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LIVROS
Diversidade e convergência nos Legislativos estaduais
CARLOS RANULFO F. MELO
ESPECIAL PARA A FOLHA
O Brasil é um país onde o presidencialismo, por força da organização federativa e da variedade de
formatos do sistema partidário, se
realiza em 27 cenários distintos.
Analisar tais cenários, compará-los e estabelecer as relações com o
quadro político nacional é um desafio colocado perante sociólogos
e cientistas políticos. "O Poder Legislativo nos Estados: diversidade
e convergência" apresenta-se como um passo no sentido de dar
conta deste mosaico institucional.
A motivação inicial é testar a hipótese do "ultrapresidencialismo
estadual" (Fernando Abrúcio,
"Os Barões da Federação", ed.
Hucitec), segundo a qual, entre
1982 e 1994, o Executivo manteve
o controle sobre os demais poderes, bem como sobre a dinâmica
dos sistemas políticos nos Estados
brasileiros.
Os autores analisam as relações
entre o Executivo e Legislativo, a
produção legal das Assembléias,
bem como sua organização interna em seis Estados -Ceará, Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de
Janeiro, Rio Grande do Sul e São
Paulo- durante a legislatura
1995/1999. Um último capítulo
compara os poderes constitucionalmente definidos do governador e a organização interna das
Assembléias nos 27 Estados brasileiros.
De um modo geral, e este é o
ponto de convergência, os Executivos estaduais detêm poderes
constitucionais relevantes e conseguem levar a termo sua agenda.
A diferença está em como e a que
preço, uma vez que seus interlocutores estão organizados, e comportam-se, de modo distinto.
Em Minas Gerais, a Assembléia
passou por um aperfeiçoamento
institucional que resultou na adoção de mecanismos de interlocução com a sociedade civil e na ampliação dos recursos de informação à disposição dos deputados.
No outro extremo, estão as Assembléias do Espírito Santo e de
São Paulo. Na primeira, o desenvolvimento institucional é obstado pela falta de incentivos à divisão de trabalho e à especialização
dos deputados em áreas específicas. Na segunda, a fragilidade institucional aparece como resultado
de uma opção dos deputados que,
inseridos em uma carreira onde o
legislativo estadual é visto apenas
como ponto de passagem, privilegiam o Executivo como o locus da
negociação.
O desenvolvimento institucional explica porque a Assembléia
mineira é identificada como instituição autônoma e com capacidade de transformar suas preferências em políticas. A identificação
vale ainda para o Legislativo carioca. Mas, neste caso, as variáveis
explicativas para o tipo de produção legislativa encontrado são a
existência de um cenário de competição eleitoral mais intensa do
que o usual nos estados e um padrão descentralizado de organização interna.
Pelo que mostram os autores, os
dois casos não podem ser caracterizados por uma predominância
"imperial" do governo estadual.
As Assembléias mantêm uma dinâmica própria e são responsáveis pela maior parte da produção
legislativa. O Rio de Janeiro se
destaca na análise dos vetos do
Executivo: 40% deles foram derrubados, o que, comparado ao
Congresso Nacional, é um índice
elevadíssimo.
Deputados paulistas e capixabas também são responsáveis pela maioria da produção legislativa
em seus Estados. Mas trata-se de
uma produção na qual homenagens e declarações de utilidade
pública predominam. A produção relevante, oriunda do Executivo, é sumariamente aprovada,
com maiorias constituídas "ad
hoc", revelando um comportamento homologatório do Legislativo estes sim, casos típicos de um
"ultrapresidencialismo estadual".
A maneira como o atual governador do Espírito Santo se viu livre
do impeachment parece corroborar a afirmação.
Finalmente, no Rio Grande do
Sul e no Ceará, o Executivo dominou a produção legislativa e demonstrou alta capacidade governativa. O padrão, dizem os autores, é coerente com a existência de
maiorias partidárias estáveis, legitimadas por meio de alianças eleitorais. Fossem outras as configurações político-partidárias, e a relação Executivo/Legislativo poderia ser diferente, supõem os autores. Suposição que, no caso do
atual governo do Rio Grande do
Sul, vem se confirmando.
Cientes da natureza exploratória de sua empreitada, a amostra é
pequena e a análise restringe-se a
uma legislatura, os autores são
cautelosos nas suas conclusões,
deixando ao leitor muitas indagações. O número de vetos do Executivo derrubados no Espirito
Santo, por exemplo, é deixado
sem explicação. Mas, sem dúvida,
fica certeza de que este é o veio de
uma promissora agenda de pesquisa para a ciência política brasileira.
Carlos Ranulfo F. Melo é doutor em
ciência política e professor da UFMG
(Universidade Federal de Minas Gerais).
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