São Paulo, domingo, 4 de outubro de 1998

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FUTURO
Com um princípio simples de funcionamento, projeto de avião tenta quebrar recordes de velocidade
Vôo hipersônico

Divulgação
Ilustração do avião hipersônico HyperSoar, pesquisado pelos EUA, que deverá atingir uma velocidade de dez vezes a do som


MARCELO FERRONI
da Reportagem Local

Atire uma pedra chata rente a um lago, e ela quicará diversas vezes na superfície antes de afundar. É com essa idéia que cientistas desenvolvem um avião cerca de dez vezes mais veloz do que os atuais. Em vez da água, no entanto, a superfície utilizada é a atmosfera.
A nova aeronave, chamada por seus projetistas de "HyperSoar" (algo como "hiperplanador"), vem sendo desenvolvida pelo Laboratório Nacional Lawrence Livermore, do Departamento de Energia dos EUA.
Como a pedra sobre o lago, o HyperSoar deverá "quicar" sobre a atmosfera, após ter subido a uma altitude de cerca de 43 mil metros.
Segundo Preston Carter, 41, engenheiro que desenvolveu o conceito, o avião deverá ultrapassar a atmosfera até uma altitude determinada, para então desligar os motores e descer novamente.
Ao voltar à atmosfera, o HyperSoar reaciona os motores, que utilizam o oxigênio atmosférico como comburente, e toma um novo impulso para o espaço. Esse processo seria repetido até que o avião atingisse seu destino.
Os ângulos de descida e subida da aeronave seriam de cerca de 5 graus. O avião hipersônico deverá chegar a 10.720 km/h, ou mach 10, o equivalente a cerca de dez vezes a velocidade do som.
Segundo o instituto, um vôo desse tipo dos Estados Unidos ao Japão necessitaria de 25 "quicadas" para completar a jornada, que teria a duração de apenas uma hora e meia.
Se usado pela aviação comercial, o HyperSoar poderia atingir qualquer região do planeta, saindo dos Estados Unidos em duas horas ou menos.
A aeronave poderia também ser utilizada como cargueiro, avião militar ou como o equivalente ao primeiro estágio da um lançamento de satélites ou sondas espaciais.
Até agora, o avião tripulado que atingiu a maior velocidade foi o SR-71 Blackbird. Sua velocidade máxima era de cerca de três vezes a velocidade do som. Usado anteriormente pelos EUA para espionagem, o avião está aposentado.
Em entrevista à Folha, Carter afirmou que são necessários mais estudos para determinar se o novo avião prejudicaria a atmosfera terrestre.
"Pelo pouco contato que o HyperSoar manterá com a atmosfera, acredito que causaria menos danos do que os aviões supersônicos existentes hoje", diz.
O conceito do HyperSoar começou a ser desenvolvido há dez anos e conta com a participação da Força Aérea norte-americana e da Universidade de Maryland.
Para Carter, o projeto deverá consumir cerca de US$ 140 milhões para o desenvolvimento tecnológico e US$ 350 milhões para a construção de um protótipo com um terço do tamanho do avião.

Desconforto
Os passageiros de um vôo como esse poderiam passar por certos desconfortos durante a viagem.
Ao fim de cada "quicada", por exemplo, sentiriam durante cerca de 20 segundos uma força uma vez e meia maior do que a da gravidade, ou seja, os tripulantes se sentiriam com um peso 50% maior do que o normal.
Nos pontos de maior altitude, pelo contrário, os passageiros estariam em um ambiente sem gravidade por cerca de dois minutos.
Esses dois estados iriam se repetir em tempos regulares de aproximadamente dois minutos.
O processo, segundo o projetista, seria equivalente a uma criança em um balanço. Nos pontos altos, ela tem a sensação de estar flutuando; no ponto mais baixo, ela se sente mais pesada.
Apesar disso, diz Carter, "na média, os passageiros poderiam suportar a sensação de uma montanha russa suave se isso os fizesse ir de São Francisco a Tóquio em menos de duas horas, em vez das dez horas e meia atuais".
"A decolagem e aterrissagem seriam semelhantes às dos aviões atuais", diz.
O Concorde é o único jato supersônico usado comercialmente, cruzando diariamente o Atlântico Norte nas rotas Londres-Nova York e Paris-Nova York numa velocidade de quase duas vezes a do som.



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