São Paulo, quinta, 30 de abril de 1998

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JANIO DE FREITAS
A fonte da seca

Além do atraso nas providências emergenciais, a ponto de só ontem começar a distribuição efetiva de gêneros a famintos da seca, o governo tem a responsabilidade de haver cortado metade da verba da Sudene em 97 e estendido o arrocho no Orçamento de 98, os dois atos com a assinatura de Fernando Henrique Cardoso.
E não acaba aí a evidência da responsabilidade. A verba especial aprovada pelo Congresso no segundo semestre do ano passado, para remediar calamidades atribuídas a El Niño, como as enchentes que então aconteciam no Rio Grande do Sul, não foi passada por inteiro, pelo governo, aos seus destinos.
Quando se deu o primeiro daqueles dois cortes de verba da Sudene, havia mais de dez meses que o governo estava advertido, por estudos brasileiros e por entidades internacionais, das previsões de seca no Nordeste e chuvas pesadas no Sul, em 97 e 98.
O segundo corte, este nos recursos que o Orçamento da União deveria dar à Sudene em 98, foi feito quando as previsões já estavam confirmadas por enchentes, e a seca já prenunciava a gravidade e a amplitude atuais.
A seca é obra do clima. Suas consequências trágicas são obra do governo.
Recordistas
Os 8,18% que fazem o recorde nacional de desemprego em março, embora medidos pelo escamoteante método do IBGE, devolvem uma acusação de mentira e apelam para a salvação de alguma honestidade profissional ainda não perdida de todo.
Há cerca de quatro meses, Fernando Henrique Cardoso disse que o crescimento do desemprego, apontado por constatações de diferentes procedências, era "mentira dos oposicionistas" para "não reconhecer as ações sociais do governo". A mentira a seu dono, pois.
No mês passado, o novo ministro do Trabalho, Edward Amadeo, economista que constava ser "especialista em questões de trabalho", saiu-se com o infantilismo de que "não há desemprego no Brasil, há uma tendência ao desemprego". Confundiu, à custa do seu conceito de economista, aquela tendência há muito superada e a tendência de certos neófitos deslumbrados para o puxa-saquismo ao chefão.
Como complemento, Edward Amadeo assegurou que "a partir de maio o desemprego vai cair". O recorde lembra-lhe, enquanto é tempo, que para agradar ao chefão não é preciso cair no ridículo nem tornar-se mais um mentiroso oficial.
Selecionado
Não tardará para se constatar que, no Ministério das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros não substituirá Sérgio Motta apenas nas funções propriamente ministeriais.
Ele tem disposição e experiência para mais. E não há por que não admitir que esse algo mais é que o tenha levado para o lugar de Sérgio Motta.
Papa-defuntos
Os religiosos e outros que justificaram os saques a alimentos, por famintos da seca, foram qualificados por Fernando Henrique como "imorais, irresponsáveis e demagogos", porque "estão usando a miséria para fazer política e para tirar proveito financeiro".
E os que estão usando a morte de Luís Eduardo Magalhães para fazer política e, por consequência, tirar proveito financeiro e outros proveitos?
Para dizer o mínimo necessário, é asquerosa essa exploração.



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