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NO PLANALTO
Contas de Ricardo
"R$ 4,5 milhões" Sérgio já estão ao relento
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Caiu a liminar que impedia
a Receita Federal de apalpar os extratos bancários de Ricardo Sérgio de Oliveira. O destino do coletor das arcas eleitorais do grão-tucanato é agora
uma porta aberta para a encrenca.
Aqui se publicou, no domingo
passado, a notícia de que o fisco
passa um pente-fino nas declarações de rendimentos de oito
arrebanhadores de fundos do
comitê de campanha de FHC.
Entre eles, Ricardo Sérgio.
Intimado e reintimado a apresentar os extratos de suas contas
bancárias, Ricardo Sérgio foi
buscar refúgio contra o que chamou de "devassa violadora"
atrás de uma liminar obtida na
Justiça Federal de Brasília.
Já na segunda-feira, dia seguinte à revelação da Folha, o
juiz Hilton Queiroz, do TRF da
1ª Região, arrancou-lhe o biombo. Acatando recurso do procurador Wagner Pires de Oliveira,
da Fazenda Nacional, suspendeu os efeitos da liminar.
Abriu-se o caminho para que,
nos próximos dias, a Receita vá
buscar na marra os dados que
Ricardo Sérgio tenta proteger da
luz do sol. Respaldado na lei, o
fisco requisitará diretamente à
rede bancária o mapa do varejo
da movimentação financeira do
investigado.
Só no biênio 1998/1999, escoaram pelas contas de Ricardo
Sérgio algo como três Jorge Murad e meio: cerca de R$ 4,5 milhões. Está-se falando apenas da
pessoa física. Não entram no
cálculo as contas de empresas
do personagem.
Como a renda declarada de
Ricardo Sérgio é grotescamente
inferior à sua movimentação
bancária, a Receita quer saber
de onde veio e para onde foi a
dinheirama. Daí o vívido interesse em cotejar os extratos.
Ricardo "no limite da irresponsabilidade" Sérgio é um escândalo esperando na fila para
acontecer. Ele começou a emergir do mundo das sombras entre
1995 e 1998. Nesse período, ocupou a diretoria internacional do
Banco do Brasil. Sob o apadrinhamento de José Serra, cujo
baú de campanha ajudara a
fornir em 1994.
Informado pelo repórter sobre
a implosão da liminar, o advogado de Ricardo Sérgio, Luiz
Rodrigues Corvo, disse que seu
cliente "deve recorrer" da decisão do juiz Hilton Queiroz. O
que remeterá o caso para a 4ª
turma de julgamento do TRF. A
decisão pode ser demorada.
Os fiscais da Receita apostam
que concluirão a pescaria na rede bancária antes de um novo
pronunciamento do Judiciário.
E peixe recolhido ao cesto, como
se sabe, não costuma ser devolvido ao mar com vida.
Os herdeiros de Sérgio Motta
são companheiros de infortúnio
de Ricardo Sérgio. Antes de
morrer, em 1998, o ministro frequentou o submundo monetário das campanhas eleitorais.
Agora, para desassossego da
viúva Wilma Motta, que guarda zeloso silêncio, a Receita
perscruta cada dobra do inventário do marido. Detectaram-se
supostas incongruências graves.
Os auditores fiscais farejam confusão. Agem com prudência extremada. Sabem que lidam com
nitroglicerina.
Vasculham-se também, como
já noticiado, as declarações de
outras seis pessoas: Luiz Carlos
Bresser Pereira, Andréa Matarazzo, Egydio Bianchi, Ademar
Cesar Ribeiro, Luiz Fernando
Furquim e Humberto Motta.
O trabalho da Receita, eminentemente técnico, chega num
momento em que o cenário eleitoral é turvado pelo barulho que
emana dos porões de Brasília.
Um ranger ensurdecedor de dobradiças. Um frenético abrir e
fechar de armários e gavetas.
Há muito papel estocado. O
material não insinua boa coisa.
É tonificado por um ingrediente
apimentado. Chama-se dinheiro de campanha. Para ser mais
preciso: caixa dois.
Um exemplo: em depoimento
aos procuradores Guilherme
Schelb e Alexandre Camanho,
no dia 17 de novembro de 2000,
o ex-ministro José Eduardo Andrade Vieira (Agricultura) declarou:
1) na primeira campanha de
FHC, em 1994, foi convidado a
exercer a coordenação financeira da campanha. Aceitou apenas o papel de "colaborador";
2) a coordenação foi centralizada nas mãos de Sérgio Motta.
Auxiliaram-no na arrecadação
Bresser Pereira e Andrea Matarazzo, "entre outros";
3) não havia prestação de contas do dinheiro amealhado à
coordenação política da campanha;
4) quando o empresário não
desejava aparecer, "para permanecer no anonimato", comparecia com moeda sonante.
Existiam "contas bancárias paralelas";
5) FHC "acompanhava pessoalmente o volume de recursos
financeiros arrecadados" em
1994.
Andrade Vieira parece conhecer bem a matéria. Na quinta-feira, o ex-presidente José Sarney guiou os seus pés de barro
até a tribuna do Senado. Às voltas com a imagem do R$ 1,34
milhão que envenena as pretensões presidenciais da filha Roseana Sarney, disparou:
"O senador Antonio Carlos
Magalhães conta como testemunho, sobre a memória de seu
grande filho Luís Eduardo Magalhães, que viu, em 1994, o senador Andrade Vieira entregar
R$ 5 milhões -hoje, atualizados, R$ 10 milhões- como contribuição à pré-campanha do
presidente Fernando Henrique
Cardoso. Na presença do candidato".
A referência não mereceu retoques do líder governista Artur
da Távola, escalado para rebater a fala de Sarney. O próprio
Palácio do Planalto reage às
menções monetárias com um silêncio ensurdecedor. Um silêncio que ecoa fundo na campanha.
Segue acesa a pendenga que
expõe as entranhas do consórcio
governista. Muitos se assombram com a troca de acusações.
Mas o eleitor, graças à disputa,
fica sabendo que os destinos do
país são comandados por pessoas que se consideram uma à
outra indignas de confiança.
Que a briga continue, que gere
consequências.
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