São Paulo, quarta-feira, 29 de março de 2000


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LEIA A ÍNTEGRA DO PEDIDO DE IMPEACHMENT DA OAB-SP CONTRA O PREFEITO CELSO PITTA

Leia a íntegra do pedido de impeachment da OAB-SP contra o prefeito Celso Pitta

Exmo. sr. presidente da Câmara Municipal de São Paulo
D.D. Vereador Armando Mellão Netto

, brasileiro, casado, advogado e como presidente da ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECÇÃO DE SÃO PAULO OAB-SP, domiciliado e residente no município de São Paulo-SP, (...); LaÍs Amaral Rezende De Andrade, brasileira, solteira, advogada, presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB-SP, domiciliada e residente no município de São Paulo-SP, (...), Fernando de Cássio Rodrigues, brasileiro, divorciado, advogado, domiciliado e residente no município de São Paulo-SP, (...) e Edson Cosac Bortolai, brasileiro, casado, advogado, domiciliado e residente no município de São Paulo-SP, (...), todos conselheiros da OAB-SP, munícipes eleitores, portadores de título de eleitor, bem como comprovando o exercício do sufrágio na última eleição e a residência neste município de São Paulo, vêm respeitosamente à presença de V.Exa., com fundamento nos arts. 68, 72-II e 73 da Lei Orgânica do Município de São Paulo (LOMSP) c/c art. 390 do Regimento Interno da Câmara Municipal de São Paulo (RICMSP), apresentar
D E N Ú N C I A
contra o excelentíssimo prefeito municipal de São Paulo, Sr. CELSO ROBERTO PITTA DO NASCIMENTO, objetivando seja a mesma oportunamente convolada em acusação que, após contraditório e ampla defesa, deverá ensejar a cassação do mandato eletivo do mesmo, pelos motivos seguintes:
F A T O S:
1.Despertado pelo intenso noticiário a respeito das declarações da ex-mulher do sr.prefeito, dona Nicéa Camargo do Nascimento, que se reportava a acontecimentos anteriores, nebulosos, os quais teriam envolvimento de seu ex-marido o prefeito, dentre outras autoridades, foi determinado pela Ordem dos Advogados do Brasil Secção de São Paulo que conselheiro relatasse a matéria propondo o que de direito, em virtude do clamor motivado pelo noticiário e pesquisas públicas.
2.O relatório, da lavra do prof. Márcio Cammarosano, destaca que
"... não se pode desprezar a avalanche de denúncias, indícios e até mesmo alguns elementos probatórios, de sorte que se nos afigura imperioso ao menos levar aqueles a sério, o que já é suficiente para algumas conclusões.
O prefeito do município de São Paulo está, e isto é certo, sob seriíssimas acusações. São acusações em princípio verossímeis em face do quadro geral delineado, não se podendo deixar de emprestar-lhes uma inicial credibilidade, ainda que por enquanto provisória e relativa.
Mais um dado deve ser considerado:
as declarações prestadas ao Ministério Público pela senhora Nicéa Camargo do Nascimento são declarações de quem, enquanto esposa do prefeito, desfrutou da intimidade do poder. ...",
e conclui:
"a) que este conselho, honrando as mais caras tradições de nossa entidade, em cumprimento de suas finalidades institucionais, sensível ao clamor da sociedade, e comprometido, enfim, com a restauração da governabilidade do município de São Paulo e do respeito à ordem jurídica que postula pela probidade e moralidade administrativas, proclame a impostergável necessidade de rigorosa e cabal apuração das acusações já mencionadas. Deve a Câmara Municipal, imediatamente, criar as comissões de inquérito que se fizerem necessárias, exigindo e velando a OAB/SP para que os vereadores de São Paulo honrem o mandato que o povo lhes outorgou;
b) Sem prejuízo do proposto na alínea anterior, o oferecimento, pelo presidente desta seccional, nessa qualidade e também como munícipe eleitor, depositário da confiança deste conselho, e por ele autorizado, de denúncia perante a Câmara Municipal de São Paulo, objetivando a instauração da devida comissão processante e, a final, se for o caso, a cassação do mandato do prefeito, por infrações político-administrativas. Com esse escopo, a denúncia poderá ser instruída com novos elementos que fortaleçam convicção quanto à sua procedência. ...".
3.Submetido o relatório mencionado à sessão plenária realizada em 20 de março p.p., o mesmo foi aprovado por unanimidade (69 votos), com três (3) abstenções, o que por si demonstra a uniformidade da rejeição social aos fatos noticiados pela imprensa, que envolvem o sr. prefeito.
4. Em respeito à determinação do Plenário da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional de São Paulo, que, captando a vontade da população, entendeu que algo de concreto deve ser feito contra tal estado de coisas, apresenta-se a presente D E N Ú N C I A pelas razões adiante destacadas.
- ATUALIDADES -
5.Em que pesem os antecedentes adiante mencionados, por si suficientes à perda do mandato do sr. prefeito, as declarações de sua ex-esposa publicadas na imprensa foram ratificadas em depoimento prestado pela mesma junto ao Ministério Público de São Paulo levantando-se o véu sobre a participação ativa do sr. prefeito em ocorrências indignas que o impedem de continuar no cargo.
Essas declarações foram corroboradas pelas prestadas por seu filho, também feitas no Ministério Público, e pois livres de coação.
Transcrevem-se a seguir algumas declarações, na mesma ordem que foram expostas por dona Nicéa, destacando-se os temas:
"Propina dos fiscais"
"... no ano de 1998, passou a ouvir várias denúncias de pessoas que a procuravam no Centro de Apoio dizendo sobre a existência de cobrança de propinas por parte de fiscais da Prefeitura; que a declarante comunicava essas denúncias ao seu ex-marido Celso Pitta ... sendo que ambos pediam à declarante que obtivesse provas, pois sem elas nada poderiam fazer; ... que nem seu ex-marido nem o Secretário de Governo tomaram qualquer iniciativa no sentido de orientá-la sobre o encaminhamento destas pessoas que apresentavam denúncias a departamentos da Prefeitura, Jurídico ou de Corregedoria, para as providências cabíveis; ...".

