São Paulo, Sexta-feira, 28 de Maio de 1999
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CELSO PINTO
Quanto pode subir o dólar?

O nervosismo no mercado diminuiu, mas deixou dúvidas. Se houver mais turbulência externa e a captação ficar mais cara e difícil, como nas últimas semanas, até onde pode subir o câmbio?
Regimes de câmbio flutuante, como se sabe, geram muito maior volatilidade. Mudanças de humores se transmitem rapidamente para as cotações do dólar. Por definição, gera mais sustos e força respostas mais ágeis.
Antes que alguém fique com saudade do regime cambial anterior, é bom lembrar que ele exigia juros estratosféricos para responder a crises. No final, nem mesmo esses juros conseguiram segurar o câmbio, o ataque especulativo se intensificou e levou a uma ruptura traumática.
Com o câmbio flutuando, se o mercado reduzir o fluxo de dólares, ou se ficar convencido de que ele será insuficiente, o câmbio tende a subir. Em algum ponto ele acabará gerando a correção de contas externas necessária para viabilizar uma situação de maior equilíbrio.
É importante saber, portanto, até que ponto uma crise externa, puxada, por exemplo, pela Argentina, ou por uma correção da Bolsa de Nova York, poderá mudar fortemente as expectativas e gerar um salto na cotação do dólar. Em outros termos, a chave é saber qual a vulnerabilidade externa do país a novas crises.
Do ponto de vista do tamanho do buraco externo (a conta corrente), ela ainda é muito grande. O governo estima em US$ 20 bilhões o déficit em conta corrente este ano; bancos calculam em até US$ 25 bilhões (caso do Citi).
As chances de o déficit ser menor são mínimas, porque algumas contas de serviço (juros, lucros e dividendos) são rígidas e porque a balança comercial continua decepcionando. Do lado positivo, contudo, estão as estimativas, unânimes, de que boa parte do déficit em conta corrente, ou todo ele, poderá ser financiada pela entrada de investimentos diretos este ano. Quer dizer, com um dinheiro externo mais estável.
Resta, contudo, o problema dos vencimentos de empréstimos, linhas de crédito e bônus este ano. Se não forem rolados, serão uma necessidade a mais.
Em maio e junho, o governo ainda pode usar muitas reservas para cobrir eventuais não rolagens. O acordo com o FMI prevê o gasto de US$ 1,5 bilhão, mais 25%, por mês, ou seja, US$ 1,9 bilhão. Além disso, o Brasil captou US$ 2 bilhões em "cash" com seu bônus global e US$ 1 bilhão do Banco Mundial.
O memorando técnico com o FMI é meio ambíguo sobre o uso desse dinheiro. Se puder usar, são US$ 4,9 bilhões por mês; se não puder, é US$ 1,9 bilhão. Em qualquer hipótese é uma margem razoável, que deixa o mercado mais tranquilo.
Outro ponto importante é que as necessidades de rolagem vão cair, nos próximos meses. As amortizações totais de empréstimos e bônus do setor privado, nas contas de um banco de investimentos, somaram US$ 12,3 bilhões no primeiro trimestre. No segundo trimestre, caem para metade, US$ 6,04 bilhões. No terceiro trimestre caem ainda mais, para US$ 3,4 bilhões, e no quarto para US$ 2,9 bilhões.
No caso dos bônus, que são bastante afetados por crises na região, como a da Argentina, a queda é muito expressiva. As amortizações privadas cairão de US$ 7,2 bilhões no primeiro trimestre para US$ 3,6 bilhões no segundo, US$ 1,2 bilhão no terceiro e US$ 960 milhões no quarto.
A rolagem de empréstimos do setor privado chegou a US$ 5,8 bilhões em fevereiro. Caiu para US$ 4,6 bilhões em março, US$ 1,6 bilhão em abril, US$ 1,4 bilhão em maio. Em junho, sobe para US$ 3 bilhões, mas, daí até dezembro, fica entre US$ 900 milhões e US$ 1,1 bilhão por mês.
A conclusão é que a pressão das contas externas e das rolagens tende a diminuir, especialmente no segundo semestre. Está longe, contudo, de deixar o país imune a agitações no mercado externo. Especialmente se, por razões políticas ou de mercado, ficar claro que a privatização será muito menor, reduzindo, também, o ingresso de investimentos diretos.
De todo modo, é uma situação bem mais confortável do que à do final do ano passado e início deste ano, e com chances de melhorar.


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