|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CELSO PINTO
O que há de asiático
no ajuste externo
Muito já se falou sobre o
ajuste "asiático" feito pelo
Brasil em suas contas externas.
Alguns o consideram incompleto, outros o vêem como estrutural. Faz sentido a comparação?
A crise brasileira passou por
colapso do câmbio, fuga de dólares, forte desvalorização, inflação e redução de crescimento.
Nesse sentido, ela se compara
com a crise do México, no final
de 1994, e as dos países asiáticos
(Coréia, Indonésia, Tailândia,
Filipinas e Malásia), em 1997.
A falta de dólares obrigou a
um ajuste na conta corrente externa (mercadorias mais serviços). No Brasil, o ajuste cambial
se fez em duas etapas, em 1999 e
2002. De 1998 a 2002, a conta
corrente foi reduzida em US$
25,6 bilhões. O déficit caiu 3,5%
do PIB, entre o pico, em julho de
1999 (5,2%), e o ano passado
(1,7%). As necessidades de recursos externos (conta corrente
mais amortizações) caíram de
US$ 80,6 bilhões, em julho de
1999, para US$ 38,2 bilhões, no
ano passado.
Por qualquer desses critérios, é
um ajuste extraordinário. Ainda
assim, no entanto, muito menor
do que a guinada por que passaram os países asiáticos e o México. No primeiro ano pós-crise, o
ajuste em conta corrente foi de
6,4% do PIB no México, 14,4%
na Coréia, 7,4% na Indonésia,
16,8% na Malásia, 5,9% na Tailândia e 7,2% nas Filipinas.
A fuga de dólares foi menor no
Brasil, o que permitiu um ajuste
externo mais gradual (em compensação, deixou o país ainda
vulnerável a crises externas). A
desvalorização cambial (valorização do dólar em relação ao
real) de 192%, acumulada de
1998 a 2002, de todo modo, só
não foi maior do que a da Indonésia (237% em dois anos). Superou a de México (146% em
dois anos), Coréia (101% em um
ano), Tailândia (84% em um
ano), Malásia (54% em um ano)
e Filipinas (52% em um ano).
E como se comparam os custos
do ajuste, em termos de crescimento e inflação? O Brasil foi o
único entre esses países que não
sofreu queda no PIB, no ano da
crise ou no ano seguinte. Isso é
verdade inclusive quando se
acrescentam as crises da Rússia
(1998),Turquia (2000) e Argentina (2001), como mostra o gráfico. Em alguns países, a queda do
PIB em um ano foi violenta:
6,2% no México, 6,7% na Coréia, 13,1% na Indonésia, 7,4%
na Malásia, e 12% (em dois
anos) na Tailândia.
Se o custo for medido em termos inflacionários, o preço pago
pelo Brasil foi relativamente pequeno se comparado ao México
(81% em dois anos) e à Indonésia (95% em dois anos). Em quatro anos, a inflação acumulada
no Brasil (IPCA) foi de 39,9%. A
inflação acumulada no Brasil
equivaleu a 20% da desvalorização, enquanto no México foi de
56% e na Indonésia, de 61%. Nos
outros países asiáticos, contudo,
o impacto do câmbio sobre a inflação foi menor.
É claro que evitar uma queda
do PIB é desejável. Nesse sentido,
o Brasil saiu-se bem do ajuste externo e com um custo inflacionário relativamente baixo. Mas a
questão do crescimento tem que
ser vista numa perspectiva um
pouco mais ampla. E aí as comparações ficam piores para o
Brasil.
Como a fuga de dólares foi
mais intensa no México e na
Ásia, o ajuste nas contas externas foi mais duro, mas a recuperação, em geral, foi mais rápida.
Ajudou muito o fato de o comércio exterior (exportações mais
importações) ter um peso muito
maior nesses países do que no
Brasil. No ano anterior à crise, o
comércio externo representava
14% do PIB no Brasil, 33% no
México, 59% na Coréia, 77% nas
Filipinas, 44% na Indonésia,
157% na Malásia e 70% na Tailândia.
A desvalorização ajudou as exportações e conteve as importações. Como o peso do comércio
exterior era grande, foi maior o
impacto positivo sobre o crescimento. No caso do México, a crise coincidiu com o Nafta, acordo
de livre comércio com os Estados
Unidos, e o comércio exterior subiu de 33% para 58% do PIB de
1994 a 1998. Na Ásia, também
aumentou o peso relativo do comércio.
O resultado é que a recuperação das exportações foi vigorosa
e a queda das importações, limitada a apenas um ano pós-crise
(exceto na Indonésia), permitindo uma retomada mais rápida
do crescimento. Olhando quatro
anos pós-crise, o Brasil cresceu
8,5%; o México, 10,7%; a Coréia,
16,5%; e as Filipinas, 10,7%. Só
Tailândia (menos 3,6%) e Indonésia (menos 5,2%) cresceram
menos. Conclusão: ter um comércio externo significativo pode não evitar o custo imediato de
crises externas, mas ajuda na recuperação posterior e a atenuar
o impacto de novas crises externas.
E-mail: CelPinto@uol.com.br
Texto Anterior: Dívidas: STF autoriza banco a reter R$ 86 milhões das contas do Rio Próximo Texto: Caso Silveirinha: Corregedor diz que relatório não serve como prova contra auditores Índice
|