São Paulo, domingo, 26 de novembro de 2006

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Brasil voltou a ser importante para o Vaticano, diz padre

José Oscar Beozzo afirma que nomeação de d. Cláudio mostra que Santa Sé resolveu normalizar relação com a igreja do país

Segundo especialista, Bento 16 difere de João Paulo 2º porque resolveu que o país deveria voltar a "jogar o jogo" da Santa Sé

DA REPORTAGEM LOCAL

O padre José Oscar Beozzo é coordenador do Cesep (Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular) e membro do Cehila (Centro de Estudos de História da Igreja na América Latina). Autor de "A Igreja do Brasil", ele diz que o papado de Bento 16 surpreende porque recolocou o Brasil no "jogo" do Vaticano. (LB)  

FOLHA - O que significa a ida de d. Cláudio para o "ministério" do papa?
JOSÉ OSCAR BEOZZO
- A partir dos anos 70, mudou a política da igreja em relação ao Brasil. Saiu o apoio e veio a contenção. As nomeações, os cargos importantes em Roma, a presidência do Celam (Conselho Episcopal Latino-Americano) se deslocaram para as três igrejas nas quais o Vaticano se apoiou, inclusive para frear o Brasil: Argentina, Colômbia e México. O Brasil foi colocado a escanteio. Hoje, dois elementos mostram uma mudança de rumo. Um, ter trazido a 5ª Conferência Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe para o Brasil. O Brasil não pleiteou trazer a conferência para cá, não tinha força. Foi o próprio papa que disse que colocava a conferência no Brasil, em um gesto de dizer que o Brasil volta a ser "player", chamado a desempenhar papel mais estreito. O segundo fator, que mostra com clareza esse processo de reaproximação, é a nomeação de d. Cláudio para um cargo importante na Santa Sé.

FOLHA - Mas por que o arcebispo de SP e não outro cardeal?
BEOZZO
- D. Cláudio se tornou uma figura próxima da Santa Sé pelo trabalho que ele tinha na CNBB quando se começou a montar o Congresso Mundial da Família [no Rio, em 1997, quando João Paulo 2º veio ao país]. Ele trabalhou muito estreitamente com o grupo então hegemônico no Vaticano. Acho que isso pesou. Ele se tornou confiável. Quando foi nomeado para SP, talvez imaginassem que ele fosse mudar muito o rumo que d. Paulo Evaristo Arns imprimiu, o que não aconteceu. D. Cláudio se preocupa muito com a questão do trabalho, é um bispo de pastoral, tem preocupação com as pessoas. Foi diferente de d. Paulo no sentido da organização da igreja e com a preocupação de mapear o que a igreja estava fazendo na cidade. Resumindo, d. Paulo era como um regente de orquestra. D. Cláudio é a orquestra. d. Paulo descentralizou. D. Cláudio centralizou, inclusive na relação com os bispos auxiliares, que com d. Paulo eram praticamente bispos ordinários das regiões, com responsabilidades no conjunto da Arquidiocese.

FOLHA - Bento 16 surpreendeu?
BEOZZO
- Sim. Ele decidiu normalizar as relações com o Brasil. O papa tem confiança em d. Cláudio, vai ser uma ponte entre o Brasil e o Vaticano, entre os diferentes setores da igreja. Com isso, o papa restabeleceu os laços institucionais, a CNBB voltou a ser chamada para ter relações com o Vaticano. Bento 16 busca um dialogo com as igrejas, reconhecendo a importância das igrejas dos países, não é continuidade.

FOLHA - D. Cláudio diz que equilibrou as relações dentro da igreja de São Paulo. Como ele é no dia-a-dia?
BEOZZO
- É uma pessoa com quem os progressistas conseguem conversar. É uma pessoa que você pode procurar, falar. Quando não concorda, ele vai te dizer. Mas não exclui. Deu espaço para todos.

FOLHA - A igreja do Brasil se "enquadrou" aos moldes do Vaticano?
BEOZZO
- Enquadrar não é a palavra. O episcopado de hoje não é o de 30 anos atrás. Foi uma relação de 30 anos de tentativas. João Paulo 2º nomeou 300 bispos no Brasil, substituiu o episcopado. Trocou e imprimiu a linha que hoje vigora.


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