Como nada fez, ficando omisso, incide o sr. prefeito nas disposições dos mencionados art. 4º, VIII, do Dec. Lei 201/67 e Art. 73, IV, "d" da LOMSP.


"Contratação de funcionários fantasmas"

"... que vários funcionários da Anhembi foram nomeados pelo secretário de governo Edvaldo ... sendo que estas nomeações ... tinham o aval de Celso Pitta; que a declarante informa que as contratações de funcionários fantasmas ... se davam através de Edvaldo ...; que depois este foi substituído por Augusto Meinberg que continuou contratando funcionários fantasmas ...".

Por sua vez depôs seu filho:
"... lembra-se de ter ouvido Flávio (Maluf) pedir ao seu pai as providências para a nomeação de Ricardo Castelo Branco na empresa Anhembi; que Flávio insistiu várias vezes em relação a essa nomeação, seu pai relutou no começo mas acabou aceitando; ...".
Aliás, o próprio ex-Presidente da Anhembi, Ricardo Castelo Branco, em depoimento junto ao Ministério Público, confirmou as denúncias consoante publicação do jornal "O Estado de São Paulo" de 18/03/2000, pg. C-5.

Aqui parece evidente a vulneração pelo prefeito do disposto no art. 73, IV, "d" e "f" da LOMSP, caracterizando-se ato de improbidade administrativa e descumprimento de lei (arts. 81 e 108 da LOMSP).

"Loteamento das Administrações Regionais"

"... que logo no início da gestão do governo do seu ex-marido, os vereadores governistas se rebelaram contra a iniciativa de Celso Pitta no sentido de retirar-lhes a influência política sobre as administrações regionais, como vinha acontecendo na gestão do prefeito anterior; que Celso Pitta cedeu à pressão, e concedeu aos vereadores situacionistas a possibilidade de influenciarem nas administrações regionais; ...".

