São Paulo, domingo, 26 de novembro de 2000

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QUESTÃO INDÍGENA
Iauanauás conseguem reverter processo de migração de seu povo, exportando corante para empresa dos EUA
Urucum transforma vida de comunidade

NOELI MENEZES
DA REDAÇÃO

SILVIA DE MOURA
DA AGÊNCIA FOLHA

A produção de urucum para exportação transformou a vida dos índios iauanauás, que vivem às margens do rio Gregório, em Tarauacá (490 km de Rio Branco).
Com a venda da semente para a empresa norte-americana de cosméticos Aveda, a comunidade iauanauá conseguiu reverter o processo de migração da população indígena. Os mais jovens saíam em busca de trabalho e melhores condições de vida. Hoje, a aldeia tem uma infra-estrutura similar à de uma cidade.
"Hoje, temos uma infra-estrutura que vai desde o pessoal preparado na área de educação, saúde e administração até sistema rural de eletricidade que funciona com a energia solar, posto médico e maquinário de beneficiamento de sementes", afirma Joaquim Tashka Yawanawá, representante internacional da comunidade.
No início dos anos 90, com o acirramento da crise do preço da borracha, os iauanauás, que sobreviviam da exploração da seringa, enfrentaram dificuldades financeiras, conta Tashka.
Em 93, os índios criaram a Oaeyrg (Organização de Agricultores Extrativistas Yawanawá do Rio Gregório) para buscar parceria com a iniciativa privada.
"A partir da parceria com a Aveda, nosso povo foi encontrando novos horizontes em busca de uma autonomia econômica, sem sair da floresta. É uma forma de preservarmos nossos costumes, tradições e língua", diz Tashka.
O antropólogo Mauro Leonel afirma que os projetos da iniciativa privada com comunidades indígenas são mais viáveis que os do governo porque oferecem garantia de mercado para os produtos. De acordo com Ednaldo dos Santos, da Funai em Rio Branco, o projeto foi todo desenvolvido pela própria comunidade indígena. "Eles criaram a associação deles e buscaram recursos. A Funai não interveio em nada. Nem para ajudar nem para coibir."
Segundo o presidente da Oaeyrg, Raimundo Sales Luiz Yawanawá, 38, o quilo do urucum produzido pelos iauanauás é comprado pela Aveda a R$ 2,40 -preço acima do mercado nacional, que paga R$ 1,80 pelo quilo da semente da planta. Os índios colhem cerca de cinco toneladas de urucum em cada uma das duas safras anuais.

Inversão
Segundo a Funai (Fundação Nacional do Índio), em 1995, dois anos após a implantação do projeto, havia cerca de 230 índios vivendo na aldeia. Atualmente, há cerca de 500 iauanauás lá.
Quando o fundador da Aveda, Horst Rechelbacher, encontrou-se com os líderes iauanauás para discutir a parceria, sugeriu que o urucum fosse colhido na floresta. Mas os índios apresentaram a proposta de separar uma área para o cultivo da planta.
A empresa financiou o plantio de urucum em 16 hectares da reserva, associado a outras plantas tropicais da Amazônia, como castanheira, pupunheira e guaraná. Os índios já fazem o plantio com recursos próprios.
A Aveda utiliza o corante do urucum na produção de batons, xampus e condicionadores.

Tradição
A preservação das tradições indígenas foi um dos pontos do contrato firmado entre os iauanauás e a Aveda. "A empresa tem respeitado nossos limites e nossa forma tradicional de trabalhar", afirma Sales. (leia ao lado)
Para Tashka, não existe no Brasil um política que trate especificamente da questão indígena no que diz respeito a seu território tradicional, a educação diferenciada e a saúde. "A única saída da comunidade foi buscar formas de ser auto-sustentável economicamente para manter sua tradição."
A aldeia possui uma escola de 1ª a 4ª séries que ensina, além da língua portuguesa, a língua iauanauá. "Neste mundo de globalização, nós temos de preservar nossos costumes. É um meio de sobreviver. A nossa escola tem de trabalhar em torno disso", diz Biraci Brasil Yawanawá.


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