São Paulo, segunda, 27 de outubro de 1997.




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DINHEIRO PÚBLICO 1
Banco deve desembolsar R$ 15 bi até dezembro; Estados e estatais estão entre os principais favorecidos
BNDES aumenta empréstimos em 40%

MARCIO AITH
da Reportagem Local

CÉLIA DE GOUVÊA FRANCO
enviada especial ao Rio

O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) chegará ao final de dezembro tendo desembolsado entre R$ 14 bilhões e R$ 15 bilhões, com um crescimento superior a 40% em relação a 1996.
Com isso, o BNDES vai empatar com o Banco Mundial, que em 97 liberou créditos no valor de US$ 13,9 bilhões (o equivalente a cerca de R$ 15 bilhões).
No Brasil, nenhum ministério, nem os que contam com orçamento mais generoso, gerencia com autonomia uma massa de recursos tão formidável quanto o BNDES.
Os ministérios da Saúde e da Previdência dispõem de mais dinheiro do que o banco, só que não têm autonomia para aplicar os recursos de que dispõem.
A maior parte do dinheiro controlado pelos ministros já entra nos caixas dos ministérios com uma destinação obrigatória.
Essas restrições e a escassez de recursos explicam por que a ação direta do governo federal encolheu muito em uma série de setores.
O BNDES, em contrapartida, começou a ocupar os espaços deixados vazios: diversificou as áreas de atuação, passou a emprestar muito para o setor de serviços, para Estados e municípios e estuda como financiar investimentos no setor agrícola. Além disso, iniciou uma série de projetos sociais e de desenvolvimento regional.
Entre os maiores clientes estão os Estados e empresas estatais. De um total de cerca de R$ 12 bilhões de empréstimos autorizados pelo banco diretamente ao tomador final, entre o início de 1996 e setembro último, R$ 2,65 bilhões foram para Estados, para ajuste fiscal.
"O banco está ganhando muito dinheiro e não depende de orçamento", explica Luiz Carlos Mendonça de Barros. O propósito do banco hoje é procurar atender todos os pedidos de empréstimo -baseados em "projetos viáveis"- que recebe.
Para isso, foi buscar novas fontes de recursos. Acelerou, por exemplo, a venda de ações da carteira do BNDESpar (o setor do banco que compra participações em empresas). Tradicionalmente, a desmobilização do BNDESpar ficava entre R$ 200 milhões e R$ 300 milhões ao ano; neste ano, a venda de ações chegou a quase R$ 4 bilhões.
O banco também passou a emitir bônus (uma espécie de título) no exterior em volumes muito maiores do que anteriormente. Em 1993, por exemplo, o BNDES captou US$ 150 milhões em bônus; este ano, foram US$ 905 milhões.
Apesar das mudanças dos últimos anos, com a diversificação das aplicações, a lista dos tomadores de empréstimos diretos do BNDES mostra que ainda são os grandes grupos, principalmente indústrias, os que mais recebem recursos do banco. O governo também é um dos seus grandes clientes.
As estrangeiras também passaram a receber dinheiro em volumes expressivos, inclusive as que venceram leilões de privatização.
"O BNDES está com recursos. No ano passado, o banco ficou com R$ 1 bilhão no caixa", justifica Mendonça de Barros.
Essa política é criticada por alguns empresários. Para Roberto Nicolau Jeha, diretor da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), as empresas estrangeiras que decidiram investir no Brasil "deveriam estar nos financiando, e não o contrário".
Segundo Jeha, que citou os setores automobilístico e de telecomunicações, a prática adotada por quase todos os governos é a de financiar empresas de seus países quando elas participam de projetos no exterior.
"Não consigo entender a lógica do BNDES ao dar crédito para empresas estrangeiras. Esses grupos têm condições de conseguir financiamento nos seus países", concorda Eduardo Capobianco, primeiro coordenador-geral do PNBE (Pensamento Nacional das Bases Empresariais).
Apesar da crítica, Jeha reconhece que não há registro de grande empresa brasileira para a qual o BNDES tenha negado crédito.
O problema ocorre com as pequenas e médias empresas. Os bancos privados, agentes do BNDES nos Estados que negociam com as pequenas empresas, não têm interesse em emprestar a taxas reduzidas. Preferem financiar com seus próprios recursos e taxas, que são muito maiores.
Uma das "imperfeições" do BNDES, como diz Mendonça de Barros, é mesmo o atendimento às pequenas e médias empresas. Para tentar minorar o problema, está estudando um fundo de aval -um sistema pelo qual o BNDES daria garantia de até 70% do repasse de recursos para uma pequena empresa via banco privado.
Uma das áreas onde a participação do banco ainda é modesta, ao menos em valores, é a social, mas esse quadro tende a mudar com o início de uma série de projetos, diz Paulo Hartung, diretor do banco.
Na carteira de projetos sociais, constam desde financiamento para a compra de equipamentos em 47 hospitais universitários e 52 entidades de ensino, por meio de licitação que o Ministério da Educação está abrindo, até antecipações para a construção de 52 presídios.
Programas em parceria com ONGs (organizações não-governamentais) também começam a ser implementados. "Na área social, não basta oferecer crédito e criar projetos. É preciso buscar alternativas criativas para que os recursos cheguem ao seu destino", diz Beatriz Azeredo, superintendente da área de desenvolvimento regional e social do banco.



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