São Paulo, domingo, 26 de abril de 1998

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JANIO DE FREITAS
ACM

Os redatores que simplificam a tarefa adaptando títulos de filmes e peças, dos quais o "Quem Tem Medo de Virginia Woolf?" parece inesgotável na criação de mediocrices, não faltarão, agora, com o título "ACM, a Volta". Não há volta, porém.
A suposição peessedebista de que Antonio Carlos Magalhães, derrubado pela desgraça, abandonaria o centro de decisão, deixando de ser o grande fortalecido com a ausência de Sérgio Motta, foi mera excitação de neófitos. Por ora, não se sabe o que Antonio Carlos será e fará daqui para a frente, e é bem provável que nem ele o saiba, impedido ainda pelas circunstâncias de pensar a respeito.
Sabe-se, porém, um punhado de outras coisas. Por exemplo, que Antonio Carlos Magalhães faz parte do gênero de pessoas com têmpera incomum. Discordar dele sempre foi fácil, mas não há como ignorar que seu percurso, até a dimensão que há muito tem na política, não se fez de adesões pegajosas e indefinições convenientes.
Inaceitável com frequência, polêmica muitas vezes, compreensível e elogiável em outras ocasiões, sua atitude foi sempre de batalhador. Em luta pela manutenção do poder conquistado e de mais poder, com a largueza de métodos própria dos que se determinam a galgar o poder. Antonio Carlos nunca foi político de táticas sutis, de transversais refinadas. Ao objetivo pelo caminho mais objetivo -eis sua linha.
Desde que se determinou a ver Luís Eduardo na Presidência, sabia-se que atitudes pavimentavam esse caminho no atual quadro. Findo o objetivo, Antonio Carlos é uma incógnita. Em termos, porém. Porque uma incógnita com a têmpera de Antonio Carlos continua sendo mais têmpera do que incógnita.
Bem capaz, entre tantas hipóteses, de só sentir agora obrigações com suas idéias para o país, acima de partido, de eleição, de governo, de presidente. Talvez aquelas idéias, sejam quais forem, que gostaria de ver na ação do filho presidente e que sejam um dos seus modos de lembrá-lo.
Antonio Carlos não está voltando ao que não abandonou -o poder. Está continuando. Como e se continuará a fazê-lo, é resposta para depois. E dele.
Outro de risco
A convocação imediata de uma reunião com os ministros e líderes governistas no Congresso, marcada para terça-feira, evidencia que Fernando Henrique Cardoso quer dar uma demonstração de força pessoal, de suficiência para tudo conduzir mesmo sem Sérgio Motta e Luís Eduardo.
Para começar, não é uma boa homenagem que presta aos dois colaboradores tão decisivos, como primeiro ato de governo após as mortes deles.
E é a criação irrefletida de um risco. Quando, ainda no começo do mês, Luís Eduardo, Michel Temer e Inocêncio Oliveira chutaram para o dia 28 a tentativa de retomar a votação da Previdência, não o fizeram à toa. Foram forçados pela recusa do conjunto governista em fazer as aprovações desejadas pelo governo.
Não há indício de que as resistências estejam vencidas, e as ressalvas de Michel Temer quanto ao início das votações é bem sugestivo. A reorganização da base governista é possível, claro. Mas, se continuar inconveniente para o governo a abertura das votações na terça ou na quarta-feira, a demonstração de Fernando Henrique resultará no oposto do seu propósito.
Numerosos parlamentares estão cobrando as promessas feitas para votações anteriores, e não pagas. Muitos outros têm negociações iniciadas e inconcluídas. E um vasto contingente não tem vontade de aprovar, logo agora, medidas reconhecidamente prejudiciais à maioria do eleitorado.



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