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NORDESTE
Prociura por hospitais psiquiátricos aumenta entre 20% e 30%; maioria de doentes são trabalhadores rurais
Seca e fome acirram distúrbios mentais
FÁBIO GUIBU
da Agência Folha, em Ouricuri (PE)
A miséria provocada pela estiagem que atinge o sertão nordestino está modificando comportamentos
em comunidades pobres e transformado sertanejos dessas regiões em pessoas
agressivas e confusas.
Filhos da pobreza e da falta de
perspectiva de vida, os "loucos da
seca" são hoje o retrato da crise
social que se instalou nos grotões
do Nordeste com o desemprego, a
fome e a falta de chuva.
Eles são, em sua maioria, lavradores sem trabalho e inconformados com a qualidade de vida que
levam. Moram em casas de
pau-a-pique, onde a comida é escassa. A pouca água disponível é
salobra ou vem de pequenos e barrentos açudes.
No maior hospital psiquiátrico
da região, a Casa de Saúde Santa
Tereza, em Crato (sul do Ceará), a
procura por atendimento aumentou entre 20% e 30% desde o início
do ano, no período de estiagem.
Segundo a diretora da instituição, Helenita Santos Telles, uma
média de 15 pessoas com supostos
problemas mentais procuram
atendimento todos os dias no local. Desses, apenas cinco são internadas, por falta de vagas.
A instituição, que mantém convênio com o SUS (Sistema Único
de Saúde), atende pacientes de
cerca de cem municípios do sertão
do Ceará, Pernambuco, Paraíba e
Piauí. A miséria é responsável pelos surtos de desequilíbrio e desvios de comportamento, segundo
moradores dessas regiões.
"Quando a fome vem e não tem
comida, as pessoas endoidecem",
disse a agricultora Francisca Siqueira. Ela é irmã de Ivonete Siqueira da Silva, 35, que se tornou
agressiva e arredia desde que passou a enfrentar dificuldades para
criar a filha Bruna, 5, com quem
mora em um barraco na zona rural de Ouricuri (sertão de PE).
Ivonete quase não sai de casa e,
quando não tem o que comer, diz
a irmã, é capaz de jogar pedras nas
pessoas que tentam se aproximar.
Francisca e um primo ergueram
um barraco ao lado e sustentam a
menina Bruna.
Segundo o delegado de base do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Ouricuri, Enéas Pereira da
Silva, 60, o número de "loucos da
seca" cresce na zona rural, na
mesma proporção em que a estiagem se prolonga e a crise se agrava. "A loucura está virando uma
coisa cada vez mais comum no
sertão por causa da fome."
A agressividade e a confusão
mental, disse Silva, são os sintomas mais comuns entre as vítimas
da seca.
O local já teve 280 leitos, mas a
crise na saúde e a consequente redução no repasse de verbas obrigaram a direção do hospital a reduzir o número para 198, no período de dois anos.
Os pacientes internados, disse a
diretora do hospital psiquiátrico
de Crato, passam em média 45
dias no local. Com alimentação,
terapia e assistência médica, eles
melhoram e voltam para casa.
A maioria, no entanto, afirma
Telles, acaba retornando outra vez
em crise. "O desespero de viver
em situações críticas provoca um
estresse que afeta essas pessoas",
afirmou a diretora do hospital.
Segundo o psiquiatra da instituição Ridalvo Rocha, a seca não
provoca a loucura, mas contribui
para que alterações como a violência e a confusão mental se manifestem em pessoas predispostas a
apresentar esses problemas.
"A estiagem não é a causa da
doença, mas pode ser a gota d'água para que ela se manifeste",
afirmou.
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