São Paulo, Terça-feira, 20 de Julho de 1999
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HOMEM NA LUA - 30 ANOS
Apollo teve avanço científico "inestimável"

MARCELO FERRONI
da Reportagem Local

Às 23h56 do dia 20 de julho de 1969, há exatos 30 anos, o astronauta Neil Armstrong tornava-se o primeiro homem a pisar na Lua.
Quando o módulo lunar Eagle pousou na superfície do satélite, a corrida pela conquista do espaço promovida por EUA e União Soviética atingia seu ápice. Era o êxito do projeto Apollo, idealizado pela Nasa (agência espacial americana) para levar o homem à Lua, objetivo alcançado em sua missão de número 11.
Mas será que valeu a pena? Será que esse programa que levou seis missões tripuladas à Lua realmente trouxe descobertas científicas, ou o mesmo trabalho de exploração poderia ter sido realizado por sondas não-tripuladas?
Para o jornalista norte-americano Andrew Chaikin, o homem não pode ser substituído por sondas espaciais na exploração do Universo, e os ganhos obtidos pelo programa Apollo são inestimáveis para compreender a evolução da Lua.
Chaikin, 42, é autor de "A Man on the Moon", livro que relata o programa Apollo, desde o incêndio do módulo de comando da Apollo 1, em 1967, que matou três astronautas durante um treino, até a Apollo 17, última missão tripulada à Lua.
Seu livro serviu de base para a minissérie em 12 partes "Da Terra à Lua", que está sendo exibida no Brasil pelo canal pago HBO (o nono episódio passa hoje, às 19h15).
Em entrevista por telefone, o autor discutiu o que seria da missão à Lua se não fosse a guerra fria, as prioridades atuais da Nasa e a nova corrida do ouro que a agência norte-americana pretende iniciar com a construção da Estação Espacial Internacional.

Folha - Se não tivesse havido a corrida espacial entre os EUA e a União Soviética, o homem já teria chegado à Lua?
Andrew Chaikin -
Provavelmente sim. É possível, no entanto, que isso ocorresse muitos anos depois do que realmente aconteceu. Havia pessoas na Nasa e na União Soviética que pensavam em levar o homem à Lua. A questão era como pagar. O governo de Dwight D. Eisenhower (1953-1961) não estava entusiasmado em mandar pessoas ao espaço.
Em reuniões de Eisenhower com assessores, quando era levantada a questão de que a Nasa queria verba para um programa da Lua, alguém dizia "bem, se nós dermos a eles o dinheiro, a próxima coisa que pensarão em fazer é ir à Lua", e todos riam.
O que tornou tudo diferente foi a competição com os soviéticos. E é por isso que Kennedy disse, em 1961, que os EUA deveriam ir à Lua, não pela ciência. É claro que Kennedy entendia a importância científica da missão, mas essa não foi a principal razão para o homem ter chegado à Lua na década de 60. Mas, mesmo sem a guerra fria, a idéia de ir à Lua ainda teria sido tentadora. Talvez tivéssemos construído primeiro o ônibus espacial e em seguida uma estação orbital, para então ir à Lua.

Folha - O programa Apollo foi mais bem-sucedido no desenvolvimento tecnológico ou nas descobertas científicas?
Chaikin -
Foi bem-sucedido nas duas áreas. A tecnologia era impressionante. O foguete Saturn 5, por exemplo, nunca prejudicou as missões de forma irreversível. E as naves eram criações maravilhosas da engenharia. Havia problemas ao longo do caminho, mas eles eram resolvidos. O incêndio que matou os três astronautas da Apollo 1 ocorreu devido a falhas do projeto -a nave não era segura. Depois do incêndio, eles resolveram os problemas, e a nave que chegou à Lua era incrível.
Na área da ciência, ninguém tinha analisado uma rocha lunar antes da Apollo. A Lua era um museu sobre a história inicial do Sistema Solar, que podia nos contar como a Terra se formou.

Folha - As primeiras missões Apollo tiveram valor científico, ou isso só veio após a Apollo 15, em que havia uma maior preocupação com a ciência?
Chaikin -
Absolutamente. Mesmo na Apollo 11, em que os astronautas tinham cerca de duas horas para andar na Lua, os avanços científicos foram importantes. Eles pegaram uma quantidade pequena de rochas, mas elas foram bem escolhidas. Com a Apollo 12, foi analisada uma outra região da Lua, o que deu aos geologistas novos dados sobre a composição química do satélite.
Em seguida, a Apollo 14 pousou em uma região montanhosa pela primeira vez, e os astronautas descobriram rochas que eram muito mais antigas do que as coletadas anteriormente.

Folha - Descobertas recentes de sonda espaciais, como a Lunar Prospector (1998), indicam que pode haver água na Lua, o que os astronautas não encontraram nas missões Apollo. O uso de sondas espaciais pode obter mais dados científicos do que as missões tripuladas?
Chaikin -
Ainda não conseguimos criar sondas espaciais que façam o mesmo trabalho de homens. Seres humanos podem ir a outro planeta e usar seus olhos, mãos e cérebro, características que as sondas não têm e que deverá levar um longo tempo até que possamos desenvolvê-las.

Folha - Os ganhos científicos do programa Apollo poderiam ser obtidos só por sondas?
Chaikin -
Acho que não. Talvez em 30 ou 40 anos tenhamos sondas que façam isso. Talvez possamos criar sondas controladas por um cientista em Terra, que possa ver o que a sonda detecta em um ambiente de realidade virtual e tirar fotos e manipular objetos por meio do equipamento. Mas nós ainda não temos isso.

Folha - O maior problema da Nasa atualmente é a falta de um objetivo bem definido, como chegar à Lua?
Chaikin -
Nunca teremos um objetivo tão claro como chegar à Lua. Tudo o que você precisa fazer é observar o céu à noite para ver o objetivo. E as metas da Nasa atualmente são mais difíceis de definir. A agência quer explorar o espaço, mas o importante agora é reduzir os custos das missões.
Ao mesmo tempo, a Nasa está envolvida na construção da Estação Espacial Internacional (ISS) e acredita que, de alguma forma, a estação deverá iniciar um processo que levará a uma nova corrida do ouro, semelhante à que tivemos na Califórnia na década de 1840, com participação da iniciativa privada. Por que se não houver algo que incentive as indústrias privadas a entrar em uma corrida espacial, então a única saída será reduzir custos.


Livro: A Man on the Moon
Autor: Andrew Chaikin
Lançamento: Penguin Books (importado)
Quanto: US$ 15,95 (670 págs.)
Onde encomendar: livraria Cultura (tel. 0/xx/11/285-4033) ou Amazon Books (www.amazon.com)


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