São Paulo, quinta, 30 de julho de 1998

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JANIO DE FREITAS
Que bom negócio

Assediado por alguém desejoso de comprar seu carro, você pede uma avaliação a um corretor de automóveis ligado ao pretendente à compra. Valor: R$ 5.000. Você põe um ClassiFolha e aparece um negociante de carros, outro homem do ramo, que dá R$ 17,2 mil pelo seu. O que lhe parece do avaliador ligado ao primeiro desejoso de comprar seu carro?
Pois foi isso mesmo que se passou com a venda da Telebrás-Embratel. A proporção de 5 para 17,2, inclusive, é idêntica aos 242,4% pagos, na compra da Teleleste, acima do valor pedido pelo governo.
Uma pequena diferença entre os dois casos: os avaliadores escolhidos pelo governo, e ligados a vários interessados/participantes em privatizações brasileiras, foram regiamente pagos pelo Ministério das Comunicações para fazer suas avaliações tão suspeitas quanto ordinárias.
Não há terceira hipótese: ou o dinheiro público foi dado a gente sem competência para a tarefa tão bem paga ou foi dado a vigaristas. Vivêssemos em país onde prevalecesse alguma decência e pelo menos um mínimo de respeito pela coisa pública, pagadores e recebedores responderiam judicialmente pela desídia dos primeiros e a má-fé dos segundos. Isto, sem falar na possibilidade, que bem merecia uma investigação -não fossem os departamentos investigativos controlados pelo próprio governo-, de relações mais participativas entre o lado que soltou o dinheiro e o lado que recebeu. Como é da praxe.
Adepto de privatização não é, necessariamente, adepto de negociata, nem de procedimentos que não considerem o interesse financeiro do país. Torna-se difícil entender, então, a complacência, a absoluta falta de cobrança, pelos propagandistas em geral das privatizações, de maior rigor e transparência no encaminhamento da venda de tão valiosos patrimônios nacionais.
É injustificável, por exemplo, o descaso sistemático pelos estudos técnico-científicos de brasileiros, nas privatizações. E, no entanto, mais uma vez ficou provado que a competência e a decência estão neles. Enquanto os avaliadores pagos pelo Ministério das Comunicações atribuíram o valor de R$ 13,4 bi à parte estatal, na Telebrás-Embratel, o estudo contestatório da UFRJ (Coppe) e Unicamp fixou-o no mínimo de R$ 22,3 bi. O leilão resultou em R$ 22 bi. Um diploma de excelência para o grupo UFRJ (Coppe)-Unicamp e de reprovação mental e moral dos condutores de privatizações.
Mas foi um bom negócio, a privatização. Foi vendida por R$ 22 bi a Telebrás em que este governo investiu R$ 28 bi nos últimos três anos e meio, para torná-la ainda mais atraente aos compradores estrangeiros. Foi vendida por R$ 22 bi a Telebrás que dava só R$ 4 bi de lucro por ano. A privatização foi um bom negócio.



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