São Paulo, domingo, 30 de junho de 2002

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RUMO ÀS ELEIÇÕES

Crítico mais antigo do petista, Frei Chico elogia Duda Mendonça e diz que candidato "mudou para melhor"

Mais "light", Lula se aproxima do irmão

Jorge Araújo/Folha Imagem
José Ferreira da Silva, o Frei Chico, irmão do candidato do PT à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante entrevista


DA REPORTAGEM LOCAL

Quadro formado pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB), José Ferreira da Silva, o Frei Chico, 60, é detentor do título de o mais antigo crítico do candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em 1952, reclamava da timidez de Lula como vendedor de tapiocas e amendoins nas ruas de Vicente de Carvalho, no Guarujá, litoral paulista.
Em 1966, queixava-se de que Lula só queria namorar, não participava das lutas sindicais e resistia a aceitar sua indicação para a direção do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo.
Em 1978, discordava dos rumos que Lula dava às greves dos metalúrgicos da região do ABCD. Em 1980, afirmava que, ao criar o PT, seu irmão quatro anos mais novo fazia o jogo da burguesia e fomentava a divisão da esquerda.
Com tanta discordância, em 1986, decidiu competir com Lula na disputa dos votos dos trabalhadores de São Bernardo e São Caetano. Lula obteve 650.134 votos e foi o deputado mais votado do país. Seu crítico conseguiu pouco mais de 4.000 votos.
Frei Chico, o irmão que iniciou Lula na política, é nome com o qual o sindicalista José Ferreira da Silva foi batizado pelos companheiros metalúrgicos. Nunca pertenceu a qualquer ordem religiosa. O apelido vem da calvície -à semelhança de um padre- que o acompanha há cerca de 35 anos.
Frei Chico está aposentado. Deixou o PCB quando parte dos comunistas aceitou mudar a sigla para PPS em 1992. Filiou-se ao PT, mas só permaneceu na legenda durante um ano. Petistas divulgaram uma lista de funcionários que acusavam de ter sido contratados irregularmente pelo Baneser, no governo de Luiz Antônio Fleury. Frei Chico estava entre eles. Ele diz que trabalhava diariamente, controlado por cartão de ponto.
Avaliou que a inclusão de seu nome era manobra de petistas para atingir o irmão. Desfiliou-se e nunca mais quis saber do PT.
A carreira política -de intensa militância no Partidão e tentativas infrutíferas de ser deputado federal e prefeito de São Bernardo- não seria suficiente para levar Frei Chico a entrar para a história.
Seu gesto mais importante para tal foi a indicação de Lula para ocupar uma diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos em 1968, o que iniciou a carreira do hoje pré-candidato petista à Presidência.
Mas não acreditava na capacidade de liderança de Lula: "Lula não gostava de política. Quando o chamei para entrar para o sindicato, repetiu o que dizia toda pessoa desinformada: "Você acha que vou perder tempo de ficar namorando para ir para sindicato? Não quero saber disso'". De um começo tímido, tornou-se o maior dirigente dos metalúrgicos e o maior sucesso político da família (além de Frei Chico, o irmão Vavá tentou ser vereador, sem êxito).
Acompanhante mais como familiar do que como palpiteiro político das três derrotas de Lula à Presidência, Frei Chico analisa: "O Lula vem mudando paulatinamente, mas, nos últimos três anos, a mudança é mais clara. Ele mudou bem, para melhor". Entre os responsáveis pela mudança, Frei Chico destaca o publicitário Duda Mendonça, que desde o final de 2001 assumiu o marketing do petista. "Alguém convenceu o Lula a ser o que é. Nada da carranca com que ele aparecia na mídia. Uma mudança profunda. Isso não foi só Duda Mendonça, não. Duda ajudou. E bastante. Mas também foram amigos, parentes, pessoas que escrevem a ele, mostrando que ele tinha de mudar."
Para quem apoiou em 1986, seguindo a orientação partidária do PCB, a Orestes Quércia, hoje cortejado pelo PT, o irmão de Lula vê com natural simpatia a tentativa de ampliar as alianças do partido.
"Ele precisa mostrar que não vai governar só para o PT, trazendo o PL e o PMDB. Por mim, teria até setores do PFL. Por que não?", conta Frei Chico. "O que Lula está visando é ganhar condições de governar o país. Como junto com esse pessoal? Com um programa mínimo de governo. Se as pessoas aceitarem esse programa, o resto é detalhe."
Segundo ele, "a coligação tem de ser a mais ampla possível. Não precisa chegar ao extremo de ACM. Agora, se você convencê-lo a não atrapalhar, já é ótimo. Vai dizer que ACM não tem popularidade na Bahia? De uma maneira atrasada, mas não interessa."
O Lula mais inclinado ao centro faz com que o antigo crítico Frei Chico veja o irmão mais próximo politicamente. "No passado, o Lula estava mais à minha esquerda."
O antigo comunista faz uma autocrítica e tenta explicar a caminhada de Lula: "É uma questão de dom próprio. Ele se preparou muito bem e não teve a bitola de partido clandestino. O partido ajudava muito na formação pessoal e política, mas não dá liberdade de lidar com a massa".
Frei Chico afirma que, se Lula vencer, só vai uma vez a Brasília: "Vou lá conhecer o Palácio [do Planalto"". E se o petista perder depois de tantas mudanças? "Aí a culpa não é mais dele", responde.
(PLÍNIO FRAGA)


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