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+ ciência
Livro reabilita imagem do capitão Robert Falcon Scott, líder de expedição à
Antártida que terminou em tragédia em 1912, após enfrentar frio imprevisível
O degelo da história
Gabrielle Walker
da "New Scientist"
O capitão Robert Falcon Scott ficou mal na fita. Ele é denunciado por muitos como um incompetente cujo mau planejamento levou à sua própria morte e à dos
membros de sua equipe na Antártida em
março de 1912.
A americana Susan Solomon discorda.
Ela acredita que ele foi surpreendido por
um tempo maluco. Solomon sabe uma
coisinha ou outra sobre a atmosfera antártica: ela a estudou durante 15 anos. Na
década de 80, ajudou a desvendar a causa
do buraco na camada de ozônio. Mas seu
primeiro livro é sobre Scott.
O que a tornou tão interessada em Scott?
Eu não sabia nada sobre ele quando
fui para a Antártida pela primeira vez,
em 1986. Eu cheguei a McMurdo, a
principal base americana, fui para o
meu quarto, olhei através da baía dos
Winter Quarters e lá estava a cabana
de Scott. Ela parece bem moderna,
quase como a casa nas montanhas do
Colorado onde eu vivo. Tem a varanda, a madeira, o teto inclinado. Então
descobri que ela tinha 80 anos e fiquei
intrigada. Então, comecei a ler sobre
Scott e descobri que ele e seus homens
morreram na volta do pólo Sul.
Muita gente afirmou que as mortes foram
culpa de Scott e que, longe de ser um herói, ele era um trapalhão completo. Você
tinha essa visão no começo?
Eu só pensei que ele pudesse ter julgado mal quais seriam as condições na
plataforma de gelo na volta, porque
eu sabia o suficiente sobre a meteorologia da região para ver quão facilmente alguém poderia errar.
Como você chegou à conclusão de que os
detratores de Scott estavam errados?
Isso levou cerca de 15 anos de pesquisa. Primeiro eu li os diários e tudo o
mais que pudesse encontrar, então
coletei os dados meteorológicos da
expedição e os comparei com dados
modernos. Aí tive um desses momentos maravilhosos de epifania científica, quando você diz: "Oh, meu Deus,
agora eu entendi!" Ninguém poderia
ter previsto o tempo persistentemente frio que Scott encarou. Em 17 anos
de dados diretamente da área onde
ele morreu, só houve um ano como
aquele. George Simpson, o meteorologista de Scott, estava convencido de
que aquele tempo era muito pouco
usual, mas ele não teve como prová-lo, e eu tive. Foi por isso que eu sabia
que tinha de escrever esse livro.
Por que o frio era tão problemático?
A temperatura mínima média deveria
ter sido -30C em março. Quando você está aclimatado, isso é um forno.
Mas -40C é outra história. Você se
sente como se suas narinas estivessem sendo secas a frio, e o gelo se forma nos cantos dos seus olhos. Esse tipo de frio tem consequências sérias
para uma expedição. Primeiro, há o
perigo de gangrena, que foi o que
aconteceu com o capitão Oates. Depois, quando está muito, muito frio
na Antártida, o vento pára. Os homens de Scott tinham
planejado amarrar
uma vela aos trenós e
usar os ventos que sopravam do sul para velejar de volta. Em vez,
disso, tiveram de continuar arrastando os
trenós. Mas a gota d'água é que, quando a
neve fica realmente fria, ela começa a
ficar áspera feito uma lixa, e é muito
mais difícil puxar os trenós. Quando
essas temperaturas extra-frias vieram, Scott falou que os trenós ficaram
pesados como chumbo.
Qual foi sua sensação ao ler esses diários?
Quando você mergulha tanto na vida
de uma pessoa, você aprende muito
sobre ela. Veja os dois homens que
morreram com Scott no acampamento final. Edward Wilson era muito meticuloso. Henry "Birdie" Bowers
era uma das pessoas mais determinadamente otimistas que você poderia
encontrar. Esse é outro motivo pelo
qual escrevi o livro: o que quer que
você pense de Scott -e eu pessoalmente acho que há muitas razões para respeitá-lo-, você não deve pintar
os outros da mesma cor. Você deve isso a eles. Eram homens tão extraordinários que eu quis contar todas as suas histórias.
Os primeiros exploradores
não tinham nenhum dos
confortos que há hoje na
Antártida. Você acha que
isso facilita a essas pessoas criticar Scott?
Sim, acho que faz. Isso
nos deixa seguros para ir para lá e dizer: "Somos espertos e bem preparados e nada pode acontecer conosco".
Bom, pense duas vezes. Coisas ruins
acontecem até com gente muito esperta. Aconteceu com Scott. E tem
acontecido desde então. A estação do
pólo Sul esteve a ponto de pegar fogo
poucos anos atrás e, se isso tivesse
acontecido, todo mundo lá estaria
morto. Um dos laboratórios da Pesquisa Antártica Britânica na península Antártica incendiou em setembro.
Mas nós não admitimos o quão perigosa é a Antártida.
Você acha que Scott se arriscou demais
viajando em março, perto do fim do verão
antártico? Amundsen, que chegou ao pólo primeiro e sobreviveu, já estava em casa àquela altura.
Acho que não. Amundsen só usou
cães e pôde partir mais cedo. Scott teve de esperar por causa dos pôneis.
Ele sabia que havia risco. Mas o tempo que ele estava prevendo era o que
ocorre em 19 anos a cada 20. E, se eles
tivessem tido condições normais, eu
tenho muito poucas dúvidas de que
teriam conseguido. Foi estupidez? Foi
sem pensar? Absolutamente não. Tinha risco? Certamente. Tudo tem risco. Amundsen também correu riscos.
Ele armou seu acampamento de inverno sobre a plataforma de gelo flutuante, que ele achou erroneamente
que fosse terra firme. Se ele tivesse estado lá em 2000, quando aquela parte
do gelo quebrou, ele teria ficado à deriva no mar. Esse tipo de quebra
acontece em 1 ano a cada 20. Então,
ele correu um risco de 1 em 20 -sem
saber- de ficar à deriva. Scott correu
um risco de 1 em 20 com o tempo. Um
deles teve sorte, o outro não.
O que a atrai na Antártida?
Comecei como pesquisadora teórica e a minha primeira viagem de campo foi à Antártida, no inverno. Adorei, desde o primeiro minuto fora do
avião. Adorei o que há de selvagem
nela, seu caráter intocado, a ferocidade, a natureza implacável daquele
ambiente. Gosto das coisas na natureza que nos lembram como ela é poderosa e como somos insignificantes, e a
Antártida é tão feroz e bela quanto se
pode ser.
The Coldest March
de Susan Solomon
Yale University Press, EUA
US$ 29,95
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www.amazon.com
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