Presidente afirma que assunto, que provocou atrito entre Legislativo e Judiciário, deve ser tratado na reforma política

Petista diz ter adiado pacote econômico porque o "povo" está com a cabeça no Natal e sugere fórum para discutir uma reforma da Previdência

LUCIANA CONSTANTINO
ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Após a derrota dos parlamentares na tentativa de elevar o salário a R$ 24,5 mil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu ontem a criação de um teto salarial único para o funcionalismo público e quer que o assunto seja tratado na discussão da reforma política.
Hoje, o maior salário é pago pelo Poder Judiciário, seguindo pelo Legislativo (R$ 12,8 mil) e depois o Executivo (R$ 8.885). Deputados federais e senadores já falam em manter congelado o salário do Judiciário (R$ 24,5 mil) até que seja igualado pelos demais Poderes.
Em café da manhã com jornalistas, Lula disse ainda que adiou o anúncio do pacote econômico porque a cabeça do povo está no Natal, "em pacote de presente", e afirmou que criará no segundo mandato um fórum nacional para discutir a reforma da Previdência Social.
Descontraído, Lula conversou durante uma hora e meia com jornalistas, que puderam gravar apenas a parte final da conversa e sinalizou que o pacote será anunciado na segunda quinzena de janeiro.
 

TETO SALARIAL
"Para você criar um teto, é preciso mudar a Constituição. Isso só será possível se os partidos estiverem de acordo. Não é fácil que se possa estabelecer uma política salarial homogênea para os três Poderes, principalmente quando quem ganha mais e acha que vai sair perdendo. É difícil mudar a cabeça das pessoas. Mas vamos encontrar uma solução negociada. [...] Defendo que na discussão com os partidos sobre reforma política também discuta a questão de mandar uma PEC [proposta de emenda constitucional] estabelecendo um teto salarial no país. Quando será eu não sei, mas vamos ter de cuidar disso. Tem muitas distorções e, se a gente estabelecer as regras definitivas para a sociedade saber o que vai acontecer cada ano, não acontecerá nunca a surpresa que aconteceu agora. Sou favorável ao estabelecimento de regras duráveis." Ao citar que os salários de cargos de confiança e do próprio presidente não são reajustados desde 1998, Lula brincou: "Vocês sabem o quanto é difícil manter o André Singer [seu porta-voz] ganhando R$ 7.000. As pessoas aqui não têm salário por fora. Se o André estivesse na Folha, estaria ganhando pelo menos R$ 30 mil".

PACOTE ECONÔMICO
"O motivo que mais me convenceu a não anunciar foi o Natal. A cabeça do povo não está em pacote, está no Natal. Eles querem pacote de presente. No segundo mandato é como futebol, não tem dois jogos iguais. Tudo o que prometemos para o primeiro mandato, fizemos. Estabilizamos a economia, aumentamos o crédito, a poupança interna subiu e o superávit está garantido. Não quero fazer um mandato repetido. Vamos fazer coisas novas. Vamos trabalhar para que o Brasil tenha investimentos públicos e privados em infra-estrutura."

PREVIDÊNCIA
"As pessoas têm mania de às vezes colocar todas as soluções em uma única coisa, como na reforma da Previdência. A reforma não é para cobrir o rombo, mas para garantir a Previdência para as futuras gerações. Não vamos mexer com quem já está recebendo, quem já está trabalhando. Vou criar, a partir do próximo ano, um fórum nacional para discutir essa reforma. Essas coisas não podem ser discutidas de forma apaixonada, não se pode colocar a paixão acima da razão."

SALÁRIO MÍNIMO
"O acordo com as centrais sindicais é uma coisa inédita na história do Brasil. Algumas pessoas tentaram dizer que o aumento do salário ia atrapalhar. Estou determinado a recuperar o salário mínimo. Todo ano vai ter que aumentar um pouquinho. [...] Eu não estava em débito com as centrais, porque nunca se tratou os sindicatos como eu trato, até porque sou do meio deles. Mas não basta tratar bem, é preciso valorizar, é um gesto de reconhecimento do Estado. Recebo tantos empresários, por que não posso receber trabalhadores? [...] O salário mínimo é a melhor forma de distribuição de renda que se fez nesse país."

MOVIMENTOS SOCIAIS
"De vez em quando, aparece um bacana num carrão que joga uma lata de cerveja para fora. Ele tem valor, mas o catador que recolhe o lixo dele não tem nenhum. Quando deixar a Presidência, meu sonho é que a gente tenha instituído outro padrão de relacionamento entre o Estado e a sociedade, e qualquer que seja o presidente, ele vai ter que falar com a sociedade toda. O palácio do presidente não é feito para essa gente. É feito para rei, rainha, ministro e megaempresários. Eu acho que palácio de presidente tem de ser para todos. Os humildes estão vindo, e eu acho que as pessoas gostam disso."


Texto Anterior: BC vai exigir dos bancos mais cuidado com políticos
Próximo Texto: "Eu estou muito mais maduro, mais consciente'
Índice