São Paulo, terça, 26 de maio de 1998

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Ana, 11, ajuda o pai em ação

do enviado especial

Ana Paula Pires da Costa saiu da barreira pouco depois da meia-noite. Não se deu conta, mas tinha entrado no dia de seu 11 aniversário. Ela é a mais velha de quatro irmãos. Foi dormir porque no dia seguinte tinha aula. Está na 2ª série.
Sabe ler "mais ou menos", gosta de estudar e passou três horas no piquete sem sentir medo: "Acho que não é muito perigo. A gente não quer fazer o mal ao povo. O que eu tenho medo é de algum bêbado que abalroe o pessoal".
Na segunda-feira, comera arroz porque seu pai conseguiu um dia de serviços. Sua roça perdeu-se. Ela nunca passou um dia inteiro sem comer, mas foram muitas as noites em que dormiu sem jantar. Descreve assim a fome: "É uma coisa ruim. Dá tonteira e uma dor por dentro. Se bebe água, dói o estomago".

O saladeiro do Morumbi
Luís Carlos Ferreira de Mello, 51, viveu quase sete anos em São Paulo. Saiu de Tauá e acabou trabalhando como saladeiro no restaurante Casa Branca, no Morumbi. Foi também ajudante de cozinha e empregou-se por um tempo na loja Brunella do Morumbi Shopping. Era caseiro de uma chácara em São Lourenço da Serra quando lhe bateu a saudade da mulher e dos cinco filhos.
Ganhava R$ 250 e mandava R$ 200 para a família. Sobrevivia com R$ 50 porque os donos da chácara lhe davam casa e comida. Agora, está com casa, sem emprego e sem comida: "Aqui não tem nada, mas estou me aguentando".
Foi a sua segunda noite de piquete. Na primeira, nada conseguiu. Dessa vez, chegou depois que seus vizinhos drenaram o caminhão de milho. Não sabe para onde vai sua vida: "Tem de enfrentar o que vier. Não tem jeito. Temos de esperar pela vontade dele".
(ELIO GASPARI)



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