São Paulo, Segunda-feira, 28 de Junho de 1999
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Desaprovação a lei norte-americana que pune países que façam certos investimentos na ilha é retirada do texto da Declaração do Rio durante reunião de chanceleres; Cuba discorda da exclusão

Documento não condenará lei anti-Cuba

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
enviado especial ao Rio

Uma condenação explícita a uma lei norte-americana que permite à Justiça dos EUA punir empresas e cidadãos de outros países que façam certos investimentos em Cuba foi retirada ontem do texto da Declaração do Rio.
A versão final vai ser entregue para o exame dos 48 chefes de Estado e de governo que abrem hoje a primeira reunião de cúpula América Latina e Caribe e União Européia, no Museu de Arte Moderna, no centro do Rio.
O ministro das Relações Exteriores de Cuba, Felipe Pérez Roque, 34, que assumiu o cargo há um mês, discordou da exclusão da referência à Lei Helms-Burton na reunião de chanceleres que aprovou o texto.
É possível que o presidente cubano, Fidel Castro, volte a tratar do assunto nas três plenárias dos líderes marcadas para hoje. Os chefes de Estado e de governo têm autonomia para alterar textos que lhes são encaminhados pelos chanceleres, embora isso não seja prática muito comum.
Pérez Roque argumentou que tanto a América Latina quanto a União Européia já condenaram a Helms-Burton; por isso, não haveria razão para omiti-la na declaração.
Mas, em maio de 1998, o governo dos EUA e a Comissão Européia chegaram a um acordo provisório sobre o que fazer com a lei.
Por isso, os europeus preferiram não mexer com o assunto em uma declaração conjunta com os vizinhos de hemisfério dos EUA.
A Helms-Burton foi sancionada pelo presidente Bill Clinton em 12 de maio de 1996, após a aviação cubana ter afundado um barco de entidade anticastrista com cidadãos norte-americanos a bordo.
Clinton se opunha ao projeto de lei, apresentado pelo senador arquiconservador Jesse Helms e pelo deputado de direita Dan Burton.
Mas, em campanha pela reeleição, o presidente resolveu endossá-la para não perder (como acontecera em 1992) nos importantes Estados de Flórida e Nova Jersey, onde a comunidade cubano-americana exerce grande influência.
A Helms-Burton, além de ampliar o embargo econômico que os EUA impunham a Cuba desde 1962 e aplicar novas sanções contra aquele país, introduziu a possibilidade de punições extraterritoriais.
Cidadãos norte-americanos naturalizados ou filhos de cubanos que tenham sido proprietários de terrenos ou negócios expropriados pelo regime de Fidel Castro a partir da Revolução de 1959 ganharam o direito de processar nos EUA empresas estrangeiras que utilizem suas antigas propriedades.
Além disso, a lei determina que sejam negados vistos de entrada nos EUA aos dirigentes das empresas estrangeiras nessa situação.
Apenas uma empresa, a canadense Sherritt, da área de energia, sofreu até agora as consequências da Lei Helms-Burton. Clinton tem, a cada seis meses, usado o direito de suspender a aplicação dos capítulos mais polêmicos da lei.
A União Européia ameaçava denunciar os EUA na Organização Mundial do Comércio (OMC).
Mas recuou depois de Clinton ter prometido que continuaria suspendendo a aplicação da lei.
Em troca, os europeus prometeram a Clinton que vão desestimular investimentos de suas empresas em terrenos ou negócios desapropriados em Cuba.
A versão final da Declaração do Rio mantém a condenação genérica a "medidas unilaterais com efeitos extraterritoriais", sem citar nenhum exemplo específico.
A divergência de Cuba, a única manifestada na reunião de chanceleres ontem, mostra como os EUA, embora ausentes, são importantes na cúpula do Rio.
A declaração tem 69 parágrafos e é seguida de uma lista de prioridades de 48 parágrafos. É genérica, como todos os documentos semelhantes. Cria um "mecanismo de seguimento" para garantir que os contatos entre os dois blocos regionais continuem a se aproximar.
Uma comissão com seis representantes da América Latina e Caribe e quatro da União Européia será formada para encaminhar o futuro dos contatos entre elas.
Além das três reuniões, os 48 líderes nacionais jantam juntos hoje e almoçam amanhã. Os três co-presidentes da cúpula (Brasil, México e Alemanha) dão entrevista coletiva amanhã à tarde para avaliar os seus resultados.


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