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Lula exige manutenção da ortodoxia
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O presidente Luiz Inácio Lula da
Silva demitiu ontem o ministro da
Fazenda, Antonio Palocci Filho, e
escolheu o presidente do BNDES
(Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), Guido Mantega, para substituí-lo.
Sondado na semana passada
pelo presidente, que pediu segredo, Mantega recebeu determinação de Lula para manter o rigor
fiscal e monetário do antecessor e
afastar eventuais temores do mercado financeiro de alterações desse rumo. Na prática, Lula virará o
fiador direto da política econômica, papel desempenhado por Palocci desde a campanha de 2002.
O ministro caiu porque tentou,
até anteontem, quando se reuniu
com Lula, sustentar perante o
presidente que não tinha tido nenhuma participação no episódio.
Admitiu apenas que um assessor
do ministério pudesse ter vazado
o sigilo para a imprensa. O nome
dele, como a Folha revelou na semana passada, é Marcelo Netto.
O presidente, porém, já tinha a
informação de que o ministro recebera do então presidente da
Caixa Econômica Federal, Jorge
Mattoso, os dados sigilosos. Disse, então, que não era mais possível que continuasse e acertou a
saída para o dia seguinte.
Lula se disse contrariado com
Palocci, segundo relato de auxiliares que estiveram com ele ontem
à tarde. De tarde, Mattoso confirmou à PF que entregara os dados
em mãos a Palocci.
Na manhã de ontem, em reunião no Planalto enquanto Lula
estava em Curitiba, Palocci ainda
fez uma última pressão sobre o
presidente da Caixa. Queria que
Mattoso o isentasse do crime, mas
ele se recusou. Disse que contaria
a verdade em depoimento à PF.
Palocci, então, enviou carta a
Lula pedindo afastamento do cargo. O presidente, informado do
que dissera Mattoso na PF, disse
que a solução seria a demissão. A
carta de afastamento foi divulgada após o fechamento do mercado financeiro. Uma nova carta, na
qual o ministro explicaria as razões para ter enviado a primeira,
ainda não havia chegado ao gabinete de Lula até as 19h de ontem.
O presidente, então, pediu que o
líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), anunciasse a saída do ministro.
Lula pediu a Mantega que fosse
do Rio a Brasília. Chegou a dizer
que deveria ser mandado um
avião do governo caso Mantega
tivesse dificuldade.
Antigo assessor de Lula, Mantega foi escolhido pela intimidade
com o presidente. Mercadante tinha preferência de parte da cúpula do governo e do PT, mas Lula
avaliou que enfrenta guerra pesada no Senado (CPI dos Bingos) e
que seria conveniente a permanência do líder do governo na Casa. O presidente também achou
que Mercadante foi ansioso demais ao declarar que se considerava "pronto" para assumir.
Segundo expressão ouvida pela
Folha no Planalto, "Lula será o
ministro da Fazenda" a partir de
agora. Ou seja, auxiliar antigo e
que respeita muito o presidente,
Mantega seguirá a determinação
para manter a política econômica.
Pesou contra Mercadante a avaliação de que o PT terá complicações para lançar a ex-prefeita de
São Paulo Marta Suplicy ao governo paulista. Ela indicou Mattoso e
Ricardo Schumman, assessor especial do presidente da Caixa, para os cargos. Os dois foram os responsáveis pela violação.
O caseiro disse que Palocci freqüentou casa alugada em Brasília
por ex-auxiliares para fazer lobby
e dar festas com garotas de programa. Palocci disse à CPI dos
Bingos que nunca foi à casa.
Na opinião de Lula e de seus
principais auxiliares, ele estaria
sendo visto como um presidente
que protege um ministro contra
um cidadão de origem humilde à
custa de abusos das instituições
do Estado. Essa imagem foi considerada mortal do ponto de vista
eleitoral por auxiliares de Lula.
"Estado de direito"
Falando ontem em nome do
Planalto, Mercadante disse que
tanto Mattoso quanto Palocci não
respeitaram o "Estado de Direito"
no caso da violação. Segundo o
senador, ambos reconheceram a
"gravidade do erro" ao pedirem
demissão de seus cargos.
"O Estado de Direito e os direitos da cidadania estão acima da
circunstâncias e dos indivíduos. E
na medida que o Estado de Direito não foi respeitado nesse episódio do sigilo bancário, o presidente imediatamente muda a sua
equipe, com o afastamento do
presidente da Caixa Econômica
Federal e do ministro da Fazenda
e com a nomeação do novo ministro da Fazenda Guido Mantega", declarou.
A seguir, Mercadante disse que
Palocci e Mattoso tiveram a
"grandeza" de pedir demissão.
"Os que estavam envolvidos nesse episódio tiveram a grandeza
também de reconhecer a gravidade do erro e pedir o afastamento."
O senador, em entrevista no
Planalto, comentou a situação de
Palocci. "O ministro, ao encaminhar o seu pedido de demissão,
demonstra espírito público e reconhecimento pelo erro que foi
cometido. [...] O afastamento dos
responsáveis é o reconhecimento
do erro", afirmou.
Mercadante disse que Lula saberá atravessar as dificuldades.
"O presidente é um homem muito vivido, experimentado e sabe
atravessar as dificuldades."
Colaboraram FERNANDO RODRIGUES, PEDRO DIAS LEITE e EDUARDO SCOLESE
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