São Paulo, Quinta-feira, 29 de Julho de 1999
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DISTRIBUIÇÃO DE RENDA
Para d. Demétrio Valentini, CNBB não pode participar de algo ""onde o PFL dá as cartas"
Bispo faz críticas a projeto de ACM

RICARDO MIRANDA
Coordenador de Política da Sucursal de Brasília

Dom Demétrio Valentini, 59, um dos mais influentes bispos da Pastoral Social da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), disse ontem à Folha que não gostaria que a entidade integrasse a Comissão Permanente do Conselho Federal de Combate à Pobreza -proposta em projeto pelo senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA).
D. Demétrio presidiu durante oito anos a Pastoral Social da CNBB. "A gente não gostaria de compor uma comissão onde o PFL dá as cartas", disse d. Demétrio, bispo de Jales (SP) e presidente da Caritas Brasileira, organismo ligado à CNBB com atuação junto a comunidades carentes. "A Pastoral Social da CNBB não aceita ser cooptada. Não vamos assinar nenhum cheque em branco."
A comissão administraria os recursos do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, proposto anteontem por ACM, para "erradicar a pobreza" no Brasil até o ano 2010. A proposta de ACM prevê aumento de impostos para abastecer o fundo.
Além da CNBB, a comissão teria entre seus membros permanentes o vice-presidente, Marco Maciel, o vice-presidente da Câmara, Heráclito Fortes (PI), o vice-presidente do TCU (Tribunal de Contas da União), Humberto Souto, e o vice-presidente do Senado, Geraldo Melo (PSDB-RN). Os três primeiros são ligados ao PFL, partido de ACM.
D. Demétrio reconheceu que o combate à pobreza deve ser uma prioridade, mas discute a origem da proposta.
"É uma coisa estranha a procedência da proposta. Foi a mesma pessoa que defendeu o privilégio escancarado para uma multinacional (Ford) se instalar no seu Estado (Bahia). A gente fica se perguntando se esse súbito interesse em combater a pobreza não é uma cortina de fumaça para interesses eleitorais", disse ele.
O bispo disse que não adianta querer acabar com a pobreza fazendo leis. "Pobreza não se resolve com projetos, mas com opções profundas de governo. E a opção do atual governo, abrindo o país aos interesses das multinacionais e dos especuladores, provocou o agravamento da pobreza. Governo este que tem no senador (ACM) um dos seus maiores suportes."
De acordo com d. Demétrio, a CNBB está disposta a discutir a proposta e a ajudar a melhorá-la desde que seja feita "uma confissão pública do senador de que é preciso rever as prioridades assumidas pelo atual governo". D. Demétrio defendeu uma reforma fiscal "urgente" para que os pobres não sejam mais onerados.
"É para acabar com a pobreza? Então vamos colocar as cartas na mesa. Não aceitamos misturar interesses eleitorais na discussão", disse. ACM não foi localizado ontem para comentar as afirmações.
O vice-presidente do TCU, Humberto Souto, disse ontem que o fundo antipobreza idealizado por ACM precisaria ter uma fiscalização "rígida e absoluta" para que seus recursos não se percam "na burocracia e na corrupção brasileiras".
"Devemos aproveitar a idéia e a força política do seu líder (ACM) e criar um conselho independente, capaz de impedir que seus recursos se percam na burocracia e na corrupção."
Já o senador Geraldo Melo disse que a proposta de ACM, que ainda não leu, é "o ponto de partida". "A proposta é instigante e abre uma discussão que está tardando no país", disse.


Colaborou Flávia de Leon, da Sucursal de Brasília


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