São Paulo, domingo, 26 de novembro de 2006

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ELIO GASPARI

Mãos ao alto! Este é um chip RFID


Uma cidade poderá instituir o pedágio-engarrafamento. Quem circular na hora de pico tomará uma mordida

A DECISÃO do Conselho Nacional de Trânsito de obrigar os 43 milhões de veículos que trafegam em Pindorama a carregar um chip é uma tunga autoritária. Ela permitirá aos transportecas rastrear os movimentos dos cidadãos. Jabuticaba eletrônica, destina-se a patrocinar a proliferação dos pedágios.
Por exemplo: uma cidade poderá instituir um pedágio-engarrafamento. Quem circular nos horários de pico pagará por isso, como se alguém entrasse em avenida congestionada por prazer. (Parece fantasia, mas não é.)
Estimando-se que cada chip valha R$ 20, só esse pedaço da operação custará perto de R$ 1 bilhão. No barato, os equipamentos adicionais sairão por mais R$ 2 bilhões. Dizem os çábios que a medida não custará nada a quem tem carro. Custará a quem? Aos que não os têm? Ainda não faz um mês que Milton Friedman morreu e já inventaram o chip grátis.
A iniciativa atende à voracidade arrecadadora do condomínio tucano-pefelê de São Paulo, que planeja implantar o sistema até 2008. O prefeito Gilberto Kassab e os transportecas tucanos são craques. Cobram caro a quem tem pouco e armam um avanço sobre o bolso dos demais. Kassab corre atrás de uma tecnologia que em Nova York é usada para o baratear as tarifas. (Um mês de uso do bilhete único integrado de São Paulo custará US$ 100. O da miserável NY sai por US$ 76.)
Os chips, também conhecidos como RFID (Radio Frequency Identifier, ou Identificador de Rádio Freqüência), permitem o rastreamento de pacientes em hospitais, de cargas em estradas, bem como a leitura de cartões de crédito ou de passaportes. Instalados pela vontade do freguês, existem em diversas cidades americanas, sempre embutidos em cartões de pedágio. Escondidos, renderam boicotes contra a Gillette e as lojas Benetton.
Dizer que o chip permitirá o rastreamento de carros roubados é um insulto à inteligência das vítimas e dos ladrões. Eles retiram o selinho que ficará no pára-brisa e ganham tempo. Correm o risco de serem multados em R$ 127.

O REPÓRTER QUE FIDEL CASTRO DESTRUIU

Está chegando às livrarias "O Homem que Inventou Fidel", do jornalista Anthony De Palma. Conta três histórias: a vida do Comandante, a criação de seu mito e a decadência do repórter que se julgou dono ou, pelo menos, parceiro do urso. O doutor chamava-se Herbert Matthews e morreu amargurado, no interior da Austrália, em 1977. Ele criou o Fidel-Robin Hood em 1957, ao entrevistá-lo na mata da Sierra Maestra. Meses antes, a agência UPI noticiara que o guerrilheiro estava morto.
A sensacional entrevista com o barbudo dominou a primeira página de uma edição dominical do "The New York Times". Até hoje há quem acredite que Castro é aquele garotão sonhador e libertário. De Palma mostra como Fidel manipulou Matthews e o tamanho de sua ruindade depois de se tornar Senhor da Ilha. O Comandante vangloriava-se publicamente de ter iludido o gringo, fazendo com que seus soldados andassem em círculo pelo mato, fingindo que eram muitos. Mentira. De Palma foi ao lugar da entrevista e constatou que ela aconteceu numa crista, sobre um riacho. O truque era topograficamente impossível.
Matthews morreu sustentando que Fidel tornou-se comunista por causa do governo americano. Quem quiser um passeio pelos meandros das cavilações de jornalistas estará bem servido. Verá um Matthews bem menor. Convidou a dona do jornal para madrinha de seu filho, tinha um pé na Redação e outro na seção de editoriais, viajava com a patroa (tudo pago) e detonava colegas que supunha rivais. Adorou o papel de dono do urso barbudo e foi comido pelo mito que criou.

ECOPARÁ
A caneta do governador Simão Jatene, do Pará, está cheia de tinta. É possível que, antes de deixar o governo, crie o maior conjunto de áreas de conservação do planeta. Seriam 16 unidades, num total de cinco milhões de hectares, área maior que Portugal, Dinamarca e Bélgica juntos.

EREMILDO NA VALE
Eremildo é um idiota e foi mandado embora de todas as empresas onde parou de trabalhar. Soube que o ex-senador José Eduardo Dutra é funcionário licenciado da Companhia Vale do Rio Doce e ficou com uma inveja danada. O doutor não dá expediente na Vale há uns dez anos. Bom petista, condenava a privatização da empresa e chegou a defender a formação de uma CPI para investigar o assunto. O idiota não sabe como definir Dutra. Ele pode ser um estatista em recesso ou um privatista licenciado. Tendo ocupado por três anos a presidência da Petrobra$, o senador Dutra foi candidato à reeleição. Recebeu R$ 300 mil da Vale (pelo Caixa Um de outra firma). Quando lhe perguntaram se via algo de estranho no mimo, respondeu: "Eu prefiro que você pergunte ao doutor Roger Agnelli por que contribuiu". Bingo. Dutra não sabe por que recebeu, mas Agnelli deve saber por que deu. O idiota quer aprender como ambos construíram tão bem remunerada harmonia.

AVISO AMIGO
Lula deve tomar cuidado com a eleição das Mesas da Câmara e do Senado. Parreira também chegou à Alemanha como favorito. Sabendo-se que Nosso Guia é especialista em perder esse tipo de disputas, vale o alerta.

GÊNIOS DO PAN
Onde havia cheiro de queimado, há labaredas. Faltam 249 dias para o início dos jogos Pan-Americanos e estão paradas todas as licitações para a segurança do evento. Foram fechadas até mesmo aquelas que haviam sido abertas. O conjunto da obra envolve R$ 400 milhões. Se as licitações foram anunciadas amanhã, os contratos só serão assinados em março.
Sobrarão 140 dias para encomendar os equipamentos, instalá-los e treinar o pessoal encarregado do serviço. Em Atenas, Sidney e Atlanta, um ano antes dos jogos já havia providências tomadas. Arrisca-se cair numa compra de emergência, que dispensa licitações e faz a alegria do Ministério Público.
A data de abertura do Pan é conhecida desde 2002.

PORTOS PRIVADOS
A Câmara e a Receita Federal privatizaram a fiscalização aduaneira e sanitária das importações. O desmanche foi conseguido com duas medidas que mudaram a regulamentação dos portos secos. Esse mecanismo permitia a criação de mini-aduanas. Um contêiner com importações descia numa cidade, era lacrado pela Receita e ia até a área do porto seco, obtido por licitação. Lá, submetia-se à fiscalização dos auditores da Viúva e seguia em frente.
Agora as coisas ficarão assim: os portos secos serão concedidos pela Receita Federal, sem licitação. Poderão ser abertos em cerca de 600 municípios. Em geral, a fiscalização ficará por conta do concessionário e nada impede que um importador ganhe um porto. Seja o que Deus quiser.


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