São Paulo, quinta-feira, 24 de fevereiro de 2005

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COSMOLOGIA

Descoberta ajuda a decifrar a matéria escura

Astrônomos britânicos localizam galáxia completamente invisível

SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Apontando radiotelescópios para o céu, astrônomos identificaram uma "assinatura" de rádio que denunciava a presença de hidrogênio, numa quantidade equivalente à de 100 milhões de sóis. A velocidade de rotação do conjunto também parecia grande. Usando telescópios ópticos, esperavam ver uma galáxia de porte razoável, que seria visível até com equipamentos amadores. Mas o que viram foi... nada. O grupo liderado pelo astrofísico Robert Minchin, da Universidade de Cardiff, no Reino Unido, acabava de descobrir uma galáxia invisível.
As estimativas com base na taxa de rotação também indicaram uma presença de matéria bem maior do que os estimados 100 milhões de sóis detectados na forma de hidrogênio disperso. Na verdade, a imensa maioria da massa daquela galáxia é indetectável em todas as freqüências do espectro eletromagnético, indo do infravermelho aos raios gama, passando pela luz visível.
Os astrônomos primeiro haviam tropeçado na galáxia em 2000. Mas o resultado era tão bizarro que eles tiveram todo o cuidado de verificar tudo antes do anunciar o achado. A conclusão dos trabalhos levou a um estudo, divulgado agora no Reino Unido.
"A explicação viável que restou é a de que VIRGOHI21 [nome dado ao objeto] é um halo escuro que não contém a esperada galáxia brilhante", escreveram os pesquisadores em seu artigo.
Já se sabia havia tempo que todas as galáxias do Universo, inclusive a nossa, tinham mais massa do que aquela que compõe todas as estrelas, os planetas, as luas e as nebulosas -a chamada matéria bariônica, feita dos átomos e das partículas que formam tudo que se conhece hoje. À massa faltante, cuja atuação gravitacional pode ser sentida, convencionou-se chamar de matéria escura.
Agora, uma coisa completamente diferente é uma galáxia sem estrelas, feita somente de matéria escura e uma nuvem difusa de hidrogênio. Foi isso que os cientistas "viram" com os radiotelescópios em Cheshire (Reino Unido) e Arecibo (Porto Rico), a uma distância de uns 50 milhões de anos-luz, no aglomerado de Virgem, um vasto conjunto de galáxias que se prenderam umas às outras pela força gravitacional.
"É algo notável, sim", diz Cássio Leandro Barbosa, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP (Universidade de São Paulo). "Se a definição de galáxia pelo dicionário Houaiss é "sistema estelar isolado no espaço cósmico", como chamar uma galáxia sem estrelas?"
A descoberta pode vir a ajudar os cientistas a decifrar o mistério do que é de fato a matéria escura, que responde por 23% de tudo que há no cosmos (apenas 4% são a matéria "normal", e todo o resto é composto pela ainda mais misteriosa "energia escura"). "Uma região em que tanta matéria escura impediu a formação de estrelas, mas manteve o gás sem se dissipar é algo para pensar", afirmou Barbosa à Folha.


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