São Paulo, domingo, 19 de dezembro de 2004 |
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Micro/Macro Supernova de Kepler faz 400 anos
MARCELO GLEISER
Kepler viu a nova stella ("estrela nova", como eram chamados tais objetos) e apaziguou os anseios de seu patrono, comparando a luminária a outra de grande importância na história, a Estrela de Belém. "Nem todas as aparições celestes são necessariamente sinal de más novas, Majestade", deve ter dito. Kepler observou metodicamente a "estrela nova" até março de 1606, quando ela se tornou invisível ao olho nu. (Apenas em 1610, Galileu utilizaria o telescópio em observações astronômicas.) Nem ele nem qualquer outro astrônomo da época ou dos próximos séculos poderia suspeitar a causa da estranha aparição celeste. A "estrela nova" na verdade não é nova, mas velha, uma estrela que está morrendo, o enorme aumento em sua luminosidade sinalizando o fim próximo. O que ocorreu com essa e outras "estrelas novas" é que sua luminosidade normal era baixa demais para ser vista a olho nu. É como se, de repente, alguém aumentasse ao máximo o volume da música que estava tocando baixo demais para ser ouvida. Hoje, o fenômeno é chamado de explosão de supernova. Hoje, sabemos que existem dois tipos de supernova. Em um deles, as supernovas de tipo 2, estrelas com massas superiores a oito vezes a do Sol consomem a matéria em seu interior e se tornam incapazes de gerar a pressão que contrabalança a inexorável atração gravitacional. Sem esse suporte, as estrelas literalmente colapsam: a matéria das partes externas "despenca" em direção ao centro, a pressão e a temperatura aumentam dramaticamente e ela é rebatida explosivamente para o espaço. A estrela se despedaça em átomos de carbono, oxigênio, ferro e outros elementos, semeando o vazio sideral. Nas supernovas de tipo 1, uma estrela anã branca suga a matéria de sua vizinha até que atinja seu limite de equilíbrio. A matéria da estrela é submetida a um enorme aumento de temperatura e pressão e termina por explodir, lançando uma enorme quantidade de matéria e energia ao espaço. Três observatórios espaciais da Nasa focaram recentemente sua atenção na supernova de Kepler, tentando desvendar os seus mistérios: Hubble, Chandra e Spitzer. Ficou determinada sua distância: 13 mil anos-luz. Ou seja, quando a supernova detonou, mal havíamos saído das cavernas. Seus restos formam uma bolha de gás e radiação com 14 anos-luz de diâmetro, inflando a um ritmo de 6 milhões de quilômetros por hora. Nos últimos mil anos, seis supernovas detonaram em nossa galáxia, a SN1604 sendo a última, e a única que ainda não se sabe se é tipo 1 ou 2. A esperança é que uma análise detalhada das novas observações resolva o mistério. Considerando que explosões de supernova são responsáveis pelo espalhamento de matéria pelo espaço interestelar, desvendar os detalhes dessas explosões é compreender nossas próprias origens. Kepler adoraria saber que somos poeira das estrelas. E que do espaço viemos e para o espaço retornaremos. Marcelo Gleiser é professor de física teórica do Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro "O Fim da Terra e do Céu" Texto Anterior: Aliança contra a malária Próximo Texto: Ciência em Dia - Marcelo Leite: Orbitais atômicos fotografados Índice |
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