São Paulo, domingo, 28 de novembro de 2004

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RONDÔNIA

Repasse federal a duas entidades que atendiam aldeias indígenas foi suspenso; investigação aponta omissão da Funasa

ONGs são suspeitas de desviar verba de saúde

ELVIRA LOBATO
ENVIADA ESPECIAL A RONDÔNIA

A CGU (Controladoria Geral da União), a Polícia Federal e o Ministério Público Federal investigam as duas principais organizações não-governamentais indígenas de Rondônia por suspeita de superfaturamento e desvio de verbas do Ministério da Saúde destinadas ao atendimento médico nas aldeias indígenas.
A investigação também aponta omissão da Funasa (Fundação de Nacional de Saúde), órgão do Ministério da Saúde, que, de acordo com a Polícia Federal, repassou recursos para entidades que não tinham estrutura para assumir a responsabilidade.
A Paca (Proteção Ambiental Cacoalense), com sede em Cacoal (RO), recebeu R$ 17 milhões da Funasa, em três convênios assinados entre 1999 e 2004, para atender 5.500 índios de 115 aldeias para aplicação em assistência à saúde e saneamento. A Cunpir (Coordenação da União das Nações e Povos Indígenas de Rondônia, Norte de Mato Grosso e Sul do Amazonas) recebeu cerca de R$ 9,5 milhões.

Repasses
A Funasa suspendeu os repasses às entidades em maio, diante dos indícios de irregularidades. Os convênios com as duas ONGs, que haviam sido assinados em 2002, terminaram em julho deste ano e não foram renovados.
Segundo a coordenação da Funasa em Rondônia, o pessoal de saúde que havia sido contratado por intermédio de prefeituras manteve o serviço de forma voluntária. A compra de medicamentos está sendo feita diretamente pela fundação.

Inquérito
A delegada da Polícia Federal Juliana Cavaleiro, que preside o inquérito contra a Paca, disse que há indícios de que teria havido superfaturamento de 25% na construção de postos de saúde e de fraudes nos processos licitatórios.
Vinte e seis pessoas são citadas como alvos de investigação no inquérito da Paca, entre dirigentes da ONG, servidores da Funasa, consultores (antropólogos, indigenistas etc.) e fornecedores.
A indigenista Maria Ines Hargreaves, estudiosa dos índios cintas-largas, é uma delas. Segundo a CGU, ela foi responsável pela movimentação de R$ 147 mil.
Nos autos do inquérito, consta que há indícios ainda de cotação de preços forjada em licitações, falsificação de assinaturas, compra de medicamentos diretamente em farmácias e despesas com consultoria sem comprovação de prestação do serviço.
O inquérito da Polícia Federal sobre a Cunpir investiga a suspeita de superfaturamento na compra de equipamentos e de combustíveis.
As duas organizações não-governamentais administraram a verba para saúde indígena em todo o Estado de Rondônia por quase cinco anos. A Paca respondia pelo atendimento às aldeias na metade sul do Estado, enquanto a Cunpir respondia pelo atendimento na parte norte.
A Funasa substituiu a Funai (Fundação Nacional do Índio) como responsável pelo atendimento médico à população indígena, em 99, e delegou a tarefa às ONGs.
O inquérito da Polícia Federal sobre as supostas irregularidades na Paca, ao qual a Folha teve acesso, informa que a ONG possuía, de próprio, apenas um computador, uma impressora, um automóvel e uma moto, quando assinou o primeiro convênio com a Funasa, em 1999.
A delegada Juliana Cavaleiro faz críticas à atuação da Funasa no episódio. Ela afirma que a fundação aprovou o convênio com a ONG baseando-se apenas no parecer de uma consultora, que teria levado 15 dias para analisar o projeto da entidade. Diz que a Funasa também teria sido omissa na fiscalização do convênio.

Cunpir
A Cunpir está mergulhada em uma grave crise desde que a Funasa realizou uma auditoria especial no convênio, no ano passado, que resultou na suspensão dos repasses à entidade. A ONG chegou a acumular R$ 2 milhões em dívidas com os fornecedores, no início do ano, e o comando da entidade foi trocado.
O cacique Almir Surui, que substituiu Antenor Karitiana, confirma que houve superfaturamento na compra de materiais, principalmente de combustíveis, e outras irregularidades na aplicação do dinheiro proveniente do Ministério da Saúde, mas, assim como a Polícia Federal e a Procuradoria da República, ele acusa a Funasa de ter sido conivente.
Segundo Surui, as irregularidades foram praticadas desde o início dos convênios, em 1999, e a Funasa teria tido conhecimento delas, na ocasião. ""Mesmo assim, ela renovou os convênios", queixa-se o coordenador.


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