Como houve a cassação de dois (2) vereadores que exerciam o controle das A.R. de São Mateus (Vicente Viscome) e Pirituba (Maeli Verguiano), por atos de improbidade administrativa e de falta de decoro parlamentar, ficando inclusive apurados na CPI desta última atos muitos semelhantes aos ocorridos nas A.R. da Sé e da Penha, força é convir que a responsabilidade última é do sr. prefeito, que cedendo às pressões permitiu que aqueles, influenciando as A.R., praticassem os desmandos que os levaram à cassação. Assim, por não ter tomado as medidas que lhe competia (v.g. demitindo administradores regionais, determinando abertura de sindicância, etc.), é o sr. prefeito co-responsável pelos atos de improbidade praticados, incidindo mais uma vez na figura do art. 73, IV, "d" da LOMSP.


"Compra de vereadores"

"... que a declarante, no final de 1997, durante o andamento de uma comissão parlamentar de inquérito que visava à cassação do prefeito por fatos relacionadas à emissão de precatórios, a declarante tomou conhecimento, através de informação dada através de seu próprio ex-marido, que para que os vereadores situacionistas votassem no sentido de impedir a instauração da comissão processante, Celso Pitta teve que pagar certa importância em espécie, cujo valor não sabe dizer, sendo que este dinheiro seria rateado entre todos os vereadores que votassem de acordo com o interesse do Executivo; que segundo lhe revelou seu marido, em reuniões ocorridas em sua residência, não estando a declarante presente, ali estiveram os vereadores Armando Mellão, Bruno Feder, Faria Lima e Nelo Rodolfo, à época presidente da Câmara, bem como o secretário de governo Edvaldo Alves da Silva, ocasião em que todos discutiram sobre a negociata, tendo Celso Pitta concordado com a proposta de pagamento em dinheiro aos vereadores para que votassem contra o início da comissão processante; que, segundo Celso Pitta, o levantamento do dinheiro era da responsabilidade de Edvaldo Alves da Silva, não sabendo a declarante informar de que forma ele procedia; que posteriormente, durante a CPI da Educação, fato desta mesma natureza voltou a acontecer, sendo que novamente o secretário de governo Edvaldo Alves da Silva, em comum acordo com Celso Pitta e os vereadores, pagou a estes importâncias em dinheiro, cujos valores desconhece; que os partícipes desta outra reunião para fixação dos valores da propina eram basicamente o secretário de governo Edvaldo Alves da Silva, o presidente da Câmara Nelo Rodolfo, e os vereadores Bruno Feder e Faria Lima; que segundo soube a declarante, o dinheiro para pagar a propina era levado à casa de Edvaldo Alves da Silva, que entregava ao vereador Nelo Rodolfo, o qual realizava a distribuição em relação aos demais vereadores; que nesta época, também integrava o grupo de vereadores que recebiam propina o vereador Salim Curiati Filho; que a declarante testemunhou, agora no início de 1999, quando da instauração de um outro processo de impeachment contra o prefeito Celso Pitta, bem como da criação da CPI da Máfia dos Fiscais, uma reunião realizada em sua residência, onde estavam presentes o vereador Armando Mellão, o secretário Carlos Augusto Meinberg e o secretário de Comunicação Social Antenor Braido, além de seu ex-marido Celso Pitta; que foi o próprio Celso Pitta quem fez questão da presença da declarante; que a reunião ocorreu alguns dias antes da votação final visando arquivar o processo de impeachment contra Celso Pitta; que a reunião ocorreu à noite, tendo se iniciado por volta das 21 horas, e teve duração de duas horas, mais ou menos; que não se recorda o dia da semana exato da reunião, mas era próximo ao final de semana; que quem chegou primeiro foi Armando Mellão, em seguida Augusto Meinberg e Antenor Braido, juntos; que recorda-se, agora, que também estava presente nesta reunião o secretário de Saúde Jorge Pagura, que também chegou junto com Augusto e Antenor; que assim que Celso chegou, foi ao seu quarto e logo retornou, tendo início as