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TESOURA POSTAL
Censor cortou
trecho de carta
para os EUA
da Reportagem Local
No dia 8 de novembro de 1944,
Fritz Eugen Wallerstein Äque
nasceu na Alemanha, mas morava
em São Paulo, onde trabalhava como administrador de imóveisÄ
escreveu para um amigo de infância, o sargento Fred W. Basch.
Embora de origem alemã, o militar integrava a força aérea americana e lutava contra o nazismo.
Foi numa base do Arizona que recebeu a carta em inglês Äsó que
incompleta.
Um documento que se acha no
arquivo do Itamaraty revela que o
Departamento dos Correios e Telégrafos reteve a correspondência
por dez dias e somente a enviou
depois de lhe amputar nove linhas.
Veja de que modo o censor descreveu o trecho cortado: "Em carta de caráter amistoso, o missivista
(...), referindo-se ao tratamento
dispensado a seus compatriotas,
diz que os mesmos são tratados
como inimigos estrangeiros, sem
que nenhuma diferença seja feita
entre eles e os nazistas".
Uma frase servia de título para a
descrição: "Queixas de indivíduo
suspeito, possivelmente israelita,
contra o tratamento dispensado a
seus compatriotas no Brasil".
Wallerstein, "o suspeito", está
hoje com 80 anos. Naturalizou-se
brasileiro, criou quatro filhos,
continua vivendo em São Paulo e
se lembra bem da carta.
Como tem raízes judaicas, saiu
da Alemanha ainda adolescente,
tão logo Hitller ascendeu. Depois
de passar pela Suíça, França e Espanha, desembarcou no Rio de Janeiro em dezembro de 1936.
"As autoridades alemãs me
consideravam judeu, mas eu mesmo nunca me senti membro da
comunidade israelita", afirma.
"Não frequento sinagogas e, pouco antes de partir para a América,
me batizei na Igreja Católica."
Ressalta, porém, que sempre se
posicionou contra o nazismo.
Assim que mandou a carta, recebeu uma intimação do Deops.
Queriam explicações sobre o que
escrevera. Aproveitaram para
também lhe perguntar se conhecia
os pichadores de uns versos que
vinham aparecendo nos muros da
cidade: "Ouça, valente voluntário
do Corpo Expedicionário: por que
vai morrer a esmo? Se a luta sangrenta e fria é pela democracia, a
travemos aqui mesmo".
"Sabia quem costumava fazer as
pichações", diz Wallerstein,
"mas claro que não os entreguei".
(AA)
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