São Paulo, terça, 26 de maio de 1998

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CELSO PINTO
Quem são os "hedge funds"

Os fundos especulativos que resolveram apostar em uma desvalorização da moeda tailandesa, o baht, no primeiro semestre do ano passado, ganharam muito, muito dinheiro. Que risco eles correram?
O administrador de um fundo diz que, quando o governo tailandês decidiu defender o baht a qualquer custo, vendendo dólares no mercado futuro, o custo para alguém se financiar em baht para especular era de 3% ao ano. Como a hipótese de o baht sair da confusão se valorizando frente ao dólar era nula, isso significava que, qualquer desvalorização superior a 3% já pagaria o custo da especulação. Como a desvalorização chegou a 50%, o lucro foi fantástico.
Dos US$ 28 bilhões que o Banco da Tailândia tinha em vendas futuras de dólar em julho, quando houve a desvalorização, calcula-se que US$ 7 bilhões eram posições dos chamados "hedge funds", os mais especulativos, como o de George Soros. O mesmo Soros que ganhou US$ 1 bilhão apostando na desvalorização da libra esterlina contra o Banco da Inglaterra em 92.
Até que ponto, no entanto, fundos como o de Soros provocaram ou aceleraram a desvalorização na Tailândia e em outros países asiáticos? Para tentar responder a esta questão, o FMI fez um interessante trabalho ("Hedge Funds and Financial Market Dynamics") que é um dos mais completos sobre esses polêmicos fundos. A conclusão geral é que os "hedge funds" tiveram um papel menos relevante nas crises recentes do que reza sua fama.
Na crise monetária européia de 92, um único fundo, o de Soros, apostou US$ 10 bilhões na desvalorização da libra e ganhou muito dinheiro. Alguns "hedge funds" lideraram as apostas contra algumas moedas européias, mas o empurrão decisivo veio dos fundos mútuos, fundos de pensão, seguradoras e corporações não financeiras, que administravam US$ 11 trilhões.
Na crise dos bônus de 94, muitos "hedge funds" estavam na posição errada e perderam dinheiro. Na crise do México em 94, a corrida contra o peso foi liderada pelos investidores mexicanos.
Mesmo na crise asiática, os "hedge funds" não ganharam sempre. Eles ganharam na Tailândia, mas a grande corrida pelo dólar veio de empresas e bancos que tinham dívidas em dólares sem proteção, tomadas na suposição de que o câmbio jamais mudaria.
Os próprios "hedge funds", contudo, perderam dinheiro com a forte queda nas Bolsas asiáticas. No caso da Indonésia, grandes "hedge funds" apostaram, cedo demais, numa recuperação da moeda, a rupia, e perderam muito dinheiro.
O primeiro-ministro da Malásia, Mahathir Mohamed, acusou Soros e os "hedge funds" de terem provocado a queda da moeda. O estudo indica, contudo, que a pressão inicial veio de investidores institucionais. Poucos "hedge funds" tinham posições especulativas contra a moeda malaia, e alguns perderam dinheiro com a queda na Bolsa.
O termo "hedge fund" se aplica a vários tipos diferentes de fundos que têm, em comum, a maior liberdade de investir em diversos mercados, usando diferentes instrumentos (inclusive tomando emprestado para "alavancar" posições).
O termo nasceu do fundo criado por um jornalista financeiro, Alfred Winslow Jones, em 1949, que combinava operações simultâneas de compra e venda de ações, de forma a criar uma proteção ("hedge") contra oscilações de preços. Hoje, "hedge funds" se concentram também em apostas macroeconômicas (esperando variações em juros, moedas etc) ou apostas de variações de preços de ativos, setores ou movimentos de compra/venda de empresas.
Havia um único "hedge fund" administrando US$ 193 milhões em 1980. Em 90, eram 127 fundos administrando US$ 8,5 bilhões e, em 97, eram 1.115 num total de US$ 109,5 bilhões (ou US$ 89,8 bilhões, se excluídos os "fundos de fundos", que aplicam em outros fundos de "hedge"). É muito dinheiro, mas o trabalho lembra que é uma fração dos US$ 20 trilhões administrados pelos investidores institucionais.
O grosso do dinheiro (71%) está em "hedge funds" sediados em paraísos fiscais, e os 29% sediados nos EUA são fundos restritos, sujeitos a menos fiscalizações e regras.
Eles são mais ousados, tomam mais riscos e têm tido, em média, um retorno maior do que outros fundos. O estudo minimiza, contudo, sua força para derrubar moedas, ou forçar mudança de rumos econômicos em diferentes países.




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