São Paulo, sábado, 27 de agosto de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ CONTAS DO PLANALTO

Casa Civil instaurou sindicância interna para investigar denúncia sobre utilização irregular de cartões de crédito corporativos

Notas de gastos da Presidência podem ser frias

MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Presidência da República determinou ontem à noite a instauração de sindicância interna para apurar a existência de notas frias na prestação de contas de saques em dinheiro por meio de cartões corporativos do Planalto. Os cartões são objeto de uma auditoria no Tribunal de Contas da União.
Pelo menos quatro vezes no período entre fevereiro e agosto do ano passado, a Presidência da República recorreu a uma pequena empresa instalada a cerca de 45 quilômetros do Palácio do Planalto - e cuja nota fiscal registra apenas o endereço de um apartamento, além de um número de telefone celular-, para suprir uma falta imprevista de cartuchos para impressoras do Planalto.
Quatro notas fiscais da empresa FR Comércio Serviço e Representação Ltda. em poder do TCU (Tribunal de Contas da União) foram reunidas nas prestações de contas da Presidência da República e justificam parte dos saques em dinheiro com cartões corporativos do Planalto. As quatro notas somam cerca de R$ 3 mil.
O perfil da empresa chamou a atenção da equipe de técnicos do gabinete do senador Álvaro Dias (PSDB-PR), que suspeita que as notas sejam frias.
O registro da empresa na Receita Federal informa que ela comercializa alimentos. Francisco Pereira Ramalho, dono da FR, no entanto, diz que vende de tudo: "roupa, móveis para escritório, material de limpeza, material de informática", além de alimentos.
Ramalho não se lembra do negócio com o Planalto: "Foi um vendedor meu que vendeu, e ele nem trabalha mais na empresa", disse à Folha, sobre a venda de cartuchos à Presidência. "A senhora está fazendo muitas perguntas", disse o empresário.
Em outro telefonema, duas horas mais tarde, Francisco Ramalho reiterou que não se lembrava da venda. "É possível que tenha vendido, isso não tem problema nenhum; se a nota está aí, com certeza foram vendidos [os cartuchos]", disse. "Minha empresa não tem prática de emitir nota e não fornecer", insistiu.
Em contato com assessores do gabinete do senador Álvaro Dias, Ramalho teria dito que não vendeu os cartuchos, apenas forneceu a nota fiscal a uma pessoa chamada Edilson.
Questionada, a Casa Civil reagiu no início da noite com uma nota, em que anuncia a abertura de sindicância interna para apurar a possibilidade de que notas fiscais frias tenham comprovado despesas com cartões.
"A Casa Civil da Presidência reafirma sua convicção de que os pagamentos por meio dos cartões de pagamento do governo federal possibilitam maior transparência e controle do gasto dos recursos públicos", afirma em nota.
As notas fiscais aparecem entre as comprovações de gastos de uma das portadoras de cartão corporativo do Planalto, de nome Maria da Penha Pires. Ela sacou em dinheiro vivo, no ano passado, R$ 74 mil. Em março, mês do pagamento dos cartuchos, sacou R$ 10.650, segundo o Siafi (sistema informatizado de acompanhamento de gastos federais).
Responsáveis por mais de R$ 20 milhões em gastos desde a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os cartões corporativos são objeto de auditoria do TCU, ainda não iniciada.
Em auditoria anterior, o tribunal considerou o uso dos cartões para saques em dinheiro um mecanismo pouco transparente de gasto. Essa auditoria concluída no final do ano passado não se deteve nas notas fiscais, entre as quais aparecem as supostas notas frias.


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