São Paulo, sábado, 27 de agosto de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ DEPÓSITOS SUSPEITOS

Saques coincidentes indicam que partido pode ter usado recursos próprios para saldar dívida de R$ 29 mil atribuída ao presidente Lula

PT recebeu R$ 3 milhões em espécie em 2004

FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O extrato bancário da principal conta do PT nacional tem registros de depósitos em dinheiro que totalizam R$ 3,28 milhões em apenas cinco meses e meio. São, ao todo, 23 depósitos, todos em valores redondos, variando de R$ 20 mil a R$ 300 mil.
O período abrangido pelo extrato bancário vai de 15 de dezembro de 2003 a 31 de maio de 2004. Nessa época, estava em pleno vigor a relação entre o PT e o empresário Marcos Valério de Souza, apontado como um dos provedores de dinheiro de caixa dois para a sigla.
Nesses extratos em poder da CPI dos Correios, em apenas dois casos há a identificação de quem teria realizado a operação de depósito em dinheiro. Em 29 de dezembro de 2003, uma pessoa chamada Carlos Alberto Timóteo aparece como "portador". Em 6 de janeiro de 2004 há outro depósito de R$ 300 mil, tendo como portador Alex Vieira Costa.
A Folha localizou ontem Timóteo, que disse ser funcionário do PT, mas não confirmou os depósitos. Costa não foi encontrado pela reportagem.
A conta desses extratos é a de número 13.000, no Banco do Brasil, agência 3.344. Trata-se da conta bancária onde o PT movimenta o seu fundo partidário -os recursos oficiais a que todos os partidos têm direito, de acordo com seu desempenho eleitoral.
A Folha apresentou ontem à tarde os dados ao escritório nacional do PT. O partido alegou no início da noite que não havia sido possível checar com precisão a que se referiam os depósitos em dinheiro. A sigla também não soube explicar quem seriam os dois depositantes identificados.
Além das duas operações identificadas, há outras 21 para as quais não há descrição no extrato dos responsáveis pelos depósitos. É possível que esse dinheiro seja resultado de doações legais recebidas pelo partido. Ainda assim, chama a atenção que sejam sempre números redondos.

Empréstimo de Lula
Esses extratos bancários estão sendo analisados porque a CPI dos Correios buscava uma explicação mais detalhada sobre a dívida de R$ 29.436,26 do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o PT. Esse débito foi saldado de maneira parcelada, de dezembro de 2003 a março de 2004 -daí a razão de os documentos se referirem a esse período. A análise preliminar da CPI indica uma possível operação de reutilização de recursos do PT para saldar a dívida.
Nos dias anteriores aos pagamentos efetuados para quitar a dívida de Lula há também saques realizados em valores semelhantes. Por exemplo, nos dias 24 e 29 de dezembro de 2003, alguém cujo nome não aparece nos documentos sacou duas vezes o valor de R$ 7.000. Total: R$ 14 mil.
No dia 30 de dezembro de 2003, foram feitos dois depósitos on-line. O primeiro, no valor de R$ 12 mil para quitar dívida de Luiz Inácio Lula da Silva. O segundo, de R$ 2.000 para pagar débito atribuído ao senador Aloizio Mercadante (PT-SP). O valor total das operações é de R$ 14 mil.
O senador petista já declarou ter como comprovar o saque de sua conta pessoal para entregar ao PT e quitar a pendência financeira.
Em 28 de janeiro de 2004, aparece um saque no valor de R$ 7.000 da conta do PT -sem identificação. No dia seguinte alguém faz um depósito on-line, também sem identificação, no valor de R$ 6.000 para quitar outra parcela da dívida de Lula. O valor sacado ficou R$ 1.000 acima do depositado. Essa "sobra" pode estar explicada no pagamento seguinte. Em 26 de fevereiro de 2004 ocorre um saque de R$ 5.000. No dia seguinte, alguém realiza um depósito on-line de R$ 6.000 e salda a terceira parcela da dívida de Lula.
Só o pagamento da última parcela do débito presidencial, de R$ 5.436,26, em 30 de março de 2004, não foi precedido de saques em dinheiro na conta do PT.
A Folha procurou o PT ontem, mas o partido disse que não teria como dar uma resposta até o fechamento desta edição. O Palácio do Planalto alega que Lula recebeu, antes de assumir o governo, adiantamento de verbas do PT para uma viagem ao exterior. Por problemas não conhecidos, o valor acabou sendo lançado como débito na contabilidade da sigla.


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