a ser
Eduardo Jorge. A prioridade é
identificar alguma evidência, o
suficiente para justificar a quebra
de sigilo bancário e fiscal do ex-assessor palaciano e a convocação
de testemunhas.
Até agora, essa evidência não
existe. Os procuradores sabem e
admitem isso em conversas reservadas. O governo também sabe e
comemora.
Na avaliação governista, a imprensa começa a "perder o gás"
nas investigações independentes
e nas denúncias e está cada vez
mais nas mãos dos procuradores.
Contra-ataque
Enquanto isso, o contra-ataque
é na área econômica. A terceira
queda sucessiva dos juros em um
mês, com o ministro Pedro Malan
(Fazenda) de férias, foi considerada no PFL como "um golpe de
mestre".
A intenção é manter um certo
clima de estabilidade na economia, destacar os investimentos internacionais e obter manifestações positivas do empresariado.
O cenário estritamente político
também está sendo considerado
sob controle, porque se somaram
dois fatores: os partidos governistas uniram-se contra a criação de
uma CPI, e a oposição rachou.
PPS, PSB e PDT, de formas diferentes, não investiram numa CPI,
já, para apurar especificamente
TRT-Eduardo Jorge.
Mesmo no PT, houve uma divisão tática: os deputados Milton
Temer (RJ) e Walter Pinheiro
(BA) apresentaram um pedido de
representação para iniciar um
processo de impeachment do presidente Fernando Henrique Cardoso. Ficaram praticamente isolados.
No campo governista, o Planalto registra que o PSDB não fez
mais do que sua obrigação ao defender o governo, o PFL agiu
prontamente para evitar a CPI, e o
PMDB praticamente acompanhou a crise à distância.
Esses comportamentos de hoje
devem repercutir mais adiante. O
PFL, por exemplo, já dá como certa a eleição do deputado Inocêncio Oliveira (PE) para a presidência da Câmara. Já o PMDB não deve considerar o seu presidente, Jader Barbalho (PA), virtualmente
eleito para a presidência do Senado.
Divisor de águas
Numa conversa com um aliado
no meio da semana, FHC disse
que a crise estabelecera uma espécie de "divisor de águas".
Como todos admitem que houve um "dano irrecuperável" para
o governo e não há mais votações
com quórum de três quintos
(emendas constitucionais), FHC
poderá tentar se libertar de algumas amarras.
Na época das intensas articulações e negociações para evitar a
CPI para apurar a denúncia de
compra de votos para a reeleição,
FHC praticamente virou refém
dos partidos governistas.
O PMDB, por exemplo, impôs
como quis para o ministério o deputado Eliseu Padilha (Transportes) e o senador Iris Rezende (Justiça).
Agora, diz o interlocutor de
FHC, a pressão interna é para que
haja o contrário: com índices
muito ruins de popularidade
(41% de péssimo e ruim, segundo
o último Datafolha), FHC está
sendo pressionado para dar absoluta prioridade para a opinião pública.
Qualquer escolha de novos ministros, por exemplo, vai considerar menos a questão partidária
pura e mais o efeito sobre os formadores de opinião.
Cenários
Todas as avaliações e passos políticos, porém, dependem ainda
das investigações. O governo sabe, e teme, que sempre podem
surgir novidades nesse tipo de
processo.
Já tirou o ministro Martus Tavares (Planejamento) da linha de tiro. Já combinou um "modus operandi" com a Polícia Federal. Já
recebeu recados de Eduardo Jorge
de que manterá sua fidelidade ao
ex-chefe "até o fim".
Apesar de sua instabilidade
emocional, o ex-ministro tem dito a interlocutores e amigos que se
manterá leal ao presidente.
Essa posição de EJ se mantém
mesmo em seus momentos de depressão. Sua preocupação é tentar
esclarecer a natureza de suas atividades profissionais recentes.
Agora, o governo avalia que faltam três fatores para ultrapassar a
atual crise, a mais séria dos dois
mandatos de FHC: a versão do ex-juiz Nicolau, as descobertas do
Ministério Público e o chamado
"imponderável".
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