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Para analistas, caixa dois pede cassação
DA REDAÇÃO
Sociólogos e cientistas políticos
ouvidos ontem pela Folha concordaram serem "absurdas" as
declarações do presidente da Câmara dos Deputados, Severino
Cavalcanti (PP-PE), de que os deputados que provarem terem usado o dinheiro sacado das contas
de Marcos Valério para pagar dívidas de campanha não devem ser
cassados. Na opinião de Severino,
esses parlamentares devem apenas sofrer uma "censura".
"Se for verdade isso que o Severino está falando, vai dar sinal verde para os políticos fazerem qualquer coisa e declararem que isso
era caixa dois. Se ele encaminhar
esse tipo de coisa, sinceramente
eu não sei o que o Congresso vai
fazer. É tão absurdo que eu não
posso acreditar que venha a acontecer", disse o cientista político do
Iuperj (Instituto Universitário de
Pesquisas do Rio de Janeiro) Marcus Figueiredo.
Para Figueiredo, com essas declarações, Severino está "oficializando a fraude, oficializando o
delito, oficializando o crime do
caixa dois". Ele diz que é "evidente" que a punição para o uso do
caixa dois deve ser a cassação do
mandato do parlamentar.
O sociólogo Francisco Weffort,
ex-ministro da Cultura no governo Fernando Henrique Cardoso,
tem a mesma opinião. "O caixa
dois e o "mensalão" são duas formas de ilegalidade e ruptura do
princípio democrático. A punição
em princípio tem que ser a mesma. Não vejo como ser diferente."
Weffort, que foi um dos fundadores do PT e chegou a ser secretário-geral antes de deixar o partido, considera que as declarações
de Severino são um indício de que
está se caminhando para um
"acordão" para poupar os deputados envolvidos no escândalo.
"A entrevista do Severino é totalmente extemporânea, ele não
deveria estar se manifestando sobre o que gostaria e o que não gostaria que acontecesse. Foi inoportuno e entrou em terreno perigoso. Sugere que está se armando
um grande arreglo, um grande
acordo." O ex-ministro disse que
a entrevista colabora para piorar a
imagem que a opinião pública
tem de Severino, que, segundo
Weffort, já não era da melhores.
A análise de Weffort é secundada pelo cientista político Fernando Abrucio, professor da FGV-SP
e da PUC-SP. Para ele, a declaração do presidente é "um indício
de uma posição que ganha força
no Congresso". "Não se trata de
uma operação-abafa. É uma operação bem explícita."
De acordo com Abrucio, a discussão em torno da existência do
"mensalão" é "bobagem". "Vai
ser difícil comprovar que houve
"mensalão'", afirma.
Para ele, no entanto, isso não
importa, pois o caixa dois também é crime. "E não é um crime
qualquer; é um crime eleitoral,
que é a essência da vida política."
Abrucio diz que as opiniões externadas por Severino na entrevista colocam "em suspeição a
condução feita pelo Severino do
processo". Ele lembra que Severino é "filho" dos acusados. "O
Congresso foi o responsável pela
eleição de Severino", conclui.
Papagaio
O historiador e professor da
UFSCar Marco Antonio Villa enxerga o dedo do Palácio do Planalto nas declarações de Severino.
"Evidentemente a afirmativa dele
de que não existe "mensalão" e de
que o problema era de caixa dois e
que merece simplesmente uma
advertência por parte da mesa é
uma estratégia que não foi criada
por ele, mas foi produzida no Palácio do Planalto. E vai ser um fracasso", disse ele, para quem Severino está "reproduzindo tal qual
um papagaio do presidente Lula".
A estratégia do Planalto, segundo Villa, tem o objetivo de confundir e de vencer pelo cansaço.
"É a estratégia "Chacrinha". Ela foi
criada lá no terceiro andar do Palácio do Planalto. A impressão é
que, com três CPIs convocando as
mesmas pessoas, há uma enorme
desorganização. Mas o que há é
uma estratégia que gera toda essa
confusão, para não apurar".
Para o cientista político da FGV-RJ, Fernando Lattman-Weltman,
nem a cassação dos deputados será suficiente. Ele diz que a sensação de pizza pode ficar na população pelo não-indicamento criminal dos deputados que sacaram
dinheiro para caixa dois. "A cassação do mandato é um processo
político, não prende ninguém."
O professor de direito da USP
Floriano de Azevedo Marques diz
que "a pressão tem de vir da imprensa, de movimentos da sociedade, na quantidade de fatores
que sinalizem para o mundo político o seguinte: se a sua auto preservação for não punindo ninguém, todos vão pagar o preço
por quem cometeu condutas irregulares".
(RODRIGO RÖTZSCH, MICHELE OLIVEIRA, MARCELO SALINAS E MARCIO PINHEIRO)
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