São Paulo, Domingo, 29 de Agosto de 1999
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CELSO PINTO
Especulação empurra o dólar


O mercado financeiro tem repetido que uma das razões para a pressão sobre o câmbio, nos últimos meses, tem sido a procura crescente por "hedge", ou seja, operações que protegem empresas ou indivíduos contra desvalorizações do dólar. Será?
Um banco levantou o volume de dois tipos de operação feitas através da Cetip, central de liquidação, e que são largamente usadas pelas empresas como hedge: o "swap" (troca) de DI por dólar e de prefixados por dólar.
Olhando o DI/US$, o estoque em novembro do ano passado era de US$ 37 bilhões e, em dezembro, de US$ 32 bilhões. Desde abril até esta semana, contudo, o estoque tem oscilado pouquíssimo, sempre em torno de US$ 22 bilhões.
Olhando o estoque Pré/US$, o resultado é parecido. Em novembro de 98 era de US$ 16 bilhões e, em dezembro, de US$ 14 bilhões. No começo de abril era de US$ 9 bilhões, em maio e junho ficou pouco abaixo disto e, neste mês, tem oscilado na casa dos US$ 7 bilhões.
Se houvesse corrida ao hedge, estes estoques teriam que ter aumentado. O diretor de Política Monetária do Banco Central, Luiz Fernando Figueiredo, diz que, de fato, a demanda por hedge tem sido muito menor do que é a sensação no mercado.
É verdade que existem outras formas de buscar hedge. Dois tipos de operação usadas para hedge na Bolsa de Mercadorias e de Futuros têm crescido. As operações de dólares futuros e as de dólares/DI cresceram de US$ 970 milhões para US$ 1,9 bilhão, de meados de julho a meados de agosto.
Quem mais aumentou a compra de dólares, neste período, foram pessoas físicas (mudança de US$ 600 milhões na posição), investidores institucionais nacionais (US$ 650 milhões) e institucionais externos (US$ 150 milhões).
Outra fonte de hedge que aumentou foi a oferta de títulos do governo indexados ao dólar. O estoque subiu R$ 2,6 bilhões em julho (em parte, por simples valorização do dólar) e o BC ofereceu R$ 3 bilhões além da rolagem, neste mês, para acalmar o mercado.
Figueiredo diz que, mesmo considerando estas variações, o salto na procura por hedge não foi tão grande quanto supõe o mercado. Para vender os R$ 3 bilhões, o BC teve que fazer três leilões. Sexta, o BC ofereceu R$ 1,350 bilhão em papéis para rolagem futura e acabou vendendo apenas R$ 1,011 bilhão. Se a sede por hedge fosse tão forte, a procura nos leilões teria sido maior. O dólar, contudo, fechou em R$ 1,94.
Se a pressão sobre o câmbio não veio tanto pelo hedge, então existem duas outras explicações possíveis. Uma é que o fluxo de dólares não está tão tranquilo quanto dizem o BC e os próprios bancos. Os números do mês de julho, contudo, negam esta hipótese e Figueiredo garante que, até agora, o fluxo neste mês está sob controle.
Sobra a outra explicação: os bancos estão aumentando suas posições compradas. E se o sistema está liquidamente comprado, a tendência é pressionar as taxas de câmbio para cima: quanto maior a cotação, maior o lucro. Principalmente levando-se em conta que, na terça-feira, vence um contrato de dólares futuros na BM&F.
Em português claro, isso quer dizer que os bancos estão especulando para ganhar (ou não perder) com a subida do câmbio. Figueiredo é cuidadoso ao comentar esta questão, mas repete que tem existido mais uma "bolha" especulativa do que o reflexo de problemas concretos.
O que acaba tendo um impacto ainda maior porque o mercado tem estado com pouca liquidez. Na sexta-feira da semana passada, quando o câmbio bateu em R$ 1,999 e o BC entrou vendendo títulos cambiais, Figueiredo diz que pequenas compras, de US$ 2 milhões ou US$ 3 milhões, conseguiam puxar a cotação em 1% ou 2%.
Sua conclusão é que a alta exagerada é "claramente um movimento não sustentável". O BC aposta que, por esta razão, o mercado vai-se acomodar num patamar que faça mais sentido e prefere que isto aconteça sem sua interferência. "Só quando chega a uma barbaridade a gente entra", diz.
Ele argumenta que quatro incertezas das últimas semanas sumiram: 1) os ruralistas não levaram o que pediram; 2) o Fed só subiu o juro em 0,25%; 3) o Equador anunciou a moratória e não houve reflexo negativo imediato; 4) a Marcha dos 100 mil foi tranquila. Sua esperança é que o que chama de "círculo vicioso", estaja perto do fim.


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