conversações; que iniciada a reunião, Carlos Augusto já foi logo dizendo que o valor que estava sendo pedido pelos vereadores para votarem a favor de Celso Pitta estava muito elevado, e que eles teriam que diminuir; que Augusto falava, pelo que a depoente pôde perceber, que o valor estaria em torno de um milhão de reais; que, segundo compreendeu a declarante, a importância de um milhão de reais seria o total a ser dividido entre os vereadores que votassem ao favor do Executivo, não de uma única vez, mas em prestações mensais até o final da gestão; que o argumento era que os vereadores iriam enfrentar eleições no ano seguinte, e precisavam de fazer caixa para as despesas; que Celso Pitta argumentava que um milhão era absolutamente inviável; que ante a recusa de Celso Pitta em relação ao valor, Armando Mellão disse que iria realizar outra reunião com os vereadores, para consultá-los sobre a aceitação de um valor menor; que Armando Mellão foi o primeiro a sair da reunião, e saiu rápido, para já iniciar o contato com os vereadores, para renegociação dos valores; que Carlos Augusto Meinberg prometeu a Armando Mellão que, caso conseguisse a redução, o pagamento seria feito no dia seguinte, na casa de Jorge Yunes, tendo sido acordado que no dia seguinte Mellão compareceria ao gabinete de Meinberg para manifestar o valor fixado, que seria pago naquela mesma noite, na casa de Jorge Yunes; que após a saída de Armando Mellão, a declarante comentou com os demais, para marcar a outra reunião na sua própria residência, onde seria colocada uma câmara de televisão oculta, para que fosse filmado o pagamento da propina, bem como fosse avisada a Polícia Federal; que Augusto Meinberg disse que esta sugestão significaria o suicídio político de Celso Pitta, tendo Celso Pitta concordado com a posição de Meinberg;... que Celso Pitta disse a Jorge para que não tumultuasse com outro assunto, pois deveria decidir uma questão de cada vez, e a questão relativa ao pagamento aos vereadores era prioridade no momento;... que nesta reunião apenas estavam presentes a declarante e as pessoas já nomeadas; que o filho da declarante, Vítor, havia saído de casa, supondo a declarante que tenha ido ver sua namorada Sara, ou ido ao curso supletivo noturno, ... que Meinberg, durante a reunião, disse que o dinheiro a ser pago aos vereadores seria obtido junto a empresas que prestavam serviços ao município, mas não especificou quais e nem que tipo de empresa; ... que após a saída de todos os partícipes da reunião, tendo chegado em casa seus filhos Vítor e Roberta, a declarante resolveu realizar uma reunião com todos os familiares, tendo exposto aos filhos o que ocorreu naquela reunião; que a declarante pediu aos seus dois filhos para que estes a auxiliassem no sentido de demover o pai Celso de fazer o pagamento do dinheiro aos vereadores; houve uma reunião familiar, no quarto do casal, onde a declarante e seus dois filhos disseram a Celso Pitta para que não fizesse aquilo, que ele não deveria se deixar influenciar por Meinberg, que eles já estavam melhor perante a opinião pública, e que ele poderia realmente marcar sua administração com uma moralização, deixando, inclusive, de ser refém destas pessoas todas; que Celso Pitta disse que iria pensar, estava cansado, e que amanhã conversaria melhor, mas, no dia seguinte, continuou a negociata; ...".

Nobres vereadores: os fatos aqui apontados, da mais alta gravidade, se não apurados em toda a sua extensão, comprometem toda a Câmara Municipal, pois além de não indicarem individualmente quais vereadores teriam recebido dinheiro -limitando-se a nominar os que teriam participado das negociações- lançam dúvidas quanto a correção dos nobres vereadores, muitos dos quais por razões de consciência ou por orientação partidária tenham votado pelo arquivamento das CPIs dos precatórios, da educação e da máfia dos fiscais.
O mesmo se diga quanto ao encerramento do processo de impeachment do prefeito mencionado no depoimento de dona Nicéa.

