São Paulo, quinta-feira, 26 de julho de 2001

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RELIGIÃO

Apesar de não ser indicação de d. Eugenio, catarinense é afinado com linha conservadora da arquidiocese carioca

D. Eusébio é nomeado arcebispo do Rio

Ivone Marcarine/"Diário Catarinense"
D. Eusébio Oscar Scheid, que foi nomeado pelo Vaticano novo titular da Arquidiocese do Rio


MARCELO BERABA
DIRETOR DA SUCURSAL DO RIO

O teólogo conservador catarinense d. Eusébio Oscar Scheid, 68, arcebispo de Florianópolis, é o novo titular da Arquidiocese do Rio e substitui, a partir de setembro, d. Eugenio Sales, 80, o mais influente bispo brasileiro no Vaticano nos últimos 20 anos.
D. Eugenio esteve à frente da Arquidiocese do Rio durante 30 anos, desde 1971. O anúncio da substituição foi feito na manhã de ontem pelo papa João Paulo 2º e era aguardado desde o fim do ano passado, quando d. Eugenio informou que pedira ao papa para se aposentar.
D. Eusébio não foi indicação de d. Eugenio, que preferia seu bispo auxiliar, d. Karl Romer. Mas o novo arcebispo, que em breve também deverá ser nomeado cardeal, é bastante afinado com a linha conservadora da Arquidiocese do Rio. "Estamos de acordo em tudo que é essencial", disse ontem d. Eusébio para a Folha, referindo-se a d. Eugenio.
Com essa nomeação e a saída de cena de d. Eugenio chega ao fim um ciclo da Igreja Católica no Brasil fortemente marcado pelas disputas entre conservadores e progressistas e representado por dois cardeais de muita personalidade: o conservador d. Eugenio e o progressista d. Paulo Evaristo Arns, que dirigiu a Arquidiocese de São Paulo entre 1970 e 1998.
Nesse período, que corresponde ao pontificado de João Paulo 2º, iniciado em 1978, d. Eugenio foi membro, em períodos diferentes, de 12 congregações e comissões do Vaticano. Nesse mesmo período, foi o cardeal brasileiro que mais influiu nas nomeações de novos bispos.
Nos últimos 30 anos, a igreja brasileira ficou mais moderada e conservadora. Em 1970, entre 34 arcebispos, 11 eram progressistas (quase um terço); em 2000, entre 38 arcebispos, oito eram considerados progressistas.
D. Eusébio não tem a mesma influência de d. Eugenio. As grandes estrelas agora são dois novos cardeais: o conservador d. Cláudio Hummes, de São Paulo, e, principalmente, o moderado d. Geraldo Majella Agnelo, 67, de Salvador, que tem grande aceitação em todas as tendências do episcopado. Ambos refletem o momento de menor polarização pública da igreja.

Perfil
O novo arcebispo do Rio nasceu em Joaçaba, no meio-oeste de Santa Catarina, a 420 km da capital do Estado, e é descendente distante de uma família de alemães imigrados do Sarre, na região próxima da fronteira com a França, há 150 anos.
Eusébio define seus pais como pessoas simples, preocupadas em dar aos oito filhos -quatro homens e quatro mulheres- uma boa formação educacional. Ele e mais dois irmãos seguiram a carreira religiosa ao ingressar no seminário menor da Congregação dos Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus, em Corupá, cidade próxima a Jaraguá do Sul, em Santa Catarina. De lá, o jovem Eusébio foi para Brusque estudar filosofia, mas ficou pouco tempo porque foi enviado por sua ordem religiosa para Roma, onde estudou filosofia e teologia por nove anos e onde teve a chance de acompanhar de perto as duas primeiras sessões do Concílio Vaticano 2º, que revolucionaria a ação pastoral da Igreja Católica.
Doutorado em teologia, com tese em cristologia, ele retornou ao Brasil em 1964 e foi enviado para a Arquidiocese de Olinda e Recife, para onde acabava de ser transferido d. Hélder Câmara (1909-1999). O padre Eusébio ficou três anos em Recife e diz que se identificou muito com o povo nordestino. Dessa época, diz se lembrar com saudade do trabalho pastoral que fazia em Limoeiro (a 73 km do Recife).
Em 1967, com 33 anos, foi enviado para Taubaté, no vale do Paraíba, a meio caminho entre São Paulo e Rio. Lá viveu 15 anos combinando o trabalho intelectual de professor do Instituto Teológico Sagrado Coração de Jesus, por ele fundado, e da PUC de São Paulo, com a experiência prática das pastorais na periferia da cidade.
Scheid era diretor do Instituto Teológico em 1981, quando foi ordenado bispo e nomeado pelo papa João Paulo 2º para dirigir a nova Diocese de São José dos Campos, desmembrada de Taubaté e de Mogi das Cruzes.
Ele tem boas lembranças do período em que passou no vale do Paraíba. "Dei-me muito bem por lá. Era um período difícil, fechado, de ditadura militar. O vale tinha um pouco de tudo, indústrias, operários, meio rural, tradições mineiras. Tenho saudades." Ele ficou em São José até março de 1991, quando foi promovido a arcebispo de Florianópolis.
Na capital de Santa Catarina, ele deu uma atenção especial à intelectualidade e aos turistas. A região metropolitana tem seis universidades. Para atender a grande presença de turistas, principalmente argentinos e uruguaios, ele criou uma pastoral e abriu duas paróquias nas praias.
Na sua opinião, o florianopolitano se parece um pouco com o carioca: "São povos muito receptivos". D. Eusébio troca uma arquidiocese em cujos limites vivem pouco mais de 1 milhão de pessoas, pelo Rio, habitado por cerca de 5,5 milhões. Troca uma cidade pacata, que lidera os rankings de qualidade de vida e de indicadores sociais, por uma metrópole densamente povoada, com índices altíssimos de violência e de exclusão social.


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