São Paulo, domingo, 23 de março de 1997.

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Astro inspirou ficção

especial para a Folha

A despeito de os cometas terem provocado junto ao leigo uma intensa ação catalítica nas crenças e superstições populares, não inspiraram, como era de se esperar, muitos escritores de ficção científica. Quem sabe não foi a carga negativa das crendices que contribuiu para a ausência dos cometas nos relatos imaginários com base científica?
Apesar desta aparente contradição, foi um dos primeiros escritores do gênero, o norte-americano Edgar Allan Poe (1809-1849), quem publicou o primeiro conto de ficção científica sobre cometas.
Em suas "Novas Histórias Extraordinárias" (1839), encontramos em "A Palestra de Eiros e Charmion" a descrição da destruição da Terra por um cometa, relatada pela alma de uma das vítimas depois de sua chegada ao céu.
Ainda que fosse sempre muito coerente com os seus conhecimentos astronômicos, adquiridos quando foi aluno da Academia Militar de West Point, Poe afastou-se um pouco da ciência ao aceitar a idéia que, na época, se apossou de todos: o cometa poderia extrair todo azoto (nitrogênio) contido na atmosfera e deixar somente o oxigênio, o que provocaria o incêndio súbito da atmosfera terrestre.
Mais tarde, em 1877, o escritor francês Julio Verne (1828-1905), realizou, na cauda de um cometa, uma viagem através das órbitas dos planetas, em "Hector Servadac, Voyages et Aventures à Travers du Monde Solaire" ("Viagens e Aventuras Através do Mundo Solar"), em 1877.
Sob o impacto do cometa Galia, o capitão Hector Servadac e seu assistente Ben-Zouf, que faziam um levantamento topográfico a alguns quilômetros de Mostaganem, foram conduzidos ao espaço interplanetário junto com alguns quilômetros quadrados do litoral argelino, onde estavam os dois heróis, o rochedo de Gibraltar, Formentera, uma das Ilhas Baleares, um rochedo próximo a Cartagena e Madalena, pequena ilha da Sardenha, e o rochedo de Ceuta, próximo a Gibraltar.
Após atravessar o cinturão de asteróides, onde capturaram o asteróide Nerina, chegaram próximo à órbita de Júpiter.
Na volta, com receio de um impacto com a Terra, decidiram construir um balão de ar quente, com o qual retornaram tranquilamente à cidade de onde haviam partido. Talvez com base nessa idéia, Monteiro Lobato tenha feito "Viagem ao Céu" (1934), na qual Pedrinho e seus amigos excursionaram pelo céu num cometa.
No início do século 20, pouco antes da passagem do cometa Halley, o escritor britânico H. G. Wells (1866-1946) publicou "In the Days of the Comet" (1906). Após descrever a situação político-social do Reino Unido antes da passagem do cometa, o seu principal personagem, o colérico e ciumento Leadford, desejou vingar-se de sua namorada, Nettie, que fugira com o seu rival Verral.
Depois que a Terra atravessou a cauda do cometa, o azoto da atmosfera terrestre transformou-se em "um gás respirável, diferente do oxigênio, porém de grande capacidade calmante e muito benéfico aos nervos e o cérebro". Em consequência ocorreu a chamada "grande mudança": a paz passou a reinar e novas formas de amor mais nobres tornaram-se possíveis: Leadford casou-se com Anne Reeves, esquecendo o desejo de matar a antiga namorada, bem como o seu rival, com os quais passa a viver em "ménage à quatre".
Mais tarde, apareceu "The Commeteens" (1936), de Jack Williamson (nascido em 1908), que relatava a chegada de uma nave espacial de 20 milhões de quilômetros de extensão ao Sistema Solar, povoada por seres imateriais, os "cometários", que tinham necessidade de se alimentar de carne humana para sobreviver, transformando os habitantes da Terra num imenso rebanho.
Felizmente, a revolta de quatro homens audaciosos permite a libertação do nosso planeta.
Nos anos 40, o escritor americano Edmond Hamilton (1904-1977) escreveu "The Comet Rings" ("Os Anéis do Cometa"). Nesse relato, os homens do futuro teriam caído em uma armadilha nas profundidades do cometa Halley, onde tiveram que combater os "monstros de quatro dimensões".
Em 1960, o escritor Arthur C. Clarke, autor de "2001: Uma Odisséia no Espaço" (1968), escreveu um curto conto, "In the Comet" ("No Cometa"), no qual descreve a história de uma espaçonave tripulada que partiu para explorar um cometa. Ao atingir seu objetivo, o computador da nave entra em pane e as comunicações com a Terra são interrompidas em virtude dos efeitos perturbadores da cauda do cometa. (RRFM)
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