O filho VICTOR confirma o testemunho da mãe:
"... recorda-se de uma reunião em especial, que ocorreu em sua casa, em razão da conversa que posteriormente teve com seu pai, sua mãe e sua irmã Roberta; lembra-se que, ao que parece, foi em maio do ano passado, sua mãe, antes que o declarante saísse, disse-lhe que iria acontecer uma reunião na sua residência, onde seria discutido a questão da votação dos vereadores sobre a cassação de seu pai, sendo que Meinberg para lá iria para negociar sobre dinheiro a ser pago aos vereadores para que votassem a favor de seu pai; que sua mãe indagou-lhe se ele gostaria de permanecer na reunião, mas o declarante preferiu sair para encontrar sua namorada Sara; que quando o declarante deixou a sua casa viu que Meinberg já estava presente, além de outras pessoas, dentre eles Antenor Braido e Armando Mellão; que deixou sua casa por volta de sete ou oito horas da noite, e retornou por volta das 0h30, 1h da madrugada; que quando o declarante saiu de casa, sua irmã ainda lá estava presente; quando retornou, sua mãe o chamou para uma conversa com toda a família, sendo que sua irmã, que também havia saído, já houvera retornado; que o declarante, sua irmã Roberta e sua mãe Nicéa passaram a conversar com o pai, Celso; soube o declarante que os vereadores, para votar a favor do prefeito, estavam querendo dinheiro, bem como algumas regionais; que seu pai estava disposto a negociar; que o declarante, sua irmã e sua mãe diziam a ele que ele não deveria aceitar a proposta de pagamento de propina, pois se não ficaria o tempo todo refém deles; sugeriram que Celso Pitta colocasse uma câmera oculta, ou um gravador, para fazer prova do fato, mas Celso Pitta não concordou com isso, embora tivesse dito que iria pensar sobre o assunto; que soube que Armando Mellão dizia que os vereadores estavam querendo em torno de um milhão de reais, a ser pago em prestações mensais até o final do mandato, e que este pagamento seria feito na residência de Jorge Yunes, que era um outro local em que o pai do declarante ia muito, inclusive para se encontrar com vereadores; que, segundo soube, seu pai chegou a prometer a Armando Mellão o pagamento, mas não no valor que estava sendo pedido;... que o declarante soube, posteriormente, através de afirmação feita por seu próprio pai, que ele realmente havia pago aos vereadores, e que a situação agora ia se acalmar; ... que o declarante comentava os fatos que aconteciam com seu pai para sua namorada, Sara Teitelbaum, e também chegou a narrar a ela sobre a reunião familiar, no sentido de aconselhar o pai a que não cedesse à solicitação de propina feita pelos vereadores; ...".

Ora, é absolutamente fora de dúvida que tal comportamento do sr. prefeito, denunciado por aqueles que com ele viviam na mais entranhada intimidade, atenta contra o livre exercício da Câmara Municipal, sendo fato, por si só, autorizador da cassação do seu mandato, consoante prevêem as disposições do art. 73, IV, "b" e "f", da LOMSP.


- "EMPRÉSTIMOS" -

Declarou dona Nicéa:
"... que a respeito do empréstimo de 600 mil reais feito por Jorge Yunes a seu ex-marido Celso Pitta, a declarante soube disso através de notícia de jornal; que quando o fato saiu no jornal, em agosto de 1998, indagou a Celso Pitta a respeito, tendo ele dito que aquele dinheiro era para gastos pessoais e manutenção da casa, que a declarante perguntou por que o pedido de empréstimo a Jorge Yunes, porque ele poderia tê-lo feito para o cunhado da declarante, Felipe Arno, que tem uma situação econômica bastante boa, ou então para Roberto Maluf, que mantinha boas relações de amizade, carinho e respeito com a família Pitta, até porque a ida de Pitta para trabalhar na Eucatex foi a convite de Roberto Maluf; que Celso Pitta não esclareceu porque escolheu Jorge Yunes para pedir o empréstimo, respondendo apenas que aquilo não era problema da declarante, e que parasse de cansá-lo com perguntas; e que a declarante ainda disse que ele pelo menos deveria tê-la comunicado deste empréstimo, para que ela não viesse a saber das coisas pelos jornais, como sempre vinha ocorrendo; ...".

