São Paulo, sexta, 26 de junho de 1998

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CELSO PINTO
O peso do calote nos juros

A redução dos juros básicos de 21,75% ao ano para 21%, decidida quarta-feira, não vai reduzir em absolutamente nada o custo do crédito para o consumidor, concordam todos os que operam no ramo.
Se em vez da redução nos juros tivesse sido reduzida em 1% a taxa de inadimplência, ou seja, do calote, o custo do crédito pessoal ao consumidor poderia cair o equivalente a 16% ao ano, nos cálculos feitos por Dilson Del Cima, diretor do Banco BBM. O impacto, em termos relativos, seria muito maior.
Num exemplo hipotético de Dilson, de um crédito pessoal de R$ 600, prazo de seis meses, a taxa mensal seria de 11,5%, equivalente a 270% ao ano. Por quê?
Dos 11,5%, a parte dos juros básicos seria 1,8%, enquanto 5% viriam por conta da inadimplência que, neste tipo de crédito, anda ao redor de 15%. Os 4,7% restante seriam explicados pelos custos administrativos e pela margem de lucro. Quer dizer, o item mais importante no custo, de longe, é a inadimplência.
Usando o mesmo exemplo de crédito, se a inadimplência fosse de 10% e não de 15%, a taxa mensal poderia cair para 9,5%, ou 200% ao ano. Se subisse de 15% para 20%, os juros mensais saltariam para 13,7%, ou 365% ao ano.
E como reduzir a inadimplência? É evidente que a retração econômica e os altos juros depois da crise asiática pioraram a inadimplência, em uns 30% no cálculo de Dilson. No entanto, há mais o que fazer para reduzi-la.
Cláudio Coutinho Mendes, sócio do BBM, tem uma sugestão concreta: copiar a experiência chilena e implantar um cadastro nacional de consumidores.
Hoje, a defesa contra o calote é feita pelos Serviços de Proteção ao Crédito (SPC), a nível municipal. Consultado o SPC, sabe-se se o consumidor foi caloteiro, digamos, no Rio, mas não em Niterói. Basta mudar de cidade para limpar o cadastro.
A inadimplência acaba sendo muito alta. Ele calcula que esteja hoje em torno de 15% no caso do crédito pessoal, o mais arriscado, uns 14% no crediário para bens de consumo e de 3% a 4% no financiamento a automóveis, o mais seguro porque tem a garantia do bem. Não por acaso, o crédito pessoal custa de 12% a 13% ao mês, enquanto o financiamento de automóveis cai para uns 2,9% ao mês.
No Chile, com cadastro nacional, a inadimplência é baixíssima. No Banco de Santiago, diz Mendes, que tem 36% dos créditos no consumo e 40% para pequenas e médias empresas, a inadimplência é de 0,75%. No Banco de Credito y Inversiones, com 55% do crédito em consumo e 18% em pequenas e médias empresas, a inadimplência é 0,78%.
A simples existência de um sistema de controle nacional, já inibe o calote. O exemplo brasileiro é o cheque pré-datado. Quem não honrar o cheque, em qualquer lugar do país, entra na lista vermelha do Banco Central. Só consegue repetir a façanha se conseguir um outro CPF, ou seja, via fraude.
Por esta razão, Dilson calcula que, no financiamento ao consumo, o índice de calote de quem paga por carnê é quatro vezes maior do que quem paga com cheque pré-datado. No caso do crédito pessoal, o calote de quem não paga com cheque pré-datado é 2,5 vezes maior.
No Chile, o cadastro nacional é operado pela Superintendência de Bancos, a partir de um código pessoal por consumidor. No caso do Brasil, sugere Mendes, seria possível fazer algo parecido, usando o CPF como código pessoal. Existe fraude no uso de CPFs, mas o BC está fazendo um esforço para reduzi-la.
Dilson calcula que um cadastro nacional, de fácil acesso, poderia reduzir a inadimplência no crédito ao consumo para uns 5%. Neste caso, usando o exemplo anterior, num financiamento de crédito pessoal (o mais caro), por seis meses, o juro mensal poderia cair de 11,5% para 7,7% ao mês, o equivalente a cortar de 270% ao ano para 145%.
Em outros tipos de financiamento ao consumo, onde o juro hoje está entre 7% e 8% ao mês, (uns 140% ao ano), seria possível reduzir a taxa para uns 4% a 5% ao mês (uns 70% ao ano), calcula Dilson.
Para reduzir ainda mais, seria preciso baixar os juros básicos para níveis decentes e cortar os custos administrativos dos bancos. Sem reduzir a inadimplência, contudo, o impacto não será tão expressivo.




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