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Polícia Federal investiga "exportador"
DA REPORTAGEM LOCAL
A Polícia Federal do Ceará decretou, no final do ano passado, a
prisão preventiva do alemão Michael Schwickert, suspeito de envolvimento no contrabando de
fósseis da chapada do Araripe.
Seria apenas um caso de polícia,
se Schwickert não fosse geólogo
de formação, preparador de fósseis diplomado pela Federação de
Preparadores Alemães e um dos
"dealers" (comerciantes) de fósseis mais conhecidos da Europa.
Sua empresa, a MS-Fossil, com
sede na cidade de Sulzbachtal, no
Estado da Renânia-Palatinado
(oeste da Alemanha), fornece espécimes para instituições de pesquisa como o Museu de História
Natural de Paris e o Museu de
História Natural de Berlim. Este
último comprou de Schwickert
uma coleção de insetos da formação Santana (uma das formações
cretáceas da chapada do Araripe),
vários deles ainda não descritos.
Até poucos meses atrás, a MS-Fossil concedia a qualquer pessoa
-mediante uma contribuição
em marcos alemães equivalente a
R$ 10 mil- o direito de batizar
insetos fósseis brasileiros. Bastava, para isso, enviar um e-mail
(para msfossil@t-online.de).
Em novembro de 2000, a PF do
Ceará apreendeu 20 mil fósseis
em um galpão na cidade de Nova
Olinda. Na ocasião foram presos
dois atravessadores, que afirmaram trabalhar com Schwickert.
Em uma casa alugada por ele
em Nova Olinda, foram encontrados um microscópio, uma britadeira e mapas geológicos da chapada do Araripe, feitos pelo projeto Radam Brasil.
"Quem tem esses mapas na mão
sabe onde estão os fósseis da chapada", disse à Folha o delegado
Manoel Luiz Neto, que comandou a apreensão.
Além do inquérito da Polícia Federal, Schwickert ainda está sendo investigado pelo Ministério
Público do Ceará desde 1998.
A polícia acha que Schwickert
comprava fósseis de atravessadores e os enviava à Europa.
Outro lado
O "dealer" alemão concedeu
uma entrevista à Folha, por e-mail, em dezembro. "Quem vai
ser o malvado da sua matéria?"
-perguntou, antes da entrevista.
Schwickert afirmou que leu sobre a apreensão em um jornal de
Juazeiro do Norte. "É uma fantasia", afirmou. "A Polícia Federal
disse o meu nome aos dois homens presos para conseguir uma
declaração contra mim. Até onde
eu sei, eles disseram que não trabalhavam para mim."
O geólogo afirmou também que
jamais tocaria num fóssil brasileiro para exportação. "Como você
sabe, eu sou uma pessoa conhecida na Alemanha e não posso me
arriscar a fazer nada contra a lei."
Segundo Schwickert, o material
apreendido realmente pertencia a
ele. "Eu trouxe (o equipamento)
para mostrar ao pessoal das pedreiras como trabalhar de forma
mais eficiente", para não danificar os fósseis, afirmou. O microscópio "era para ser um presente
para um projeto com crianças do
museu de Nova Olinda".
Sobre os insetos da Formação
Santana vendidos ao museu de
Berlim, Schwickert declarou ter
comprado "do mundo inteiro,
mas não do Brasil".
O comércio de espécimes fossilizados na Europa e em países como o Japão é livre. Alguns países,
como a China, adotam há algum
tempo uma política de repatriação das relíquias, baseados numa
resolução da Unesco sobre bens
culturais de 1973.
No caso dos fósseis brasileiros, o
caminho que as peças percorrem
até chegar ao seu destino final é
tão longo que, mesmo que o governo solicitasse a sua repatriação, não conseguiria saber como
eles saíram do país, nem quando.
Um caso típico é o do pterossauro Anhanguera piscator, originário da Formação Santana, no
Araripe, e vendido ao Museu Nacional de Ciência de Tóquio por
um comerciante italiano chamado Flavio Bacchia.
Em entrevista à Folha, Bacchia
afirmou que nunca esteve no Brasil. "Comprei o fóssil no começo
dos anos 90, de um alemão que
morreu há sete anos", disse.
O paleontólogo japonês Yukimitsu Tomida, que descreveu o A.
piscator, disse ignorar a legislação
brasileira. "Não sei como é a lei,
mas há fósseis brasileiros à venda
em todas as grandes feiras de fósseis do mundo. Se fosse ilegal, eles
não estariam lá", afirmou.
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