Por sua vez declarou seu filho:

"... que conheceu Jorge Yunes durante a campanha de seu pai à prefeitura; que quando seu pai foi eleito, no dia da posse, em uma festa que ocorreu na casa de Edevaldo Alves da Silva, Jorge Yunes fez questão de dizer ao declarante que tinha investido milhões na campanha de seu pai e que a partir daquele momento iria ajudá-lo com o que "a gente necessitasse"; que Jorge Yunes, de vez em quando, ia à casa do declarante, normalmente em épocas festivas; que sempre o encontrava no carnaval, no Anhembi; que o declarante soube pelos jornais a respeito do empréstimo que Jorge Yunes fez a seu pai no valor de 600.000 reais; que indagou seu pai a respeito, e ele lhe disse que foi o Jorge Yunes quem se ofereceu para fazer o empréstimo; que o empréstimo era necessário para que pudesse comprovar as rendas dele; que o pai do declarante disse a ele que precisava justificar sua renda perante a opinião pública, e a solução encontrada foi o empréstimo com Jorge Yunes; que o declarante perguntou o que Jorge Yunes ia querer em troca, e seu pai lhe disse que ele só queria ajudar, e que não queria nada em troca; que diante desse fato, o declarante não sabe dizer com certeza se Jorge Yunes realmente entregou aquele dinheiro ao seu pai; ...".

Ora, o móvel do empréstimo -ocorrido ou não com transferência efetiva do dinheiro- foi segundo seu filho, comprovação da renda do prefeito perante a opinião pública, ou seja, dinheiro o mesmo tem, o que não podia era gastar por ter que justificar a origem perante os munícipes. Daí o alegado empréstimo. Mas como pode ter dinheiro, sustentando a família, no padrão demonstrado, com o salário da Prefeitura, se é impossível nas circunstâncias haver sobra para poupança? Se tem dinheiro poupado não pode ter sido por conta de sobras salariais. Note-se que adiante, em seu depoimento, o filho do Prefeito narra -relativamente à remessa de dólares para Londres e Nova York-
"... que Celso Pitta esclareceu ao declarante que o dinheiro (US$ 18 mil) era dele, Celso Pitta, sendo que João Carlos Martins apenas lhe prestou o favor de repassá-lo para o declarante através daqueles depósitos, pois ele não tinha conta no exterior ..." (grifamos).

e narra a respeito da prima do prefeito, Raquel, em N.York:
"... que Raquel, para montar o escritório, solicitou ajuda de seu pai Celso Pitta, isto já na época que seu pai era prefeito; que acha que se tratava de ajuda financeira, mas não tem certeza; que acha que seu pai a ajudou, e a sua suspeita está relacionada com o seguinte fato: sua irmã Roberta, no ano passado, foi residir em Nova York, passando a morar num apartamento ocupado por Raquel, em companhia dela; que quem pagava o aluguel deste apartamento era seu pai Celso Pitta; ... não obstante Roberta tivesse deixado o apartamento, continuou a pagar o aluguel do apartamento de Raquel ...".

