São Paulo, domingo, 8 de novembro de 1998

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A batalha contra o atraso

ROGÉRIO CÉZAR DE CERQUEIRA LEITE
do Conselho Editorial

A mais importante conferência anual de física, e talvez da ciência em geral, no Ocidente, ocorre todos os anos durante o mês de março em alguma cidade dos EUA. É o "March Meeting" (Encontro de Março), da Sociedade Americana de Física (APS). Reúne entre 5 mil e 10 mil cientistas experientes. Em 1999, a Sociedade Americana de Física comemora o seu primeiro centenário com um retrospecto do que aconteceu de impacto neste século. Em sua sessão de abertura serão descritas cinco plataformas internacionais de cooperação de destaque para o futuro da ciência. Uma delas na América Latina, o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), em Campinas.
Não é a maior nem a mais completa máquina do gênero no mundo. Outro dos cinco centros escolhidos é o Cern (Centro Europeu de Pesquisa Nuclear), na Suíça, esforço europeu que dispõe, dentre outros equipamentos, de um acelerador circular como o de Campinas, mas que é tão grande -o maior do mundo- que não coube na Suíça, diz uma anedota, e um segmento do círculo precisou ser construído na França. O do LNLS é considerado uma máquina "sui generis", porque foi inteiramente projetado, construído e operado por equipe inteiramente nacional, feito que ninguém, aqui e no exterior, acreditava que isso fosse possível. Hoje, o LNLS já foi convidado a construir componentes para diversas outras máquinas congêneres, nos EUA, na Alemanha, na França e em outros países. Em apenas seis meses, com apenas um terço de seus laboratórios instalados, permitiu às comunidades científicas brasileira, latino-americana e européia a execução de 250 projetos, obteve patentes e foi recentemente convidado para participar da concorrência internacional para projetar e construir o síncrotron do Canadá.
O LNLS adotou como estrutura gerencial a Organização Social, regida por contratos de gestão, tornando-se uma verdadeira cobaia de uma fórmula administrativa combatida ferozmente pela burocracia tradicionalista brasileira.
O reconhecimento internacional, representado pela escolha do LNLS como um dos principais centros para colaboração internacional por uma das mais prestigiosas organizações científicas do mundo, demonstra que foi derrotado o fantasma da incredulidade e da indiferença. Veremos agora se o dragão do corporativismo burocrático e da inveja intelectual poderá ser neutralizado em um país em desenvolvimento. Essa última batalha será a mais penosa.



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