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AMBIENTE
Se o aquecimento global seguir em curso, as matas emitirão mais carbono do que absorvem, sugerem cientistas
Florestas podem agravar o efeito estufa
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
O aquecimento do planeta Terra provocado pelo efeito estufa
-o aumento da temperatura
causado pela retenção da radiação solar na atmosfera por um cobertor de gases- poderá converter as florestas tropicais de mocinhas em bandidas. Em vez de
continuarem absorvendo o elemento químico carbono, ajudando a amenizar o aquecimento global, se o clima esquentar demais,
as florestas passarão a emiti-lo em
grande quantidade.
Essa hipótese ganhou força agora graças a um estudo na floresta
da Costa Rica, que analisou o
crescimento das árvores e sua relação com a variação do carbono
na atmosfera e da temperatura
entre 1984 e 2000.
O carbono que interessa aos
cientistas vem na forma do gás
dióxido de carbono, o mesmo dos
refrigerantes. Seu acúmulo na atmosfera ajuda a reter o calor da
radiação solar no planeta. As árvores emitem esse gás durante a
respiração, mas também absorvem carbono durante o processo
de crescimento e ao captar energia solar para seu metabolismo, a
chamada fotossíntese.
O problema surge quando a
temperatura aumenta além de determinado ponto. As plantas passam a respirar com mais intensidade -como uma pessoa que fica ofegante. E seu ritmo de crescimento atinge um limite, a partir
do qual inicia uma desaceleração.
O estudo de 16 anos foi feito na
Estação Biológica La Selva, na
Costa Rica, pela equipe de Deborah Clark, da Universidade de
Missouri em Saint Louis, EUA.
Ela e mais três colegas publicam
os resultados na pesquisa na edição de hoje da revista da Academia de Ciências dos EUA, a
"PNAS" (www.pnas.org).
Foram estudados espécimes de
seis espécies de árvores tropicais.
Os cientistas também procuraram correlacionar esses dados
com a variação das emissões de
gás carbono no período, além dos
registros de temperatura.
O resultado foi marcante: nos
anos mais quentes, por exemplo
1997/1998, as árvores na Costa Rica cresceram bem menos e houve
mais emissão de dióxido de carbono nas regiões tropicais. Nesse
período houve um El Niño particularmente intenso -o fenômeno climático caracterizado pelo
aquecimento das águas do Pacífico ao longo da costa do Peru que
afeta o clima global, provocando
secas e incêndios florestais.
"Como nós calculamos no artigo, baseados em uma estimativa
corrente da produtividade líquida
das plantas de floresta tropical
-o balanço entre a fotossíntese a
respiração-, apenas uma redução de 5% na fotossíntese na floresta tropical e um aumento de
10% da respiração em um ano
mais quente modificariam essa
produtividade em mais 4,4 gigatoneladas (4,4 bilhões de toneladas) de carbono naquele ano",
afirmou Clark à Folha.
Esse índice seria verdadeiramente catastrófico: a queima pela
humanidade de combustíveis fósseis como petróleo e carvão que
tem causado toda a preocupação
atual com a intensificação do efeito estufa tem ficado em torno de
6-7 bilhões de toneladas de carbono por ano, segundo Clark.
A pesquisadora ressalva que os
dados apresentados no artigo são
uma hipótese sobre o futuro das
florestas tropicais. "Nós achamos
que se trata de uma hipótese muito importante, consistente com os
dados existentes, mas também
achamos que muita pesquisa futura vai ter de ser feita para conclusivamente aceitar ou rejeitar
essa possibilidade", declara Clark.
Incertezas
Ela lembra que a ciência ainda
não dispõe de números confiáveis
e completos sobre quanto carbono existe na floresta e quanto essa
composição muda ao longo do
tempo. "Nós temos diferentes ferramentas para estimar aspectos
distintos do processamento de
dióxido de carbono pelas florestas
tropicais, mas os resultados desses estudos até hoje ainda são
muito incertos", diz ela.
Apesar da incerteza, o novo estudo e outros citados no artigo
mostram que a dinâmica do carbono nas florestas tropicais pode
ser altamente sensível a mudanças no clima. "Ainda não é possível, entretanto, determinar os
efeitos exatos e em qual temperatura eles vão ocorrer, ou a rapidez
do que vai acontecer nas próximas décadas", afirma Clark.
Clark esteve em Manaus no ano
passado durante a segunda conferência internacional do projeto
LBA, o Experimento de Grande
Escala da Biosfera-Atmosfera na
Amazônia, cujo objetivo é estudar
a mudança climática na região e
sua influência no clima global.
Até agora os estudos têm demonstrado que a Amazônia tem
um papel importante em absorver carbono da atmosfera.
Por exemplo, Robert E. Dickinson, do Instituto de Tecnologia da
Geórgia, EUA, afirmou na conferência que a bacia amazônica armazena mais que o dobro de carbono do que a produtividade líquida das plantas por ano em todo o mundo.
"As florestas da região amazônica sem dúvida têm um grande
papel no ciclo global de carbono",
diz Clark, que acredita que os estudos feitos por cientistas de vários países do projeto LBA estão
proporcionando dados importantes. Mas, para testar a hipótese
levantada pelo artigo, serão necessários mais estudos, realizados
em mais florestas tropicais em
outras partes do mundo.
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