De outro modo, reforça a tese do empréstimo não ter existido na realidade, pois tal montante e condições só "de pai para filho" (R$ 600 mil, com juros de 6% ao ano), tendo Dona Nicéa declarado que o prefeito e o empresário que lhe fez o empréstimo não tinham "relacionamento íntimo de amizade". Nem se argumente que os juros legais são de 6% ao ano, pois o Código Civil, nos artigos 1062 e 1063, ressalva que tal é a taxa quando não estipulada; demais disso a aplicação mais conservadora é a caderneta de poupança, que rende mais do que aquela taxa. O que for inferior à taxa da poupança deve ser considerado presente à autoridade nos termos do artigo 9º , I, da Lei 8.429/ 92. Note-se que tal disposição legal é objetiva: constitui-se ato de improbidade administrativa conferir qualquer tipo de vantagem, notadamente receber presente (e tal "empréstimo" não passa disso) de quem possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão do agente público. Assim, o empresário poderia fazer empréstimo nas condições contratadas com qualquer amigo, exceto com o agente público que possa atingi-lo ou ampará-lo por ação ou omissão, como neste caso. Ora, no mundo real essas coisas não acontecem dessa forma mesmo entre amigos íntimos, até porque o empresário veio a ser desmentido em depoimento do filho do prefeito sobre comissões pagas a dona Nicéa, que posteriormente ratificou a declaração do filho junto a imprensa:
"... que o declarante afirma que sua mãe nunca trabalhou com venda de obras de arte para Jorge Yunes; que sabe que Jorge Yunes chegou a afirmar que deu à sua mãe uma determinada importância em dinheiro, cujo valor não se recorda, a título de pagamento por intermediação de venda de obras de arte; que isso não aconteceu, sendo que ele também queria justificar as contas de sua mãe; "Era para dar explicação no jornal que sua mãe teria trabalhado pra ele com venda de obras de arte'; ..."
Então, se o motivo foi justificar os gastos, o alto padrão de vida perante a opinião pública, é porque não se conseguia provar a origem dos recursos. Aliás é dona Nicéa que
"... confirma ter dito em entrevista ... ter sabido que seu ex-marido estaria milionário; que quem lhe disse esta informação foram dois advogados ... que ... propuseram à declarante a realização de um acordo formal da separação, mas que haveria um acordo real, "por baixo do pano", onde os valores seriam bem mais elevados; ...".

E viver o prefeito acima de sua renda constitui ato de improbidade administrativa na forma do art. 9º -VII da Lei 8.429 de 02.06.92, prescrevendo constituir ato de improbidade administrativa, adquirir para si ou para outrem no exercício do mandato bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público (v.g. aluguel de flat, viagem e manutenção dos filhos e mulher no exterior, manutenção do apartamento da família em São Paulo, pagamento de vigilantes do filho, etc.).
Nesse tópico, mais um motivo para a decretação da perda do mandato do prefeito, na forma do Art. 73, IV, "d", da LOMSP.
Por último, se efetivamente ocorreu o empréstimo naquelas condições, trata-se de presente de alguém que agradece um favor ou procura um favor (e dos grandes). Como o prefeito não tem patrimônio pessoal para retribuir a gentileza, só podemos entender tratar-se de retribuição, de alguma forma, com o patrimônio público. E nessa hipótese incide o disposto no art. 9º, I, da Lei 8.429/ 92, determinando constituir-se ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do cargo, notadamente receber qualquer vantagem econômica direta ou indireta a título de gratificação ou presente, de quem tenha interesse direto ou indireto, ou que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público (note-se que o empresário asseverou ter investido milhões na campanha do prefeito, e como não é "casa de caridade", alguma vantagem esperava e conseguiu, como ressaltado e comprovado em ação movida pelo Ministério Público Estadual, a que dá notícia a documentação que ora se junta ANEXO XI ïn fine". E a improbidade justifica a perda do mandato nos expressos termos da LOMSP, Art. 73, IV, "d".





- "LIXO" -
Por ocasião da Copa do Mundo de Futebol o sr. prefeito aceitou favores da empresa Lyonnaise des Eaux, empresa francesa de limpeza pública, controladora da Vega Engenharia Ambiental, responsável por coleta de lixo em São Paulo. Consta que o casal prefeito iria assistir à decisão final no camarote da Lyonnaise, que também pagara as despesas de hotel. O fato é narrado, com riqueza de pormenores e dramaticamente, pela dona Nicéa, partícipe de todos esses momentos:


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