São Paulo, terça, 30 de junho de 1998

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CELSO PINTO
Um mercado mais difícil

A Petrobrás, o mais conceituado tomador brasileiro no mercado internacional, talvez tenha que recorrer ao mercado interno, neste ano, para completar os recursos de que precisa. É um bom exemplo de como o mercado ficou complicado para os países emergentes.
Uma boa parte dos recursos que a Petrobrás precisa para seus investimentos vem de créditos de "eximbanks", agências oficiais de crédito para exportação. Outra parcela vem de acertos com "trading companies" japonesas, dinheiro casado, muitas vezes, com projetos.
Mesmo assim, nas contas da empresa, será preciso buscar US$ 600 milhões no mercado internacional para completar as necessidades de recursos deste ano. Até agora, a empresa não levantou nada desses US$ 600 milhões.
O Banco Central deve autorizar a Petrobrás a lançar US$ 250 milhões em bônus internacionais. Ela só o fará, contudo, se o custo não ficar muito acima do que vinha sendo pago.
A Petrobrás é considerado o melhor risco brasileiro por uma série de razões. Como ela importa petróleo, um bem vital, não pode se dar ao luxo de não pagar seus compromissos. De fato, mesmo na moratória brasileira, esses pagamentos não foram suspensos.
Além disso, a empresa produz (e tem reservas) um ativo que vale dólar seguro no mercado internacional, o petróleo. Não por acaso, portanto, a Petrobrás costuma pagar taxas de juros inferiores até às pagas pelo governo brasileiro. Mesmo assim, os cálculos da direção financeira da Petrobrás são de que a empresa talvez tenha que buscar no mercado interno até metade dos US$ 600 milhões.
O mercado internacional complicou: o dinheiro ficou mais escasso e mais caro. As captações brasileiras por meio de bônus internacionais caíram para US$ 993 milhões em maio, depois de terem chegado a US$ 4,2 bilhões em abril e US$ 6,8 bilhões em março. Ainda é uma média comparável à do primeiro trimestre do ano passado (US$ 940 milhões ao mês), mas o mercado piorou em junho.
Tem havido uma saída crescente de dólares pelo câmbio financeiro. Foram US$ 263 milhões em janeiro, US$ 267 milhões em fevereiro, US$ 293 milhões em março, US$ 329 milhões em abril e US$ 353 milhões em maio. Em junho, até a última sexta-feira, as saídas tinham sido de US$ 401 milhões.
O dinheiro de curto prazo, como era esperado, está sumindo. As famosas "63 caipiras", dinheiro externo de seis meses usado para aplicar nas altas taxas internas, estão minguando. Os ingressos da "63 caipira" foram de US$ 866 milhões em janeiro, US$ 2,5 bilhões em fevereiro, US$ 2,178 bilhões em março e US$ 1,547 bilhão em abril. Em maio, entraram apenas US$ 137 milhões.
O Banco Central diz que é bom reduzir o volume de dinheiro de curto prazo especulativo e que ele está sendo compensado por recursos de investimento direto de mais longo prazo. Essa compensação, contudo, não aconteceu em junho.
Até sexta-feira saiu US$ 1,930 bilhão líquido pelo câmbio flutuante e entraram US$ 716 milhões líquidos pelo câmbio comercial, uma perda líquida de US$ 1,2 bilhão. O Brasil terá que pagar ainda US$ 780 milhões em papéis da dívida externa, que devem ser contabilizados em junho, e uns US$ 500 milhões para credores da dívida oficial (Clube de Paris). Em compensação, ganhará uns US$ 350 milhões a US$ 400 milhões em juros de aplicação das reservas e pode ter algum ganho na variação da posição em dólares dos bancos.
Junho foi um mês generoso em ingressos de investimentos (por exemplo, da compra da tele gaúcha CRT) e contou com a captação de US$ 1 bilhão em papéis do BNDES. Podem entrar, ainda, uns US$ 350 milhões em dinheiro da Metropolitana (ex-Eletropaulo).
Mesmo assim, a projeção do mercado é de uma queda de US$ 1,5 bilhão a US$ 2 bilhões nas reservas cambiais em junho, que ficariam próximas a US$ 70 bilhões no conceito de caixa.
Não é o fim do mundo. O governo sempre poderá captar via estatais, se aceitar pagar juros maiores. Pode, ainda, finalmente fazer a securitização de recebíveis de Furnas (até US$ 3 bilhões), se aceitar juros mais salgados.
O fato, contudo, é que a sangria deve continuar. O mercado mudou para pior e não há previsão de quando pode melhorar.




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