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+ Marcelo Gleiser
Máquinas maravilhosas
São essas as nossas pirâmides e catedrais, monumentos
à nossa curiosidade
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Imagino que em todas as eras as
pessoas se maravilhem com as invenções de seus cientistas e engenheiros. Penso na sensação que Arquimedes causou na Grécia antiga, ao
conseguir repelir o exército romano
com suas catapultas enquanto, segundo a lenda, suas lentes mirabolantes
queimavam os navios invasores. Ou
como Galileu enfeitiçou o Senado de
Veneza com seu telescópio e Anton
von Leeuwenhoek revelou mundos
invisíveis com seu microscópio.
Nossa era não é diferente. Penso
imediatamente em três máquinas, ou
melhor, instrumentos, que juntos
vêm ampliando nosso conhecimento
do mundo em três fronteiras: o muito
grande, o muito pequeno e o biológico.
No muito grande, o leitor deve já ter
adivinhado, é impossível não mencionar o Telescópio Espacial Hubble,
considerado por alguns o instrumento
científico mais importante de todos os
tempos. Não sei se concordo com a adjetivação exagerada, mas não há dúvida de que as imagens que o Hubble nos trouxe do espaço ajudaram em
muito a transformar nossa concepção
do cosmo. Planetas extra-solares e
berçários de estrelas, detalhes de
mundos distantes, como as luas de Júpiter e Saturno, a espetacular colisão
entre o cometa Shoemaker-Levy 9 e
Júpiter, galáxias das mais variadas
formas, a expansão do Universo medida com grande precisão, supernovas
explodindo, enfim, um cosmo dinâmico, de uma beleza inigualável, que nos
remete às nossas origens.
Na esfera da biologia, o Projeto Genoma, que revelou o genoma humano
e o de muitas outras espécies, só foi
possível devido ao desenvolvimento
de máquinas de seqüenciamento automático de DNA, que combinam química e lasers para acelerar a leitura
das séries das quatro bases químicas
A, G, C e T (adenina, guanina, citosina
e timina) que compõem os genes.
No caso dos humanos, são 30 mil
genes, cerca de 3 bilhões de pares de
bases, cuja leitura e ordenação seriam
impossíveis manualmente.
Dessa informação, será possível
identificar o componente genético de
várias doenças, possibilitando novos
tipos de tratamento e o estudo de como pessoas com certos genes reagirão
a remédios diferentes -o mesmo medicamento pode não surtir efeito semelhante em pessoas com diferenças
genéticas específicas.
É importante lembrar que a predisposição genética não age sozinha, já
que fatores exógenos também contribuem para o surgimento de muitas
doenças. No entanto, saber que existe
uma predisposição genética pode ser
extremamente útil na prevenção de
vários males.
Eu mesmo fui testado outro dia para câncer no pâncreas, o mal que causou a morte de meu pai. (Felizmente, por enquanto tudo bem!)
Outro uso é na comparação do genoma entre espécies diferentes. Por
exemplo, diferimos em cerca de 1%
dos chimpanzés, com foco nas áreas
reprodutiva e imunológica.
Finalmente, a maravilhosa máquina do muito pequeno: o Grande Colisor de Hádrons (LHC, do inglês Large
Hadron Collider) -a maior máquina
já construída, um túnel subterrâneo
de 27 km de circunferência acoplado a
detectores do tamanho de prédios de
cinco andares e a mais de 30 mil computadores. O LHC deve entrar em
funcionamento no final deste ano,
ajudando os físicos a responderem a
uma das questões mais fundamentais
da ciência: a origem da massa.
De quebra, essa máquina poderá
nos dar pistas sobre a existência de dimensões extra do espaço e mesmo
produzir miniburacos negros. São essas as nossas pirâmides e catedrais,
monumentos à nossa curiosidade e à
incrível inventividade humana.
MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA) e autor do livro "A Harmonia do Mundo"
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